27 de novembro de 2019

Memórias Paroquiais de 1758 - Guisande - Lugares


Em 1758, três anos após o terrível sismo de Lisboa de 1755, em certa medida para saber da situação das terras e consequências do terramoto no território nacional, o Marquês de Pombal mandou realizar um inquérito em todas as paróquias. O mesmo foi enviado a todos os Bispos das Dioceses do país, para que por sua vez fosse encaminhado às então 4073 freguesias existentes em Portugal  e respondido pelos seus párocos. As respostas às diferentes perguntas (ver abaixo) deveriam ser tão precisas quanto possível e de seguida remetidas à Secretaria de Estado dos Negócios do Reino.

A tarefa de proceder à organização das respostas de todos os documentos coube ao Padre Luís Cardoso, sendo concluída apenas em 1832, já depois do seu falecimento, altura em que se terá completado o índice de todas as respostas aos inquéritos. Os originais das respostas ao inquérito encontram-se na Torre do Tombo.
Na paróquia de S. Mamede de Guisande, sucedendo ao Pe. Manuel de Carvalho, fundador da Confraria de Nossa Senhora do Rosário, no presente ainda activa, era pároco na altura o Dr. Manuel Rodrigues da Silva, que respondeu ao referido inquérito.

Desde há muitos anos que é de consenso comum e adquirido que a nossa freguesia de Guisande é constituída pela Parte de Cima e pela Parte de Baixo e por 14 lugares, concretamente: Igreja, Quintães, Viso, Cimo de Vila, Outeiro, Estôse, Pereirada, Leira, Gândara, Fornos, Barrosa, Reguengo, Lama e Casaldaça.

No entanto, na resposta ao ponto 6º do referido inquérito de 1758, o pároco referiu as partes ou metades de Cima e de Baixo, bem como os 14 lugares, mas estes com nomes que diferem um pouco da situação actual.
Respondeu o abade que a metade de Baixo era formada por  sete lugares chamados de Reguengo, Barroza, Fornos, Lama, Lamozo e Cazaldaça; e que a outra metade, chamada de Cima, tinha oito lugares, chamados de Leyra, Estôze, Pereirada, Quintam, Oiteiro, Simo de Villa, Quintana e Trás-da-Igreja.
Ora atentos à descrição, e relevando a questão da grafia própria da época, o abade começa por se enganar no total de lugares da parte de Baixo, dizendo 7 quando elenca apenas seis. Além disso, acrescenta os lugares de Lamozo e Quintam (este último que corresponderá a Quintão), mas não refere os lugares do Viso e Gândara.

Claro que ficamos sem saber em rigor qual o uso da época, podendo até ser esse o alinhamento dos lugares da freguesia na época, pelo que posteriormente, certamente devido à expansão dos lugares, terão sido acrescidos o do Viso e o da Gândara enquanto que por sua vez os lugares de Lamozo e Quintam deixaram o estatuto de lugares, passando a sítios, que de resto ainda hoje são conhecidos.

O Abade Dr. Manuel Rodrigues da Silva à data do inquérito já paroquiava Guisande há vários anos pelo que não é crível que ainda desconhecesse a composição por lugares da sua paróquia a ponto de se justificar o que poderia ser um lapso.
De todo o modo, fica a dúvida e o mistério para procurar esclarecer no futuro.

Voltaremos a este assunto das Memórias Paroquiais e o inquérito de 1758 que lhe deu corpo.

Entretanto ficam abaixo as perguntas que constavam do Inquérito ordenado pelo Marquês de Pombal.

Acrescente-se que, pelo que fui lendo nas respostas dadas por certos párocos de certas freguesias, referentes a várias freguesias, tanto do nosso concelho como de Arouca, Castelo de Paiva e outras, nem sempre os párocos respondiam à totalidade das perguntas ou apenas resumiam as mesmas tanto quanto possível, ou diziam nada ter a declarar. Sendo os padres uma entidade com conhecimento e cultura bastantes, não podiam encontrar desculpa no desconhecimento ou incapacidade de resposta às várias perguntas. Preguiça, certamente, pois tempo é que não faltaria aos então clérigos.


As perguntas colocadas no inquérito de 1758 foram as seguintes:

Parte I: O que se procura saber da terra

1. Em que província fica, a que bispado, comarca, termo e freguesia pertence.

2. Se é d’el-Rei, ou de donatário, e quem o é ao presente.

3. Quantos vizinhos tem, e o número de pessoas.

4. Se está situada em campina, vale, ou monte e que povoações se descobrem dela, e quanto distam.

5. Se tem termo seu, que lugares, ou aldeias compreende, como se chamam, e quantos vizinhos tem.

6. Se a Paróquia está fora do lugar, ou dentro dele, e quantos lugares, ou aldeias tem a freguesia, e todos pelos seus nomes.

7. Qual é o seu orago, quantos altares tem, e de que santos, quantas naves tem; se tem Irmandades, quantas e de que santos.

8. Se o Pároco é cura, vigário, ou reitor, ou prior, ou abade, e de que apresentação é, e que renda tem.

9. Se tem beneficiados, quantos, e que renda tem, e quem os apresenta.

10.Se tem conventos, e de que religiosos, ou religiosas, e quem são os seus padroeiros.

11.Se tem hospital, quem o administra e que renda tem.

12. Se tem casa de Misericórdia, e qual foi a sua origem, e que renda tem; e o que houver de notável em qualquer destas coisas.

13. Se tem algumas ermidas, e de que santos, e se estão dentro ou fora do lugar, e a quem pertencem.

14. Se acode a elas romagem, sempre, ou em alguns dias do ano, e quais são estes.

15. Quais são os frutos da terra que os moradores recolhem com maior abundância.

16. Se tem juiz ordinário, etc., câmara, ou se está sujeita ao governo das justiças de outra terra, e qual é esta.

17. Se é couto, cabeça de concelho, honra ou beetria.

18. Se há memória de que florescessem, ou dela saíssem, alguns homens insignes por virtudes, letras ou armas.

19. Se tem feira, e em que dias, e quanto dura, se é franca ou cativa.

20. Se tem correio, e em que dias da semana chega, e parte; e, se o não tem, de que correio se serve, e quanto dista a terra aonde ele chega.

21. Quanto dista da cidade capital do bispado, e quanto de Lisboa, capital do Reino.

22. Se tem algum privilégio, antiguidades, ou outras coisas dignas de memória.

23. Se há na terra, ou perto dela alguma fonte, ou lagoa célebre, e se as suas águas tem alguma especial virtude.

24. Se for porto de mar, descreva-se o sitio que tem por arte ou por natureza, as embarcações que o frequentam e que pode admitir.

25. Se a terra for murada, diga-se a qualidade dos seus muros; se for praça de armas, descreva-se a sua fortificação. Se há nela, ou no seu distrito algum castelo, ou torre antiga, e em que estado se acha ao presente.

26. Se padeceu alguma ruína no terramoto de 1755, e em quê, e se está reparada.

27. E tudo o mais que houver digno de memória, de que não faça menção o presente interrogatório.

Parte II: O que se procura saber da serra

1. Como se chama.

2. Quantas léguas tem de comprimento e quantas tem de largura, aonde principia e acaba.

3. Os nomes dos principais braços dela.

4. Que rios nascem dentro do seu sítio, e algumas propriedades mais notáveis deles; as partes para onde correm e onde fenecem.

5. Que vilas e lugares estão assim na Serra, como ao longo dela.

6. Se há no seu distrito algumas fontes de propriedades raras.

7. Se há na Serra minas de metais, ou canteiras de pedras, ou de outros materiais de estimação.

8. De que plantas ou ervas medicinais é a serra povoada, e se se cultiva em algumas partes, e de que géneros de frutos é mais abundante.

9. Se há na Serra alguns mosteiros, igrejas de romagem, ou imagens milagrosas.

10. A qualidade do seu temperamento.

11. Se há nela criações de gados, ou de outros animais ou caça.

12. Se tem alguma lagoa ou fojos notáveis.

13. E tudo o mais que houver digno de memória.

Parte III: O que se procura saber do rio

1. Como se chama assim, o rio, como o sitio onde nasce.

2. Se nasce logo caudaloso, e se corre todo o ano.

3. Que outros rios entram nele, e em que sitio.

4. Se é navegável, e de que embarcações é capaz.

5. Se é de curso arrebatado, ou quieto, em toda a sua distância, ou em alguma parte dela.

6. Se corre de norte a sul, se de sul a norte, se de poente a nascente, se de nascente a poente.

7. Se cria peixes, e de que espécie são os que traz em maior abundância.

8. Se há nela pescarias, e em que tempo do ano.

9. Se as pescarias são livres ou algum senhor particular, em todo o rio, ou em alguma parte dele.

10. Se se cultivam as suas margens, e se tem muito arvoredo de fruto, ou silvestre.

11. Se têm alguma virtude particular as suas águas.

12. Se conserva sempre o mesmo nome, ou começa a ter diferente em algumas partes, e como se chamam estas, ou se há memória que em outro tempo tivesse outro nome.

13. Se morre no mar, ou em outro rio, e como se chama este, e o sitio em que entra nele.

14. Se tem alguma cachoeira, represa, levada, ou açudes que lhe embaracem o ser navegável.

15. Se tem pontes de cantaria, ou de pau, quantas e em que sítio.

16. Se tem moinhos, lagares de azeite, pisões, noras ou algum outro engenho.

17. Se em algum tempo, ou no presente, se tirou ouro das suas areias.

18. Se os povos usam livremente as suas águas para a cultura dos campos, ou com alguma pensão.

19. Quantas léguas tem o rio, e as povoações por onde passa, desde o seu nascimento até onde acaba.

20. E qualquer coisa notável, que não vá neste interrogatório.