Mostrar mensagens com a etiqueta Escola. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Escola. Mostrar todas as mensagens

7 de novembro de 2019

33 anos


O tempo e os seus dias, as suas datas, podem ser escritas a giz branco sobre um quadro preto, mas depressa passam e o tempo continua a fluir e os dias a galopar e tudo o que é ser vivo entra nessa roda frenética da mudança que passa quase despercebida no dia-a-dia mas significativa ou mesmo dramática quando o salto é de 33 anos.

É esse mesmo o tempo que decorreu após aquela data de 7 de Novembro de 1986, ali escrita no quadro, numa fotografia de grupo na Escola Primária da Igreja - Guisande, com a Professora D. Célia Azevedo com os então seus alunos. Passam precisamente, hoje, 7 de Novembro de 2019, 33 anos.

Todas aquelas crianças, de caras felizes e reguilas, andarão certamente por aí, já não despreocupadas das rotinas infantis e das coisas próprias da escola, mas certamente casados, com filhos, afinal com outras canseiras e responsabilidades, porventura já com algumas rugas que marcam os seus rostos mudados ou com cabelos a menos e a pintar.

Claro que, com vida e saúde, estarão prontos para mais 33 ou mais além, mas bastar-lhes-á que venha um de cada vez, porque eles, os anos, correm e somam depressa demais e por isso não há pressa de os contar.

Mas é apenas a vida e os efeitos do tempo. Uma fotografia antiga tem esta virtude de nos emocionar, como um pedaço de nós ou de alguém, presente ou ausente, que jamais o poderão repetir. Neste quadro com quadro, o máximo que podemos fazer é não matar as memórias mas antes ressuscitá-las.

7 de agosto de 2019

Aprender sobre a Escola do Viso







Poucos terão reparado, mas o edifício da Escola Primária do Viso ao longo do tempo da sua existência sofreu várias alterações, resultado de obras de conservação e requalificação. A primeira das fotos acima, com a data do ano de 1961, bem como a segunda, de 1982, são sensivelmente iguais à da construção original. 

Todavia, pelas obras realizadas já próximo dos anos 90, a configuração da cobertura foi alterada, passando do clássico de "quatro-águas" para "duas-águas". Também a zona do recreio foi fechada com caixilharias. Do mesmo modo as vedações exteriores, nomeadamente nas envolventes nascente, norte e poente foram alteradas.

Finalmente, com o encerramento da actividade escolar e com a exportação massiva dos nossos alunos para freguesias vizinhas, o edifício passou a devoluto. Felizmente, numa boa decisão e sentido de oportunidade, é integrado no edifício do Centro Cívico do Centro Social S. Mamede de Guisande, mantendo quase todas as suas características e sendo ampliado com as modernas instalações.

Quanto a alguns apontamentos sobre a história da Escola Primária do Viso, republico o que já há algum tempo por aqui publiquei, então um pouco a pretexto da água de nascente que vinda do Monte da Mó abastecia o edifício escolar.

---

Escrevi então por aqui, alguns dados documentais sobre a construção do edifício da Escola Primária da Igreja, que ocorreu no ano de 1969. Fiz então uma referência ao período temporal em que terá sido edificado o edifício da  Escola Primária do Viso, tendo considerando por alguns testemunhos que entre o final dos anos 40 e princípio dos anos 50.

Para de algum modo confirmar esta suposição, tive a oportunidade de pesquisar o livro de actas da Junta de Freguesia de Guisande desse período, em que era presidente o Sr. António Leite de Oliveira Gomes, o Sr. Joaquim Gomes d´Almeida, secretário e o Sr. António Francisco de Paiva, tesoureiro.

A pesquisa foi curta e pouco exaustiva mas ainda assim dela colhi uma acta da sessão datada de 30 de Novembro de 1949, em que é mencionada a curiosa cedência/venda de direitos de abastecimento de água à escola do Viso, referida no documento como “novo edifício escolar”. 

Confirma-se assim que nessa data a escola já estaria edificada e concluída e por isso a necessitar de água. Por outro lado, considerando que a acta está reportada ao final do mês de Novembro, concretamente ao dia 30, será de supor que o ano escolar já teria começado, restando saber se já no novo edifício escolar, e se já com ou ainda sem  abastecimento de água, ou se a entrada ao activo aconteceria depois dessa data. Presumo que tendo este assunto sido motivo da acta da Junta em Novembro, o tal acordo de concessão terá ocorrido alguns meses antes, por conseguinte ainda a tempo de abastecer a escola por altura do começo do ano escolar (meados de Setembro, princípios de Outubro). 

É apenas uma suposição, mas não andará longe da verdade. Em todo o caso é uma situação a confirmar, eventualmente pesquisando o tal livro das actas a saber se há alguma referência quanto a esse pormenor ou então apelando à memória de alguém que tenha frequentado a escola no mesmo momento da sua entrada em funcionamento. Neste caso estamos a falar de pessoas que actualmente andarão na caso dos 74/75 anos, pois pressupondo uma entrada na primeira classe com 6 anos, para entrar em 1949 teria nascido em 1942/1943, por aí. Seja como for, é legítimo considerar e quase certo que a escola primária do Viso entrou em funcionamento em 1949 ou o mais tardar em 1950.

Voltando à questão do abastecimento de água à escola do Viso, é normal que fosse garantida uma solução de água de nascente, pois nessa época obviamente não havia rede pública e os poços eram poucos e os que havia necessitavam de rudimentares motores a petróleo, o mais vulgar, ou outro combustível, já que a freguesia por essa época  pós-guerra ainda não tinha rede eléctrica. Por conseguinte, entre a opção de encontrar água a uma cota elevada e pagar os respectivos direitos de exploração e passagem, o empreiteiro ou a entidade responsavável pela construção, acabou por encontrar uma solução no próprio local face à existência da rede de consortes. 

Independentemente do valor acordado como pagamento aos consortes, pelos tais 500 litros diários em dias de aulas, certamente que foi uma solução vantajosa para a entidade construtora ou adjudicante e com direitos perpétuos, tanto quanto se saiba. Obviamente que nessa altura ninguém suspeitaria que a então nova escola acabaria por fechar portas ao ensino passados mais ou menos 60 anos.

O contrato de concessão eventualmente poderia contemplar uma cláusula em que a mesma cessaria caso o edifício deixasse de ter a função de escola, por demolição ou por abandono. É uma questão a verificar caso ainda exista algum contrato da concessão, mas creio que não. De resto, mesmo tendo passado para a alçada do Centro Social, o edifício continua ainda a poder beneficiar da água, mesmo que já com ligação à rede pública.

Por outro lado, face a essa necessidade de água de nascente, não custa a crer que a localização do primeiro edifício escolar público em Guisande tenha sido escolhida em função da tal possibilidade de abastecimento por concessão de uma rede de consortes. de facto na época não seriam muitos os locais a beneficiar desse tipo de abastecimento. Por outro lado, na época procuravam-se para as escolas locais arejados e com boa localização, por isso com boas garantias no Monte do Viso e próximo à capela.

Quanto à referida rede de água de consortes, da qual foi concessionada uma parte ao edifício escolar, esta provém de uma nascente localizada na encosta poente do Monte da Mó, cujo percurso, da nascente à escola, ronda quase 1 quilómetro. A nascente  está na base de um poço com mais ou menos 20 metros de profundidade, por sua vez captada em três galerias que se desenvolvem em diferentes direcções e seguindo depois numa galeria com cerca de 100 metros de comprimento, do poço à boca da mina a partir da qual segue em tubagem.

Como se poderá perceber, à altura da edificação da escola do Viso, este abastecimento já existia há muitos anos e era à altura dos consortes referidos, dos quais se inclui o meu avô paterno. De resto a parte da água a ele pertencente ainda existe embora já dividida em quatro partes, uma das quais herdada pelo meu pai. A divisão da água pelas diferentes partes e consortes acontece num depósito distribuidor existente sobre o muro à face da habitação da Sr. Laurinda Almeida, minha tia. Dali parte para os diferentes consortes.

Esta rede de água originalmente estava entubada em tubos de grés, dos quais ainda há vestígios,  depois em tubos de ferro galvanizado e mais tarde entubada em tubo plástico. A nascente é abundante e nunca secou embora devido ao “raposo” e à seca no Verão por vezes o caudal sofra uma redução. Com a abertura da Auto Estrada A32, no lugar do Outeiro, o ramal foi afectado e maltratado, como outras estruturas na freguesia, e tem estado em parte a céu aberto no troço a montante da sua passagem debaixo do passeio do viaduto.

Depois do viaduto segue sempre enterrado até desembocar nos diferentes destinos. Entre o ponto mais alto (nascente) e o ponto mais baixo (Casa do Santiago) a rede tem um desnível de aproximadamente 60 metros (cota 290 até às cota 230). Já em relação à escola o desnível é de 40 metros. Em relação à caixa distribuidora o desnível é de 34 metros.

Quanto à referida acta da reunião de Junta, que abaixo se reproduz, para facilitar a leitura, a seguir transcrevemos a mesma na sua parte relacionada com o abastecimento de água ao edifício escolar. De notar que a importância  pelos direitos da água paga pelo empreiteiro aos consortes está com um espaço em branco, desconhecendo-se assim o respectivo valor e se tal foi deixado em branco de forma propositada ou por à data se desconhecer a quantia em concreto.

Acta da sesão da Junta de Freguesia de Guisande, concelho da Feira.

Aos trinta dias do mês de Novembro do ano de mil e novecentos e quarenta e nove, se reuniram em sessão ordinária presidente e vogais da referida Junta na sua sala de sessões pelas onze horas. Aberta a sessão disse o presidente que seria necessário e vantajoso constar no livro das actas, as condições que foram estabelecidas entre as autoridades da freguesia e os proprietários da água que abastece o novo edifício escolar.

Consortes da referida água são os seguintes: Joaquim Gomes de Almeida; Manuel Pereira dos Santos, António Alves Santiago e Elísio Ferreira dos Santos, fizeram esta concessão mediante a importância de (...) cujo a qual foi entrege pelo empreiteiro da mesma escola, tendo os referidos proprietários declarado que deixariam seguir para o tubo que a lá conduz cerca de 500 litros por dia, excepto aos Domingos, dias santificados e feriados, isto é, naqueles em que não há aulas, e além disso também durante todas as férias, só no caso se for preciso para lavagem da mesma. (---)


Saudosa escola do Viso,
À sombra do velho sobreiro,
Ecos de alegria e riso
Ressoam de um tempo primeiro.

Jogos, brincadeiras, folguedos,
Contas, ditados e escritas,
Tuas paredes guardam segredos
Memórias doces e bonitas.

Em ti aprendi a ler,
Nos livros que ainda guardo,
A fazer contas, a escrever
No caderno o ditado.

Professoras e meus colegas,
Rostos que ainda retenho;
Corridas, pião, cabra-cegas
Mas nas aulas, sempre empenho.

Por tudo isso, velha escola,
Saudades já tenho de ti,
Dos livros e lápis na sacola,
Letras e contas que aprendi.

Até agora, que morreste,
De tantos que partiram,
Quantas crianças acolheste,
Quantas lições te ouviram?

Já com as rugas da velhice
Regressam a ti de verdade;
Falta-lhes a cor da meninice,
Sobra-lhes a doce saudade.

- Américo Almeida

2 de agosto de 2019

Carta Educativa, mas pouco informativa



Um pouco a propósito do apontamento sobre o Jardim de Infância de Fornos,  e do encerramento das escolas em Guisande, em que por agora apenas vai subsistindo o estabelecimento escolar de Fornos (e há quem desconfie que as coisas estão a levar caminho para que também ele venha a ser encerrado e com os alunos a serem integrados em Lobão ou Louredo), não deixa de ser irónico que na Carta Educativa do município de Santa Maria da Feira, disponível do respectivo portal online,  ainda constem as Escolas Básicas do 1º Ciclo da Igreja e Viso, bem como o Jardim de Infância da Igreja, quando na realidade já passaram vários anos sobre a sua desactivação e exportação dos respectivos alunos para outras freguesias. 





6 de novembro de 2017

Escolas em Guisande, uma triste realidade


Tem sido uma fatalidade, mas a freguesia de Guisande há já alguns anos que não tem qualquer escola em funcionamento. Vai subsistindo, como amostra, o Jardim de Infância de Fornos. 
No entanto recuando a 1990, por isso há menos de trinta anos, relatava o jornal "O Mês de Guisande" em Outubro desse ano, o seguinte: 

"Foi aberto em finais de Setembro o novo ano escolar. Em Guisande começaram a funcionar 10 salas de aula assim distribuídas: Ensino Pré-Primário: Jardim de Infância do lugar da Igreja, com a professora Maria João, 25 crianças; Jardim de Infância do lugar de Fornos: (sem informação, mas seguramente com pelo menos mais 15 crianças). Ensino Primário: Escola da Igreja, com a professora Maria Lúcia Valente, 20 alunos, com a professora Maria Eugénia Silva, 15 alunos, com a professora Maria Célia Giro, 20 alunos e com a professora Maria Marilda Ferreira, 20 alunos; Escola do Viso: Com o professor Carlos Alberto Letra, 18 alunos e com a professora Maria Teresa, 22 alunos.

Em resumo, 40 alunos na Pré-Escola e 115 na Escola Primária. Quantos seremos hoje, somando os que andam dispersos por escolas de outras freguesias? Não, não façam contas porque será sempre uma triste realidade. Alguma responsabilidade política, certamente, mas sobretudo o contexto de uma nova realidade de centralismo dos equipamentos escolares e a crescente baixa de natalidade.

26 de agosto de 2017

Professor Joaquim Ferreira Pinto e outras histórias


Joaquim Ferreira Pinto, nasceu a 14 de Janeiro de 1879, no lugar de Fornos, freguesia de Guisande. Filho de Joaquim Caetano Pinto e de Ana Rosa Duarte. 
Foi baptizado na igreja matriz de Guisande, tendo como padrinho o Abade António Ferreira Duarte (1), então pároco de S. Miguel do Mato - Arouca e Joaquina Rosa Duarte.
Era neto paterno de Manuel Caetano Pinto e de Joana de Jesus e neto materno de Manuel Ferreira Duarte e de Joana Margarida Gomes.
Formou-se em professor e exerceu numa escola privada que tinha no lugar de Casaldaça, Guisande.
Faleceu em 03 de Setembro do ano de 1971 com 91 anos de idade. Está sepultado no cemitério de Guisande.


Extracto da certidão de baptismo do Prof. Joaquim Ferreira Pinto.

Nota: (1) - O Abade António Ferreira Duarte, nasceu em Cedofeita, freguesia do Vale - Vila da Feira, no dia 04 de Janeiro de 1813. Era filho de António Ferreira Duarte e de Maria Eufrásia de Jesus, ambos de Cedofeita. Em 1833 já aparece na freguesia do Vale como padre. Foi abade de S. Miguel do Mato, concelho de Arouca, tendo falecido  no dia 24 de Março de 1888.

Notas complementares: Pelo que referimos em artigos anteriores, nomeadamente aqui e aqui, sabemos que o edifício da Escola Primária do Viso foi edificado no ano de 1949 e que a Escola Primária da Igreja teve a sua construção vinte anos depois, ou seja em 1969. De construção posterior apenas as instalações dos Jardins de Infância ou Pré-Primária da Igreja e de Fornos (esta a única em actividade).

Apesar destes factos relativos aos dois mais conhecidos edifícios escolares na freguesia, o ensino escolar primário em Guisande é anterior, remontando seguramente ao início dos anos vinte, sendo que então apenas para alunos do sexo masculino. Assim as primeiras referências a esta fase inicial da escolaridade primária em Guisande vão para o professor Joaquim Ferreira Pinto, irmão do cónego António Ferreira Pinto, o qual leccionava as quatro classes numa escola em edifício, pertencente ao próprio, situado no lugar de Casaldaça, mais concretamente no local onde actualmente existe a casa da Sr.ª Natália.

Esta escola integrava os rapazes da freguesia, no entanto não extensível à sua totalidade uma vez que então a frequência não era obrigatória e iriam apenas os filhos de gente mais abastada ou pelo menos mais receptiva a dispensar a mão-de-obra tão importante quanto necessária na lide da casa e dos campos.

Tenho indicação que já por essa altura a frequentaram o meu falecido pai (António Gomes de Almeida), nascido em 1917 e o meu tio Neca (Manuel Joaquim Gomes de Almeida), ainda vivo, com quase 94 anos de idade, que ainda relata as memórias desse tempo e de modo particular o seu tempo de escola. Segundo esses mesmos relatos na primeira pessoa, a escola era composta por uma única e ampla sala na qual o professor Joaquim leccionava em simultâneo as quatro classes. O número de rapazes terá chegado aos 80, por isso uma média de 20 por classe. O horário seria das 08:00 horas às 14:30 horas, sem intervalo para almoço e não raras vezes, por castigo, era suprimida a hora de recreio. Para além deste horário exigente, os alunos que estavam em vias de realizar o exame da quarta classe tinham ainda umas horas adicionais no resto da tarde.

Ainda segundo as memórias do meu tio Neca, o professor Joaquim, era extremamente exigente e mesmo muito severo nos castigos e na disciplina que fazia cumprir a reguadas, canadas e até a "biqueiradas e palmadas". Seria o "terror" dos alunos. Não espanta, pois, que muitos dos rapazes simulassem dores de barriga, vómitos (forçados com dedos enfiados pela goela abaixo) e dores de cabeça, para  de algum modo, com o seu ar de doentes e abatidos sensibilizarem os pais (sobretudo as mães) e poderem escapar a umas aulas. A severidade dos regentes/professores desses tempos era quase uma regra. Para o bem e para o mal, as coisas inverteram-se e em poucos anos passamos do 8 ao 80 e por agora a tônica é o desrespeito e mesmo abusos dos alunos para com os professores.

Esta situação de ensino escolar aberto apenas a rapazes, e não a todos, mantinha-se ainda no ano de 1936, pois o cónego António Ferreira Pinto, na sua monografia sobre a freguesia de Guisande, "Defendei Vossas Terras...", fazia uma referência a essa situação, concretamente: 

(...Há escola apenas para o sexo masculino e o edifício, que é pequeno, pertence ao professor por herança. Está criada a escola para o sexo feminino, mas não pode funcionar, porque não há edifício em condições. Todos reconhecem a necessidade duma construção para as duas escolas, mas a pouca vontade de uns, a falta de recursos de outros, o individualismo ou egoísmo de alguns que não têm filhos ou já estão crescidos e educados e talvez outros motivos que desconheço — tudo impede um melhoramento que é de necessidade e de utilidade sobretudo para as meninas. E uma obra de utilidade pública e social. Oxalá que isto seja compreendido por todos para honra da terra, realizando-se a obra para bem e interesse geral.)

Resulta daqui que já por essa época sentia-se a necessidade de abrir o ensino das primeiras letras às raparigas de Guisande, mas a dificuldade, para além de culturais, porque numa época em que era comum o analfabetismo e os filhos eram mão-de-obra não dispensável, era também material já que não havia posses para um edifício público próprio.
Seja como for, a ter em conta a leitura da acta da Junta de Freguesia dessa época (que abaixo se reproduz), em que era presidente o Sr. José Gomes Leite, do lugar do Reguengo, a opinião do ilustre cónego era partilhada pela Junta. Leia-se, por isso, a acta da reunião de Março de 1937, mesmo que num português rudimentar, a precisar de escola:

Acta da sessão da Junta de Freguesia de Guisande, concelho de Vila da Feira.
Aos ... dias do mês de Março do ano de mil nove centos e trinta e sete, se reuniu em sessão ordinária a Junta de Paróquia na sala das sessões. Disse o Sr. Presidente que não tendo escola feminina temos necessidade da criação de um posto escolar para o sexo feminino, para ser a sede no lugar do Reguengo, com os lugares adjuntos, sendo Reguengo, Barrosa, Fornos, Lama, Casaldaça, Quintães e Cimo de Vila. Para a regente ser nomeada a D. Branca Ester dos Santos Cabral de Sousido, o que isto foi resolvido pelo Sr. Presidente para não ficarem as crianças sem escola por não haver escola feminina. Temos a escola criada mas não temos edifício para exercer a escola para a professora. Esperamos ver a criação do posto para benefício de tantas meninas que há na nossa freguesia e que aquelas que precisam aprender e tem vontade andam fora, em Lobão. e outras não aprendem por não ter.
Não havendo mais nada a tratar foi encerrada a sessão lavrando-se o presente acta que vai ser assinada por todos.
José Gomes leite
António Custódio Gonçalves
António Augusto Guedes.


Não deixa de ser curiosa a situação abordada na referida acta da Junta em 1937, sendo que mesmo pela leitura de actas seguintes não é líquido que tal escola ou simplificadamente esse posto escolar tenha mesmo sido concretizado. De resto, por relatos do meu tio Neca, com a autoridade dos seus quase 94 anos e boa memória, não se recorda de ter havido escola ou posto escolar no lugar do Reguengo. Funcionou, isso sim, no lugar do Viso, no local na casa do falecido Sr. Antoninho (sogro do Sr. Manuel Tavares), por isso ao fundo monte. E a professora foi precisamente a referida D. Branca (D. Branquinha, como era conhecida), da freguesia de Louredo. Terá, pois, sido alterada para o lugar do Viso a pretensão inicial da Junta de Freguesia de localizar  o posto escolar no lugar do Reguengo, eventualmente este proposto pelo facto do presidente da Junta da época (José Gomes Leite) ser dali. Eventualmente o edifício a ser considerado para tal função seria até do próprio.
Outra nota curiosa, este posto escolar no lugar do Viso terá sido posteriormente deslocado (cerca de 150 metros para sul) para  o lugar das Quintães, passando a funcionar no edifício actualmente pertencente ao Sr. Rogério Neves, próximo da Casa do Santiago e na altura de propriedade do sogro do Sr. Rogério, precisamente o referido presidente da Junta de então, o Sr. José Gomes Leite.

Um ano depois, em 1937, a mesma Junta de Freguesia, por acta datada de 27 de Março de 1938, faz referência à intenção de abrir um segundo posto escolar para raparigas, a sediar no lugar da Leira e a abranger alunos dos lugares não referidos na acta de 1936 (sendo que por curiosidade não são mencionados os lugares da Igreja e Viso, que viriam precisamente anos depois a ser a sede das duas escolas primárias). Convém referir que por essas alturas os acessos entre os diferentes lugares da freguesia eram poucos e fracos, essencialmente por caminhos, e por isso, sobretudo em tempos de chuva, ir de uma ponta da freguesia à outra era um autêntico cabo dos trabalhos. Não espantaria que para se ir de Estôze ao Reguengo ou vice-versa fosse coisa para demorar uma hora por mau caminho, com covas e lama. Por outro lado, as raparigas eram seguramente mais que as mães pelo que a justificação de dois postos assentaria numa necessidade geográfica mas também de lotação.

Vejamos então a deliberação da referia acta da Junta de Freguesia datada de 27 de Março de 1938:

Aos vinte e sete dias do mês de Março de mil e nove centos e trinta e oito  na sala das sessões da Junta de Freguesia de Guisande, concelho da Feira, compareceram os cidadãos José Gomes Leite, António Custódio Gonçalves e António Augusto Guedes, respectivamente presidente e vogais, às onze horas precisas foi pelo presidente declarada aberta a sessão. Pelo presidente foi dito havendo inteira necessidade de criação de um posto escolar feminino nesta freguesia no lugar da leira, visto os lugares abaixo mencionados ficarem muito distantes do posto escolar que existe e a escola masculina não poder aceitar as meninas a sua frequência por determinação da lei. Mais propôs que este posto escolar venha a servir os lugares de Leira (sede), Gândara, Estôze, Pereirada e Outeiro. Para regente a D. Gracinda Gomes da Silva, habilitada com exame de aptidão desde Outubro de mil e nove centos e trinta e sete, natural desta freguesia, órfã de mãe e ser de absoluta necessidade de haver protecção às famílias numerosas visto serem mais dez irmãos e por lutar com dificuldade para a sustentação e educação dos seus onze filhos. Depois de discutida e apreciada a proposta em todos os pontos, esta Junta deliberou por unanimidade a aprová-la. Não havendo mais a tratar pelo presidente foi encerrada a sessão. Para que conste lavrei a presente acta que vai ser lida em voz alta e assinada por todos.
José Gomes Leite
António Custódio Gonçalves
António Augusto Guedes.

Nesta acta, para além da referência à tal necessidade da abertura de um segundo posto escolar para meninas, a referência pessoal à nomeação da regente (professora), órfã de mãe, uma de onze irmãos. Não deixa de ser notável que alguém de uma família numerosa, sem mãe e com dificuldades inerentes, tenha conseguido fazer exame de habilitação para regente de uma escola primária, mesmo sabendo-se que os requisitos da época para este cargo não fossem obviamente muito exigentes, não sendo para o efeito necessária qualquer licenciatura, mas apenas uma formação básica e um exame. Refira-se, ainda a titulo de curiosidade que esta D. Gracinda, era natural de Guisande e irmã da Sr.ª Celeste, esta mãe da professora Marilda e do Jorge Ferreira,e que também ela durante muitos anos foi regente/professora na freguesia de Caldas de S. Jorge e sobretudo em Lobão, na Escola do lugar do Ribeiro. Esta professora Gracinda casou e viveu posteriormente em S. João da Madeira.

Destas duas actas que se referem à criação de dois postos escolares destinados a raparigas, conclui-se que Guisande pelos meados dos anos 30 e até final dos anos 40 teve assim uma escola para rapazes e dois postos para raparigas. Há ainda a informação de que terá também funcionado um posto escolar no lugar da Gândara, onde actualmente existe a Casa Neves, facto que ainda não conseguimos confirmar. Este edifício, e novamente a curiosidade, seria então de António Augusto Guedes, precisamente um membro da Junta da época, o que é perfeitamente compreensível que se tenha disposto a conseguir disponibilizar um local para o posto escolar. Será, pois, de supor que a tal intenção de sediar o posto escolar feminino dirigido pela D. Gracinda tivesse funcionado um pouco mais a norte, no lugar da Gândara.

Estas situações de postos escolares em edifícios particulares e de carácter provisório e certamente que por isso não vocacionados ou preparados condignamente para o ensino, terão sido resolvidas com a construção da Escola Primária do Viso, com duas salas, uma para rapazes e outra para raparigas, como dissemos, no ano de 1949. A partir daí, com uma construção de raiz e com carácter público, terá ficado centralizado na Escola do Viso todo o ensino primário na nossa freguesia de Guisande. Apenas vinte anos depois, em 1969, a  freguesia sentiu necessidade de edificar um novo edifício, com a construção da Escola Primária da Igreja. Estas duas escolas funcionaram em simultâneo durante pelo menos 40 anos. Infelizmente, com as políticas de centralização dos serviços do ensino primário a par da nítida baixa de natalidade, tornou-se inevitável o encerramento da actividade escolar primária na nossa freguesia (de que é excepção o Jardim de Infância de Fornos e mesmo assim com algumas crianças de fora da freguesia)  e por conseguinte do encerramento dos respectivos edifícios escolares. Do mal o menos, ainda continuam de propriedade pública e por isso ou já integrados ou a integrar em actividades sócio-culturais da nossa freguesia.




Actas da Junta de Freguesia acima referidas.

26 de julho de 2017

Construção da Escola da Igreja






O edifício da Escola Primária da Igreja foi construído e terminado no ano de 1969. Tal data está assinalada numa pequena placa de mármore disposta sensivelmente a meio da fachada principal, conforme fotografia acima. 
Pessoalmente, fiz a primeira classe na Escola Primária do Viso e já a segunda classe  e seguintes frequentei-as na nova escola da Igreja apesar de morar a dois passos da escola do Viso. Fui para lá no ano escolar de 1970/1971, por isso quase a estrear.

Infelizmente não são conhecidos documentos relacionados com a construção, sendo que o projecto obedeceu a um modelo tipo e que por essa época era generalizado e seguido um pouco por todo o país, de resto como aconteceu com a Escola Primária do Viso (edificada entre o final dos anos 40 e princípios dos anos 50), também ela com projecto de modelo tipo aplicado em todo o país, embora com as adaptações de dimensionamento de acordo com a população escolar, havendo edifícios com uma sala, com duas (como a do Viso), com três, quatro e até seis.

Nos dias que correm, seria normal que a construção de um edifício escolar, mesmo que da responsabilidade do Ministério da Educação ou da Câmara Municipal, merecesse o interesse, acompanhamento e referências documentais por parte da respectiva Junta de Freguesia. Todavia, pesquisando no livro de actas da Junta de Freguesia de Guisande em exercício nesse referido ano de 1969, em que era presidente António Alves Santiago, apenas encontrei umas ligeiras referências à construção da Escola Primária da Igreja. Trata-se da acta datada de 12 de Janeiro de 1969, a qual é toda ocupada com o assunto da escola. O documento, que abaixo se reproduz, é legível, mas em resumo diz que "...pelo presidente foi dito que no dia nove do corrente mês principiou a terraplanagem para o edifício escolar no sítio indicado pelo Sr. Engenheiro da Câmara, no lugar da Igreja, sítio muito arejado e bom; é empreiteiro desta obra o Sr. Joaquim Marques Lopes do lugar do Picôto da freguesia de Argoncilhe, empreiteiro com muita competência, ficando todo o serviço bem feito e seguro. O edifício já terminou de pedreiro no dia oito de Março, seguindo-se os trolhas e carpinteiros, que dentro de pouco tempo estará concluído todo. Fica um  belo edifício e num sítio muito aprasado."

Como se vê, as referências mesmo que ocupando toda a acta, são muito vagas mas pelo menos fica-se a saber o nome do empreiteiro para além da consideração do sítio como "arejado" e "aprasado". Há ali, no entanto, uma contradição de tempo já que é referido que a obra de pedreiro ficou terminada no dia 8 de Março quando a acta é de 12 de Janeiro, por isso uma data anterior. É uma contradição que só se justifica como tendo a acta sido lavrada já depois de Março embora reportada a Janeiro. É uma possibilidade já que a periodicidade e regularidade das reuniões de Junta  nesses tempos não eram rigorosamente cumpridas. Eram realizadas quando desse jeito.

A escola na altura era obviamente nova e com linhas modernas para o padrão da época. Tinha um jardim frontal e uma zona de recreio bastante ampla, em terra batida, a qual foi cimentada muitos anos depois. Claro está que no início, eram os próprios alunos quem tratavam da manutenção e limpeza semanais, varrendo-se as salas e o terreiro do recreio, limpando-se as instalações sanitárias e cuidando do jardim. Existia também uma cabine com a bomba do poço que alguns alunos tinham que girar a grande roda para encher o depósito de água para serviço dos sanitários. Claro que era uma brincadeira pois aproveitava-se o balanço da roda para fazer uma espécie de baloiço. Outros tempos, em que as empregadas de limpeza (hoje pomposamente técnicas auxiliares ou técnicas operacionais) eram uma raridade.

Nos anos seguintes foram sendo feitas algumas obras bem como a construção da parte do Jardim de Infância (nos anos 90). A cabine do poço e respectiva bomba foram posteriormente removidas.

Infelizmente, por más políticas caseiras e decréscimo da população escolar, como quem diz das crianças, tanto a escola do Viso como da Igreja ficaram sem alunos, deslocados para Louredo e Lobão. Apenas subsiste uma amostra de alunos no Jardim de Infância no lugar de Fornos.

Do mal o menos, o emblemático edifício da escola do Viso está aproveitado e integrado no Centro Cívico, bem como parte da escola da Igreja está entregue por protocolo a uma associação local, sendo que aqui o desejável é que seja ocupado e dinamizado plenamente por outras colectividades da freguesia, nomeadamente a Associação "O Despertar". Veremos o que reserva o futuro para estes equipamentos que marcaram gerações, onde lá aprendemos e brincamos e de certa forma moldamos muito do que somos hoje como pessoas e cidadãos.

Actualização a 11 de Novembro de 2018:
A sala até aqui vaga, do lado nascente, será ocupada pelo Banco Solidário, dinamizado pelo Grupo Solidário de Guisande e inserido no Fórum Social da União de Freguesias de Lobão, Gião, Louredo e Guisande, com inauguração prevista para o próximo Domingo, 18 de Novembro.