08/05/2024

Mortalidade noutros tempos em Guisande


Hoje em dia a mortalidade infantil em Portugal, como nos países mais ou menos desenvolvidos, é baixa quando comparada com anos passados e naturalmente com um acréscimo das taxas quanto mais recuamos no tempo. 

Em 2023, de acordo com dados da Pordata, em Portugal por cada mil nascimentos a média de falecimentos foi de 2,5.

Recuando a 1974, quando se deu o fim da ditadura a taxa estava em 37,9. Continuando a recuar, em 1960 estava em 77,5. E recuando ainda mais, a taxa era ainda mais elevada.

As razões para os actuais valores são óbvias e sobretudo decorrem do desenvolvimentos da ciência média, medicamentos, vacinas, da rede de cuidados primários de higiene e saúde, respectivos tratamentos, e, naturalmente, o alargamento da rede de estabelecimentos de saúde dos primários aos centros hospitalares.

Por conseguinte, noutros tempos, era elevado o número de mortes de menores, alguns durante o parto e outros nos primeiros dias, meses ou anos de vida.

Consultando velhos assentos paroquiais dos óbitos, mesmo de Guisande,  impressiona de facto a proporção de mortes de crianças. Até mesmo de pessoas já adultas mas de baixas idades, na casa dos vinte ou trinta anos.

Como um exemplo da moralidade em Guisande:

Em 1844 faleceram 16 pessoas: Homens 5; Mulheres 4, Meninos 4; Meninas 3.

Em 1846: Total 12. Homens 3; Mulheres 7, Meninos 0; Meninas 2.

Em 1847: Total: 15. Homens 4; Mulheres 1, Meninos 7; Meninas 3.

Em 1848: Total: 13. Homens 3; Mulheres 5, Meninos 4; Meninas 1.

Em 1849: Toal: 10. Homens 2; Mulheres 4, Meninos 2; Meninas 2.

Em 1850: Total: 12. Homens 0; Mulheres 5, Meninos 5; Meninas 2.

Em 1851: Total:12. Homens 4; Mulheres 3, Meninos 3; Meninas 2.

Em 1852: Total: 3. Homens 0; Mulheres 1, Meninos 0; Meninas 2.

Em 1853: Total: 7. Homens 1; Mulheres 2, Meninos 2; Meninas 2.

Em 1854: Total: 8. Homens 3; Mulheres 1, Meninos 3; Meninas 1.

Em 1855: Total: 16. Homens 7; Mulheres 5, Meninos 3; Meninas 1.

Em 1856: Total: 22. Homens: 6; Mulheres: 8; Meninos: 3; Meninas: 5.

Em 1857: Total: 15. Homens 6; Mulheres 5, Meninos 4; Meninas 0.

Em 1858: Total: 6. Homens 3; Mulheres 3, Meninos 0; Meninas 0.

Em 1859: Total: 5. Homens 1; Mulheres 2, Meninos 0; Meninas 2.

Em 1861 faleceram um total de 9 pessoas.

Em 1862 faleceram um total de 11 pessoas.

Em 1865 faleceram um total de 9 pessoas.

Em 1866 faleceram um total de 7 pessoas.

Em 1867 faleceram um total de 7 pessoas:

Em 1868 faleceram um total de 16 pessoas.

Em 1869 faleceram um total de 12 pessoas.

Em 1870 faleceram um total de 11 pessoas.

Em 1871 faleceram um total de 18 pessoas.

Em 1872 faleceram um total de 5 pessoas.

Em 1873 faleceram um total de 9 pessoas.

Em 1874 faleceram um total de 18 pessoas.

Em 1875 faleceram um total de 7 pessoas.

Em 1876 faleceram um total de 10 pessoas.

Em 1877 faleceram um total de 12 pessoas.

Em 1878 faleceram um total de 10 pessoas.

Em 1879 faleceram um total de 10 pessoas.

Em 1880 faleceram um total de 12 pessoas.

Em 1890 faleceram um total de 12 pessoas.

Em 1894 faleceram um total de 9 pessoas.

Em 1895 faleceram um total de 16 pessoas.

Em 1900 faleceram um total de 7 pessoas.

Em 1910 faleceram um total de 7 pessoas.

É certo que, como se percebe pelos números acima, havia variação de ano para ano, mas na maior parte dos anos é significativo o número de menores falecidos quando comparado com os tempos actuais.

Morria-se basicamente por falta de cuidados médicos e por isso muitas doenças que agora são relativamente fáceis de debelar, noutros tempos eram fatais. Os assentos paroquiais raramente referem a causa da morte e algumas poucas vezes com a designação genérica de "moléstia" ou "maleita" mas sabe-se que havia doenças determinantes como a bronquite, pneumonias, diversos tipos de febre e outras epidemias. 

Pela falta de estabelecimentos hospitalares ou similares, e mesmo de médicos, a regra era as mulheres darem à luz em casa, tantas vezes sem o devido acompanhamento, e apenas, nem sempre, por parteira mais ou menos expedita e conhecida no meio. Escusado será dizer que a gestação também não tinha qualquer tipo de acompanhamento. 

Finalmente, o que ajudava ao problema, não existiam regras e métodos anti-concepcionais e por isso era comum as mulheres gerarem uma carrada de filhos, uns a seguir aos outros, tantos quantos a natureza permitisse.

ANÁLISE DOS NÚMEROS:

Entre os anos de 1844 e 1910, os registos de mortalidade revelam a evolução das condições de vida e saúde da nossa comunidade ao longo de mais de seis décadas. Estes dados mostram não apenas as flutuações anuais no número de falecimentos, mas também as mudanças sociais e sanitárias que marcaram o século XIX e o início do século XX.

O período abrange 37 anos com números registados, variando entre um mínimo de três e um máximo de vinte e duas mortes anuais, com uma média aproximada de onze falecimentos por ano. Nos primeiros anos (1844 a 1859), os registos são mais detalhados, estando incluída a distinção entre homens, mulheres, meninos e meninas. Essa informação permite observar que, nesse intervalo, ocorreram 181 mortes: 54 homens, 57 mulheres, 40 meninos e 30 meninas. A mortalidade era, portanto, equilibrada entre adultos do sexo masculino e feminino, mas quase 40% das mortes correspondiam a crianças, um valor muito elevado que reflete a vulnerabilidade infantil da época e as condições sanitárias precárias a que a nossa freguesia não era imune.

Entre 1844 e 1859, a mortalidade foi irregular e elevada, com grandes variações de ano para ano. Os picos de 1855 e 1856, com 16 e 22 falecimentos respetivamente, coincidem com as epidemias de cólera que afectaram Portugal e outras partes da Europa. Estes anos registam o ponto mais alto de mortalidade da série, sugerindo um impacto epidémico local severo. Outros aumentos expressivos ocorreram em 1847 e 1848, possivelmente relacionados a doenças infecciosas sazonais. Após 1856, nota-se uma ligeira diminuição, embora os números permaneçam superiores a 10 mortes por ano.

Entre 1860 e 1879, os dados mostram uma estabilização em torno dos nove a doze falecimentos anuais. Ainda surgem anos com valores mais altos, como 1868 (dezasseis mortes) e 1871 e 1874 (dezoito mortes cada), que podem indicar novos surtos epidémicos ou crises alimentares. No entanto, em comparação com as décadas anteriores, a variação é menor, e a mortalidade parece ter-se tornado mais previsível.

A partir de 1880 e até ao início do século XX, a mortalidade mantém-se em níveis baixos e relativamente constantes. Os registos de 1880, 1890, 1895, 1900 e 1910 indicam entre sete e doze mortes por ano, um contraste notável com os valores das décadas anteriores. Esta estabilização sugere melhorias nas condições de higiene, no acesso a cuidados médicos e na alimentação, acompanhando o progresso social e tecnológico do final do século XIX. O desaparecimento de grandes picos epidémicos é um dos sinais mais evidentes dessa transformação.

A evolução geral aponta para três fases distintas. A primeira, entre 1844 e 1859, caracteriza-se por alta mortalidade e forte instabilidade, com crises provocadas por epidemias e más condições sanitárias. A segunda, de 1860 a 1879, representa um período de transição, ainda sujeito a oscilações mas com tendência à estabilidade. A terceira, de 1880 a 1910, marca uma redução clara da mortalidade e o início de uma era de maior segurança sanitária e social.

Em síntese, os dados mostram uma comunidade que atravessa um processo de transformação profunda. No início do período, a mortalidade é elevada e irregular, com grande peso da mortalidade infantil e das doenças infecciosas. Nas décadas seguintes, verifica-se um declínio sustentado dos óbitos e um aumento da regularidade anual, resultado de melhorias na saúde pública e nas condições de vida. Ao chegar a 1910, o número de falecimentos anuais é menos de metade do registado em meados do século XIX, refletindo um avanço significativo no bem-estar da população.