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15 de setembro de 2025

Recomendações do Dr. Claude

O Claude, um serviço de IA - Inteligência Artificial, disse ao Aparício, rapaz com mais ou menos a minha idade e mais ou menos o meu peso, que para essa relação de motor, digamos assim, pode continuar a correr com ritmos entre o 5:30/6.00 minutos/km, e por vezes mesmo na ordem dos 5 minutos/km, em planos, mas que já são valores que exigem boa capacidade cardiorespiratória e boa base de treino. 

Não obstante, o Claude alerta o Aparício para os problemas de impacto nas articulações, bem como para o risco cardiovascular, sobretudo se houver situações de hipetensão, diabetes e ou problemas cardíacos, que, felizmente o Aparício diz não ter. Eu também, até ver, também não.

Também alerta o Dr. Calude que, no geral e para essa relação de idade/peso, ritmos com 10 Km abaixo de uma hora exigem mais do coração mesmo que saudável.

Em resumo, para além das recomendações que poderiam ser de qualquer médico a cobrar 50 ou 100 euros por consulta, não é difícil admitir que o Dr. Claude tem razão.

De resto, o problema nestas coisas, não disse o Claude mas presumo eu, e falo em modo abstracto e para todos, é acharmos, eu, o Aparício e muita malta, que independentemente da idade e peso, somos todos campeões, como se atletas profissionais, com vinte e poucos anos, com 65 ou 70 kg de peso, boas capacidades físicas e treinos xpto. E no geral não somos. Fui, sim, na tropa, há 40 anos, em que pesava 70 kg e fazia 10 km com ritmos na ordem dos 3 minutos e picos. Em qualquer idade, mas sobretudo acima dos 50 ou 60, somos apenas uns coxos iguais a milhões de outros coxos. Mas com o impacto da moda das corridas e sua exposição mediática, desde logo nas redes sociais, tendemos a exagerar no tempo e distância, tantas vezes em níveis desconfortáveis e mesmo perigosos. Mas queremos dar ares de campeões, de supermans, e no final dos treinos ou das provas, glorificar o esforço e o sofrimento como troféus. Pura idiotice! O cemitério está cheio de campeões. O sensato, o correcto, o aconselhável, quer seja pelo Claude, quer seja por um especialista, é perceber os sinais do corpo, ter noção da idade e do peso, deixar o relógio em casa, cagar nas médias e correr ou caminhar de forma confortável, misturando corrida com caminhada e mesmo pausas se necessário, e em percursos com características adequadas e não andar por aí a fazer de cabras montesas a trepar freitas e caramulos.

Em resumo, assim como quem faz tatuagens e coloca piercings e outros artefactos no corpo, mesmo nos mais recônditos buracos, cada um pode fazer o que quiser, mas caldos de galinha e bom senso nunca fizeram mal a ninguém.

Com  igual idade e peso do Aparício, consigo correr 20 km? Sim, até já corri mais. Mas é recomendado? Não! Seguramente nem metade disso, antes. 4, 5 ou 6, por exagero, mas mesmo que 10,  sempre de forma confortável. Porventura, até de maneira mais saudável, apenas caminhadas entre os 40 e 60 minutos.

Posto isto, o Aparíco faça como quiser, mas por mim, tendencialmente, vou abandonar a corrida, ficando-me pelos trilhos semanais e caminhadas e retomar mais a bicicleta, porque pemite-me uma melhor gestão do esforço e, verdade se diga, a descer é a descer e todos os santos ajudam.

O resto, como diz alguém que gosta de poesia, que se foda!

14 de setembro de 2025

Falta de cultura democrática

Sem ser advogado de Deus ou do diabo, porque ambos me dispensam, deixo aqui a minha opinião sobre um certo mau estar de alguns, gerado à volta da celebração da missa vespertina, de ontem, na capela do Viso, no mesmo dia em que também no recinto do monte estava programada a sessão pública de apresentação do Johnny Almeida e da sua lista concorrente às eleições para a nossa Assembleia de Freguesia para o próximo dia 12 de Outubro.

Em primeiro lugar não tenho informações  claras, se houve, ou não, pedido ao pároco nesse sentido e se daí houve alguma concertação. A explicação do pároco já foi dada e ouviu e compreendeu quem ontem participou na missa.

Por outro lado, mesmo que tenha havido essa conciliação, não vejo mal nenhum, como não veria se em causa estivesse qualquer outra lista partidária. É certo que são eventos de cariz político, mas temos que admitir que, independentemente do partido, são do interesse da freguesia, porque visam decisões importantes para o futuro da sua gestão. Não considero, por isso, que um evento político no contexto de eleições democráticas, tenha mais ou menos importância para a nossa freguesia do que um qualquer evento ligado à Festa do Viso, ao Centro Social, ao Trail do Viso, ou de qualquer outro grupo ou associação. Somos todos, ou não, da mesmo comunidade? Somos democratas e compreendemos e praticamos o espírito democrático ou somos apenas fundamentalistas?

Não vejo, assim que tenha havido qualquer mistura de religião com política. Na missa não vi bandeiras nem ouvi slogans ou discursos e no recinto não vi orações nem escutei a liturgia. Ambos tiveram os seus momentos, horários e espaços. A mistura, se a houve, foi na cabeça dos incapazes de perceber as diferenças.

Em todo o caso, e falo apenas por mim, fosse eu o cabeça-de-lista de um qualquer partido, nunca me poria a jeito para essa situação, porque sei do que a casa gasta e do quanto o partidarismo, na nossa e noutras freguesias, é ainda factor de divisão. Nestas coisas pagamos por ter cão e por não ter. A velha fábula "O velho, o rapaz e o burro" continua a fazer sentido. Mas dou de barato de quem assim não pensou, porque, como diz o nosso povo, quem mal não pensa, mal não faz".

Também,  quero dizer que não estou a ver, de todo, que o facto do final da missa ter coincidido com a hora prevista para o início do evento político (e este na realidade até começou mais de meia hora depois do final da missa) tenha influenciado a participação. Quem tinha a intenção de não ir, não foi e muitos foram os que estiveram na missa e seguiram para casa; E quem tinha a intenção de participar, participou e participaria mesmo que a missa fosse na igreja, no Santo Ovídeo, em Vila Seca ou em qualquer outro sítio. E tenho esse entendimento também em relação aos eventos de carácter geral. Quem tem a intenção de ir vai, haja ou não missa no mesmo local.

Para concluir este meu pensamento, que é só é meu, entendo que o que nos falta mesmo, é cultura democrática. E com estas e com outras, vejo que tive razão em recusar o convite de uma e outra lista (a quem agradeço a confiança e consideração) mas porque já adivinhava esta falta de cultura democrática numa luta de carácter partidário. Não de todos, claro, mas ainda de muita gente, sobretudo dos mais velhos, os que já deviam ter aprendido mais. 

Quanto à cultura democrática:

O que é cultura democrática?

A cultura democrática é o conjunto de valores, atitudes e práticas sociais que sustentam a democracia no dia a dia. Não se trata apenas de votar em eleições, mas de viver de acordo com princípios como:

- Respeito à diversidade de opiniões, crenças e modos de vida.

- Igualdade de direitos para todas as pessoas.

- Participação activa nas decisões colectivas.

- Respeito às regras construídas em comum (leis, constituição, acordos sociais).

- Diálogo e tolerância diante de conflitos.

- Responsabilidade colectiva em relação ao bem comum.

Como se pratica?

Praticar a cultura democrática significa agir no dia a dia de acordo com esses valores. Alguns exemplos:

- Participação política: votar, acompanhar debates, fiscalizar representantes, envolver-se em associações, conselhos ou movimentos sociais.

- Diálogo: escutar e argumentar sem recorrer à violência ou intolerância.

- Respeito: aceitar opiniões diferentes sem desqualificar ou excluir pessoas.

- Cooperação: trabalhar em grupo para resolver problemas comunitários.

- Educação crítica: procurar informação de qualidade, combater notícias e considerações falsas e incentivar o pensamento crítico e autónomo.

- Práticas quotidianas: em casa, na escola ou no trabalho, compartilhar decisões, respeitar regras colectivas e promover a justiça.

Em resumo: a cultura democrática é construída quando cada pessoa se compromete com respeito pelas diferenças, diálogo e participação. É também compreender o carácter de importância de um evento politico, independentemente de que força partidária representar, seja no final ou antes de uma missa, antes ou depois de um jogo de futebol.

11 de setembro de 2025

Sondagem / Inquérito às eleições autárquicas em Guisande - 2025 - Primeira análise


O Inquérito aqui lançado ontem, já teve 36 participações apesar de mais de 200 visualizações.Todavia, para um dia, não deixa já de ter alguma relevãncia.Assim, mesmo que ainda com pouca representatividade, permite já traçar algumas conclusões e perfil do eleitor guisandense. Vamos à análise de cada questão e peso das respostas:

1. Peso do partido político /candidatos

63,9% afirmam que o partido não é decisivo e 91,7% votam pela capacidade/personalidade dos candidatos.

Isto indica uma clara tendência de personalização da política local, onde as qualidades individuais superam a lógica partidária. Apesar disso, na nossa freguesia é ainda reconhecido um eleitorado mais velho muito arreigado, mesmo fundamentalista, valorizando o partido em detrimento da qualidade dos candidatos do lado oposto.

2. Idade dos candidatos

Apenas 25% consideram a idade importante.

Mas, quando questionados directamente, 66,7% preferem candidatos mais jovens.

A idade por si só não pesa, mas há uma preferência por renovação geracional, possivelmente ligada a novas ideias ou a maior energia. De resto é uma percepção normal já que mesmo em Guisande os jovens já são detentores de formação superior e mesmo com licenciaturas, por isso com capacidade e saber. Pelo contrário, pelo contexto da evolução da nossa sociedade ao nível da Educação,  os mais velhos, mesmo que com experiência e saberes, têm naturalmente menor formação académica.

3. Experiência política e formação

58,3% valorizam experiência em cargos autárquicos.

Já a formação académica/profissional (33,3%) e a área profissional (25%) são pouco relevantes.

A experiência prática pesa mais do que os diplomas. O eleitorado valoriza o envolvimento e provas dadas em funções locais, não apenas em currículos. 

4. Envolvimento cívico

75% consideram o envolvimento comunitário um factor decisivo.

A proximidade real com a freguesia é vista como fundamental, mais até do que idade, profissão ou formação. Esta situação é compreensível, já que, naturalmente, quem presta serviço de cidadania em grupos ou movimentos na freguesia e paróquia têm uma acção mais visível e por isso geram maior confiança e valorização.

5. Prioridades locais

Arruamentos lideram (38,9%) como principal necessidade de obras.

Seguem-se espaços desportivos e sede da Junta (ambos 16,7%), e zonas religiosas (13,9% cada).

A prioridade clara é infraestrutural e funcional (estradas/acessos), acima de património ou cultura. Pode resultar daqui uma percepção de que as intervenções nos espaços envolventes a equipamentos religiosos devem merecer apoio de outras entidades, como a Câmara Municipal, e não apenas da Junta de Freguesia.

6. Expectativas da futura Junta

Proximidade e envolvimento (41,7%) e obras/melhoramentos (38,9%) quase empatados.

Limpeza (11,1%) e cultura/desporto (8,3%) ficam em segundo plano.

Os eleitores querem uma Junta ativa e próxima, com foco em infraestruturas básicas.

7. Avaliação da União de Freguesias

Apenas 2,8% avaliaram como “bom”.

Metade (50%) acha “mau” e 47,2% “razoável”.

Existe forte insatisfação com a gestão anterior, o que abre espaço para a renovação. Apesar disso, é difícil perceber uma relação da gestão do PS pu do PSD já que ambos governaram a União de Freguesias.

8. Perfil desejado para os candidatos

Proximidade/inovação (38,9% cada) são igualmente valorizados.

Humildade/seriedade (11,1%) e promoção de valores (11,1%) são secundários.

Espera-se alguém dinâmico e próximo, capaz de executar projetos concretos.

9. Perceção sobre os partidos (PSD/PS)

63,9% acham que os partidos só aparecem em época eleitoral.

Reforça a visão de que o partidarismo é secundário e há distância entre estruturas concelhias e a realidade local.

10. Cabeças de lista

PSD: 41,7% consideram boa escolha, mas 38,9% acham que havia melhor opção.

PS: 41,7% acham que havia melhor opção, 25% que foi uma boa escolha.

Tanto no PSD como no PS há divisão e algum descontentamento com as escolhas feitas. É notório que ambas as listas tiveram dificuldades na sua composição, com recusas de várias pessoas. Estas dificuldades resultam também de um alheamento e descrédito da classe política e nem os partidos revelam interesse pelas comunidades para além dos perídos eleitorais. Por outro lado, 12 anos numa União de Freguesias contribuiram para uma erosão dos valores identitários junto dos mais jovens.

11. Confiança nos candidatos principais

61,1% confiam em Johnny Almeida ou Celestino Sacramento.

36,1% preferem esperar para ver.

Existe confiança moderada, mas também cautela: expectativas altas, mas prudentes. 

Por outro lado, pode haver reservas fundadas já que o elitorado também procura estbelecer confiança e uniformidade de qualidade com base em toda a lista, ou principalmente nos três primeiros elementos e não apenas no cabeça-de-lista.

12. União pós-eleições

69,4% acreditam que a freguesia ficará unida depois das eleições.

Predomina o optimismo quanto à coesão social, independentemente do resultado.

13. Intenção de voto

97,2% dizem que vão votar.

Demonstra forte mobilização cívica, o que pode ser decisivo para a legitimidade da nova Junta. Se esta tendência se verificar, significa que pode baixar a abstenção e com isso uma maior participação e também uma maior imprevisibilidade.

Resumo final:

O eleitorado de Guisande vota mais em pessoas do que em partidos.

Prefere candidatos jovens pelo seu dinamismo, de preferência experientes e próximos da comunidade.

As infraestruturas básicas (arruamentos) são a maior prioridade.

Há insatisfação com a gestão anterior, mas também optimismo quanto ao futuro.

Tanto no PSD como no PS enão é claro um concenso sobre a escolha dos cabeças de lista.

A taxa de participação tende a ser muito elevada (97%), mostrando grande interesse na mudança local.


Se ainda não votou VOTE AQUI

9 de setembro de 2025

Ó Santa Maria, Maria de Lamas ( e do Jorge Jesus)


Santa Maria de Lamas. No Domingo assisti à saída da procissão que por lá, tem horas certas de sair e, não sei por que motivos, deambula pelas ruas durante horas. Um exagero. Nem sempre mais é melhor, mas tradições são tradições, não se beliscam porque mexem com bairrismos.

O tapete na estrada já não é só de flores. É mais fácil moldar sal colorido do que dispor, uma a uma,  pétalas, a esvoaçar aos caprichos do vento.

A multidão aconchegava-se nas bermas, e mesmo sem exagerado calor procuram-se as sombras . Nas mãos os telemóveis são mais que muitos, a fotografar  para uma memória que não terá futuro porque raramente se guardam. Come-se sem ter fome.

Ao meu lado um casal típico, terra-a-terra. Ela redondinha, baixa, serena, sorridente obediente ao “chefe”. Ele, com falta de dentes, nariz adunco, de boné a tapar a careca e vestido a rigor para a procissão, com a camisola do clube da terra, e nas costas, sobre um qualquer número, o nome estampado de Jorge Jesus. Fico sem saber se o nome dele, se de algum jogador da terra, se o do treinador, o que foi do Benfica e Sporting e nos últimos anos tem andado por terras de camelos a navegar nos milhões.

Certo é que o homem, como trolha à moda antiga, não se calava, sempre a palrar, a debitar bitaites, com  caralhadas à mistura, ora a meter-se com algum conhecido que passava ou fazia parte da equipa dos andores, a sugerir uma cerveja, ora a replicar com a esposa: - Caralho, mulher, já não te disse que são 26 andores? Já os contei na igreja! Deixa de ser chata! - Foda-se!

Ao meu lado, outros vizinhos pareciam incomodar-se com este falatório e sobretudo com o vernáculo e encolhiam os ombros ou murmuravam entre dentes: - Pouca vergonha! Sinceramente…

Mas a procissão, lentamente lá foi desfiando os andores. Entretanto começa o sino a repicar e o “vizinho” falador lá disse para quem quis ouvir: - Olha, está a sair o andor da Senhora. É a ultima porque o sino começou a tocar!  É a senhora! Santa Maria de Lamas!

Certo é que, dali a instantes, ao passar o andor da Senhora, porventura o menos deslumbrante e florido dos 26, o “vizinho” adepto da bola, tira o boné, descobre a careca, e à sua passagem faz uma genuflexão demorada, sentida.

Todos os santos e santas que antes passaram, incluindo Jesus Nosso Senhor, chefe deles todos, não lhe mereceram qualquer veneração, mas antes um falatório entremeado de caralhadas. Mas a Santa Maria de Lamas, vá lá saber-se por que razões, dispensou toda a atenção e veneração.

Há coisas assim! Ficamos sem saber se é fé ou fezada ou se há  ali uma genuína devoção e se a Santa Maria, de Lamas ou de qualquer outro sítio, acode às preces destas criaturas singulares, intercedendo a Seu Filho, pelas suas misérias, a relevar as suas caralhadas e a dar-lhes sorte no que sejam as suas vidas, que hão-de ser dedicada à paixão do futebol, de beber umas cervejas e a impertigar-se com as mulheres que, talvez por igual devoção à Santa Maria, os vão aturando ou a planear, um dia destes, a mandá-los à merda!.

É mesmo assim: Por vezes o principal interesse numa procissão não é ver os santos a passarem, a beleza dos seus andores, a vaidade e o bairrismo de quem os transporta, comedidamente trajados ou de calções e chinelos como quem vai à praia ao Furadouro, da solenidade rubra do padre debaixo do pálio, ou das entidades civis que o seguem todas empertigadas, em vésperas de eleições, ou mesmo o acerto do passo da banda filarmónica e do sentimento das pesarosas marchas. O interesse pode estar simplesmente ao lado, numa qualquer figura típica ou singular, anónima ou com o nome de Jorge Jesus.

Como cantavam no conjunto típico "Esperança": - 

Ó Santa Maria, terra onde eu nasci, 

Quantas vezes lá fora, eu chorei por ti.

Trabalhando, rezando, por vezes cantando

Eu pensava em ti.

Ó quanto eu te quero, e tanto me lembras,

E quanto me queres e tanto me chamas,

Ó Santa Maria, Maria de Lamas ( e do Jorge Jesus)




20 de junho de 2025

O elevador continua a subir


Olho à minha volta e constato com uma simplicidade, natural mas quase cómica: há mais gente com menos idade do que eu do que o contrário. Não me causa espanto. É a vida a acontecer, como deve ser. Mas há uma sensação curiosa nisso, como se, sem grande alarde, eu tivesse atravessado uma porta que, antes, só imaginava abrir ou vislumbrava de longe, inalcançável, e que agora, como num salto do tempo, já transpús.

Pertenço, assim, com mérito e dom da vida, ao lote dos mais velhos, mesmo que ainda no limiar de um patamar mais alto a que muitos já acederam. Mas sem drama, ou nostalgia excessiva. Apenas uma constatação simples: o elevador da idade continua a subir, e eu vou dentro dele. Os botões dos andares ascendentes vão-se acendendo sozinhos, e de vez em quando espreito o espelho e penso: "Ainda sou o mesmo de há dez, vinte ou trinta anos atrás, só um pouco mais usado, como os velhos livros lidos e relidos."

Ser classificado como velho, idoso ou, mais semanticamente de "senior", tem um peso simbólico, real e curioso: É como receber uma farda invisível que muda a forma como nos olham na rua, nos locais públicos ou até na família. A diferença é que agora, entre muitas vantagens do amadurecimento, posso contar as coisas do meu tempo, de outros tempos, E eu lembro-me, sim. Recordo coisas que, mesmo bem contadas, os mais novos duvidam terem sido realidades.

Lembro-me de quando o telefone tocava e não se sabia quem era. De uma mensagem escrita que demorava dias, semanas a ser recebida e respondida. De quando as fotografias precisavam de tempo para nascer e nem sempre a cores. De quando os caminhos eram as estradas e estas apenas coisas de cidades grandes; a semana de trabalho era mais longa e curto o fim-de-semana. O traballho, de sol a sol, começava cedo e acabava tarde. As crianças íam à escola mas também ao campo e ao mato, a trabalhar, a ajudar a casa, os pais e os irmãos. Lembro-me da escuridão densa e do  silêncio das noites, dos sons da natureza, do respeito e veneração aos mais velhos, e de como os domingos tinham cheiro e sabor — o chocolate quente da manhã, a missa cantada, o terço rezado naquela lenta lengalenga, o cheiro a frango assado ao almoço, a tinta no jornal impresso, a tarde de animação na televisão de um canal e a preto-e-branco.

Já vi e ouvi coisas que o tempo se encarregou de apagar dos manuais, mas que guardo cá dentro com nitidez surpreendente. E isso dá-me uma certa vantagem. Não é uma corrida, claro, mas é reconfortante saber que, enquanto uns ainda estão a descobrir o mundo, eu já vivi várias versões dele.

Nem tudo foi bom, nem tudo foi simples. Mas tudo foi vivido e de forma tão diferente dos dias de hoje. E talvez seja isso que nos distingue: a consciência de que sobrevivemos a todos os anos que vivemos. Carregamos memórias como quem carrega mapas antigos, cadernos rabiscados, dobrados, gastos nas lombadas,  mas ainda úteis, com anotações válidas.

No fundo, ser mais velho é como estar num andar mais alto: a vista é melhor, mais ampla. E, mesmo que o corpo às vezes peça para descer, a cabeça continua a querer ir mais alto — por curiosidade, por teimosia, ou só por gosto de continuar a ver o mundo mudar.

O elevador continua a subir. E eu, com sorte, ainda vou assistir a muitos outros andares, a mudanças, mesmo que já sem surpresas porque há muito adivinhadas.

21 de maio de 2025

O valor da palavra assumida ou a falha dela

Dizia o nosso povo, e uso o pretérito imperfeito do modo indicativo, porque isso era noutros tempos, que não os de agora, que “palavra dada, palavra honrada”. 

Mesmo que mais lenda que facto, os mais velhos terão aprendido na escola primária o quadro da nossa História em que face à incapacidade de cumprir a sua promessa em nome de D. Afonso Henriques, o aio D. Egas Moniz se fez apresentar perante D. Afonso VII, rei de Leão, com a sua família, com a corda ao pescoço, num sinal de oferta das suas vidas como penhor da palavra não honrada.

A palavra dada, e honrada, é um dos pilares mais antigos e fundamentais da convivência humana. Mesmo antes dos contratos escritos, eram as promessas verbais que definiam alianças, acordos, parcerias e até destinos inteiros de pessoas e reinos. Dar a palavra é mais do que falar — é empenhar algo de si mesmo. É colocar a própria honra em jogo. Quando alguém diz "eu prometo", "pode contar comigo", ou "estarei lá", está, de forma simbólica, estendendo a mão e oferecendo confiança.

Assumir um compromisso mesmo que não escrito, porque a palavra é volátil e não deixa vestígio, é reconhecer a responsabilidade que vem com a confiança depositada. É compreender que alguém dependerá da sua presença, da sua acção, da sua fidelidade àquilo que foi dito. E isso vale tanto para compromissos grandes, como um contrato de trabalho, quanto para pequenas coisas do dia-a-dia.

O valor da palavra está justamente na coerência entre o que se diz e o que se faz. Uma palavra honrada constrói reputações sólidas, fortalece vínculos e inspira respeito. É a base da confiança, sem a qual não há relacionamentos duradouros, nem comunidades verdadeiramente unidas. Logo, quem se compromete com a palavra e a honra, mostra o valor do seu carácter. O contrário também.

Por outro lado, quando a palavra é quebrada, quando o compromisso não é honrado, o dano vai além da situação pontual. Rompe-se um elo invisível. A decepção que nasce do não cumprimento de uma promessa fere mais do que o atraso ou o erro prático. Ela fere a confiança. E confiança, uma vez quebrada, é difícil de reconstruir.

A falha da palavra revela descuido, desrespeito, às vezes até desinteresse ou interesses mesquinhos ou objectivos negativos. Não cumprir o que se prometeu é dizer, com acções, que o outro não importa tanto quanto parecia importar no momento da fala. É banalizar o compromisso, transformar o que deveria ser sagrado em algo descartável, mutável, adaptado às conveniências.

Por isso, é sempre melhor prometer menos e cumprir tudo, do que prometer muito e falhar. E quando a falha acontece — pois todos somos humanos — o mínimo que se espera é a humildade de reconhecer, pedir desculpas e buscar reparar.

No fim, a palavra é um reflexo daquilo que somos. Quem cuida do que diz, cuida também das relações que constrói. E num mundo tão cheio de ruídos e desconfiança, ser alguém cuja palavra tem valor é um acto de coragem, de caráter — e, sobretudo, de humanidade.

Em todo este contexto, não raras vezes, são os políticos, com mais ou menos impacto ou responsabilidades, nacionais ou locais, acusados de serem pouco cumpridores de promessas, compromissos, da palavra dada. Por dificuldades próprios ou simplesmente por despeito, estratégia e conveniência pessoal ou de grupo, facilmente se “vira o bico ao prego”, desonra a palavra, reduzindo-a a um valor de lixo, como se nunca tivesse sido proferida.

Sendo certo que ainda há políticos, pessoas e entidades que fazem por honrar a palavra dada, cumprir as promessas ou compromissos, infelizmente, vai sendo corrente o incumprimento, mais ou menos descarado, grosseiro, talvez porque o valor ou significado da honra ande, de há muito, desonrado.

Definitivamente, já não somos feitos da mesma massa dos nossos antepassados. A honra ou a desonra, a palavra ou a falha dela, valem agora tanto como dez réis de mel coado.

17 de fevereiro de 2025

Finalmente?


No seguimento de novela da desagregação de freguesias, o PSD lá veio anunciar a posição de que irá confirmar a sua posição favorável, juntando-se ao PS e à restante esquerda. Da IL já se sabia a sua feroz oposição, e veremos o quanto, por isso, vai ser penalizada no futuro. Quanto ao troca-tintas do Chega, dali não vem nada de coerente e não surpreenderá que depois de uma confusa abstenção, venha a votar contra, quando o Parlamento voltar ao asunto. 

Quanto o papagaio-mor, presidente da nação, terá que baixar o rabinho e aprovar. Depois, seguir-se-á a publicação da Lei e a sua entrada em vigor, seguindo-se os procedimentos nela previstos. O que for há-de ser.

Haverá, pois, mais que tempo antes de Outubro, e com maior ou menor dificuldade, as comissões que vierem a ser formadas, darão conta do recado, sabendo-se, todavia, que será natural que alguns temas da partilha, nomeadamente a distribuição do quadro de pessoal, poderá não ser fácil, por razões óbvias. Desde logo, parece-me que as freguesias mais pequenas não terão necessidade, de todo, de ter pessoal administrativo. Importa, pois, saber como é que a alocação dos existentes vai ser feita.

Em todo o caso, admito que, como num casamento, a união, civil ou católica, é bem mais fácil que o divórcio, sobretudo quando este não se faz de forma construtiva e amistosa. Mas espero e acredito que não venha a ser este o caso e será bom que as quatro freguesias, mesmo que separadas, venham a ter boas relações institucionais e até abertas a parcerias comuns.

Em resumo, tudo se encaminha para que, finalmente (?), depois de algumas traições, falta de de palavra, suspense, avanços e recuos, o raio da desagregação venha mesmo a concretizar-se. 

Por outro lado, concerteza que a seu tempo, cada freguesia desagregada terá que se virar para si própria e avançar com listas de homens e mulheres, interessados e interessadas,em porem-se ao serviço das respectivas populações e recuperarem, o que foi perdido, mas a seu tempo veremos.

Por minha parte, e porque entre gente amiga já vai havendo insinuações, nos meus planos, por agora não entra a hipótese em fazer parte de qualquer lista, muito menos de suporte e natureza partidária. Creio mesmo que até seria positivo que pudesse vir a avançar uma lista única, independente e a reunir gente dos vários quadrantes políticos. Nesse contexto, de unir e não desunir a comunidade, poderia ser capaz de reflectir quanto ao contributo que poderia dar. Infelizmente, sei que isso não vai acontecer porque os partidos querem sempre defender os seus interesses e ao longo dos tempos, nomeadamente nas pequenas freguesias, têm sido sempre um factor de desunião e não o contrário.

Mas, dizia, por agora, para além de ser cedo e ainda haver tempo e lugar a coisas importantes a decidir no processo da desagregação, e sem prejuízo de outras decisões futuras por circunstâncias que possa vir a considerar justificadas, não tenho ideia nem vontade de me meter na luta eleitoral, porque por um  lado porque considero que, mesmo que não abundando, há gente mais nova e bem capaz, havendo vontade e, por outro lado, já dei para esse peditório e, sem falsa modéstia, parece-me que no plano comunitário, associativo e mesmo de participação numa Junta, já dei de forma significativa o meu contributo. Há, pois, lugar e vez para outros. Que avancem!


[imagem: NCO]

10 de janeiro de 2025

Juntas de Freguesia - Indispensáveis mas de missão difícil



- Os Desafios da Gestão Financeira nas Juntas de Freguesia

Estaremos todos de acordo quanto à importância do papel das juntas de freguesia na gestão dos seus territórios e apoio às populações, dentro e no âmbito das suas competências. 

Todavia, no papel de cidadãos, nem sempre valorizamos o seu papel e regra geral, pouco dados a cidadania, apenas as vemos como entidades com obrigações de servir e tudo fazer. 

Concerteza que importa haver um sentido crítico e construtivo, porque é possível fazer bem em vez de mal, optimizar em vez de esbanjar e definir critérios que procurem um equilíbrio entre o que importa, que é fundamental e estruturante e o que é efémero, passageiro, aqui uma tentação permanente dos autarcas, muito focados no retorno e impacto nas redes sociais.

A gestão de uma Junta de Freguesia enfrenta hoje, como de sempre, desafios significativos, principalmente no que diz respeito à administração dos recursos financeiros disponíveis face às múltiplas necessidades da população. 

Aqui procuro fazer uma reflexão sobre as principais dificuldades encontradas e a complexidade de gerir expectativas com recursos limitados, num contexto comum a todas as freguesias, mesmo que todas com dimensões, territórios, populações, recursos e necessidades diferentes.

- A realidade orçamental

O orçamento de uma Junta de Freguesia é tipicamente constituído por transferências do Estado e das Câmaras Municipais, mas com receitas próprias limitadas. Grande parte destes recursos é imediatamente absorvida por despesas fixas, chamadas despesas correntes, tais como:

- Custos com pessoal (salários, seguros, contribuições sociais);

- Despesas correntes (água, electricidade, telecomunicações, software de gestão, material de escritório);

- Manutenção básica de instalações, equipamentos e veículos;

- Compromissos contratuais estabelecidos.


-O equilíbrio entre as necessidades e os recursos:

Após assegurar as despesas fixas, o montante remanescente para investimento e desenvolvimento é frequentemente insuficiente para responder a todas as necessidades da freguesia, que incluem, entre outros:

- Obras de beneficiação e manutenção do espaço público;

- Limpeza e higiene urbana;

- Apoio ao movimento associativo local;

- Programas sociais e culturais;

- Resposta a situações de emergência;

- Melhoramento de infraestruturas.


-  gestão do equilíbrio

Assim, qualquer executivo da Junta, com maiores ou menores recursos, vê-se assim forçado a, entre outros aspectos:

- Estabelecer prioridades rigorosas;

- Adiar intervenções necessárias mas não urgentes;

- Procurar parcerias e apoios externos, nomeadamente em diálogo permanente com a Câmara Municipal;

- Gerir expectativas da população e ter uma acção pró-activa e esclarecedora;

- Optimizar os recursos existentes, humanos e de equipamento;

- Encontrar soluções criativas para problemas complexos.


- O desafio da comunicação com os cidadãos:

Um dos maiores desafios actuais das juntas de freguesia reside no método e na forma de comunicação com os cidadãos, que frequentemente:

- Desconhecem as limitações orçamentais da autarquia;

- Não compreendem a complexidade da gestão pública;

- Exigem respostas imediatas para todos os problemas;

- Têm dificuldade em aceitar a necessidade de estabelecer prioridades;

- Comparam a sua freguesia com outras, sem considerar diferentes realidades orçamentais, dos volumes de receitas própria, das remessas do Estado e por outro lado, das despesas.


- Soluções ou caminhos para uma boa gestão:

Para melhorar esta situação, é fundamental:

- Aumentar a transparência na comunicação com os cidadãos, explicando claramente as limitações orçamentais

- Promover a participação dos cidadãos na definição de prioridades, nomeadamente em acções como orçamento participativo;

- Desenvolver estratégias de captação de recursos adicionais;

- Implementar medidas de eficiência e optimização de recursos;

- Estabelecer parcerias com outras entidades para maximizar resultados, incluindo protocolos com freguesias vizinhas.

Em resumo, a gestão de uma Junta de Freguesia é um exercício permanente de equilíbrio entre necessidades ilimitadas e recursos limitados. O sucesso desta gestão depende não só da competência técnica e administrativa dos seus responsáveis, dos eleitos políticos e dos colaboradores, pertencentes ao quadro de pessoal ou tarefeiros, mas também da compreensão e colaboração de todos os cidadãos.

É uma missão impossível? Quase! De resto, pela sua nataureza de uma entidade marcada por opções e ideologias políticas, haverá sempre lutas e obstáculos à gestão que nem sempre são racionais e numa perspectiva de bem comum mas antes de interesses pessoais e partidários. É pois, de extrema importância, que uma Junta administre com maioria na Assembleia de Freguesia ou com entendimentos multi-partidários mas sérios e consistentes para se conseguir estabilidade. Sem isso, a tarefa já por si difícil será quase impossível sob um ponto de vista de eficácia.

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Américo Almeida


18 de novembro de 2024

Porta com vista para o rio

 


Uma porta, velha, arrombada, já sem alma para guardar. 

Lá dentro, uma cozinha despojada, vilipendiada. Já não há aromas de peixe frito nem vozes a chamar para a ceia.

Mesmo assim, neste escancaramento, nos restos de um estupro da memória de tempos já volvidos, há uma nesga de rio a espreitar. Este, tristonho, vai correndo mas já sem a calma dos dias serenos, antes perturbado pela correria dos barcos e das motos-de-água, de gente que sobre ele se diverte, como coisa de usar e deitar fora.

A tarde é de Outono mas nos canteiros das casas defronte há flores que moram na Primavera e na borda da margem o pato solitário mergulha sem frio porque o ar não é de agasalhos.

Lá no alto, aquele imponente pinheiro sobrevive, qual sentinela. E tanto e quanto nos poderia contar, de outros tempos, azáfamas, de fainas de pescadores num vai-e-vem a arrancar do rio o que comer à noite. Ainda se lembrará do Douro de outros tempos, impetuoso, cheio, ou sereno, estival, de águas minguadas a juntar nas margens frescas as lágrimas de regatos e ribeiras? Talvez sim, porque tem a idade e o tamanho de nele caberem as memórias de um tempo tão próximo e tão distante.

Quanta água já passou aquelas curvas apertadas, quanto à sua conta encheu o mar? Mas não só levou água ou areia o Douro, mas uma enxurrada de memórias, de saudades.

Um lugar, como Pé-de-Moura, na bonita Lomba, conta-nos mais que o que vemos e até uma porta arrombada pode convidar-nos a entrar. Haja alma e cortesia para com o anfitrião, haja olhos para respeitar a intimidade.


1 de julho de 2024

Postal do Dia - Virão dias melhores?


Terminou a Visita Pastoral à comunidade interparoquial que integra as paróquias sob a responsabilidade do Pe. António Jorge de Oliveira, S. Mamede de Guisande, Nossa Senhora da Assunção de Pigeiros e Caldas de S. Jorge.

Por uma casualidade que não havia previsto há pouco mais de meio ano, concretamente em Outubro passado, quando o pároco me pediu para representar a paróquia de Guisande num encontro a nível vicarial de representantes das diversas paróquias, que por sua ver iria eleger a representante vicarial ao Conselho Pastoral Diocesano, acabei agora por ficar envolvido na organização do programa da Visita Pastoral.

Não imaginei que viesse a ter estas responsabilidades, pois apesar de já ter feito em diferentes tempos parte de vários grupos na paróquia, como Grupo de Jovens, Grupo Coral, Grupo de Leitores,Grupo da LIAM, aquando do pedido do Pe. António, não estava agora com qualquer ligação.

Seja como for, não me neguei a prestar essa colaboração ao pároco e à paróquia e a coisa avançou, com algumas freimas, muito envolvimento, mas terminou ontem, e parece-me que com um saldo muito positivo.

Paróquia e freguesia são conceitos diferentes mas que acabam por se interligar em muitos aspectos de vivências e convivências, tanto mais num meio relativamente pequeno como o nosso. Apesar disso, neste contexto da Visita Pastoral pude perceber com mais profundidade que ainda há caminho a percorrer no sentido de uma mais abrangente participação da comunidade. Esta ainda é muito reticente e mesmo renitente no que se refere à participação como um todo. É, pois, muito sectorial e uma grande parte da população, mesmo que convidada abertamente a participar em momentos de partilha comunitária, regra geral prima pela ausência numa atitude de quem considera que estas coisas são para quem vai às missas ou mesmo apenas para os que fazem parte dos grupos e dinâmicas da paróquia.

 Mesmo alguns dos pais de crianças que andam na catequese, nos diferentes anos, encaram isto como "biscates", inconveniências e perda de tempo. Se numa reunião há um atraso, vociferam e reclamam. Podem até esquecer a coisa nos momentos em que são chegadas as festas e festinhas, porque então aparecem, tiram a fotografia e vão a restaurantes celebrar, mas fora disso a atitude não é a mais positiva ou de participação interessada. 

Viu-se este quase desinterese particularmente no acolhimento ao Sr. Bispo, a cuja sessão nem foram todos os convidados, embora alguns com legítimas justificativas. Também na celebração da eucaristia campal, no Monte do Viso, e depois no jantar convívio partilhado, ficou muito aquém a participação da restante comunidade, não só da nossa paróquia como das demais.

Nestes aspectos não somos melhores nem piores do que as demais freguesias e mesmo das demais paróquias que compõem esta comunidade interparoquial. Se quisermos fazer este exercício, até em termos proporcionais ao tamanho das populações, atrevo-me a considerar que Guisande até estará bem na fotografia, mas mesmo assim é pouco.

Em suma, a freguesia ou a paróquia, no aspecto de entre-ajuda e participação já teve melhores dias. A razão não está na paróquia ou em quem a dirige ou em quem com ela colabora, mas tão simplesmente na mentalidade das pessoas e actuais hábitos de ocupação de tempos livres e entretenimento em que regra geral valoriza-se a vulgaridade, as banalidades, ou as coisinhas que permitem encher egos. Ainda o conforto da casa ou da tasca em detrimento de coisas que exijam algum comprometimento, canseiras e disponibilidade.

Os bons velhos valores dos nossos antepassados estão há muito em erosão. Os mais velhos, os que faziam e sabiam como fazer, porque passado que está o seu tempo de vigor, já pouco ou nada podem fazer senão assistir, com pena, a esta triste amostra de freguesia, quando comparada com a de há algumas décadas. No geral não temos sabido respeitar e dar continuidade a esse legado que nos deixaram.

É certo que ainda há muita coisa positiva e alguma gente capaz e interessada (veja-se, por exemplo, o empenho da Comissão da nossa Festa do Viso), e em face disso, como disse, no caso da Visita Pastoral o saldo foi bem positivo, ainda tanto nas coisas da freguesia como da paróquia, mas não tenhamos ilusões ou expectativas altas, porque o futuro não se prevê melhor. 

Só desejo que este meu algum pessimismo, que entendo mais como realismo possa, a curto ou médio prazo, ser desmentido e que afinal as coisas irão melhorar e teremos uma freguesia mais unida e participativa em tudo quanto lhe diga respeito. A ver vamos! 

13 de junho de 2024

Postal do Dia - Os Ministros Extraordinários da Comunhão


Creio que quem vai frequentando os serviços litúrgicos e pastorais da nossa paróquia sabe o que são os Ministros Extraordinários da Comunhão, abreviados por MEC´s. Não serão necessárias grandes explicações.

Na nossa paróquia temos cinco ministros: o António Conceição, o José Almeida, a Fernanda Eva Silva, a Lurdes Lopes e a Cisaltina Coelho, embora esta, por dificuldades de saúde, não tem estado a exercer. Foi também, de forma dedicada, o Alberto Gomes de Almeida, mas já partiu há uns anos (Outubro de 2012).

Muitos, de forma ligeira e pouco dados a ver para além do óbvio, pensarão que é serviço ou função de pouca importância, mas na realidade é mais do que isso. Desde logo porque como qualquer serviço à igreja, implica comprometimento e dedicação e com isso, tantas vezes, incómodos para o dia-a-dia das nossas coisas. Por isso é que são poucos os que se aventuram a assumir serviços na comunidade. Nada se ganha de visível, passa-se por se ganhar, e à perda de tempo soma-se, não raras vezes, fama indesejada sem proveito.

Os nossos Ministros da Comunhão, para além do que é mais visível e notório, o ajudar o pároco a distribuir a sagrada comunhão durante as missas ou a orientar a reza do Terço, têm sobretudo um papel e missão importantes que é a da visita domiciliária aos doentes, pessoas em idade avançada e em situação de fragilidade e de mobilidade e que assim aos Domingos têm a oportunidade de manter essa ligação de fé e comunhão eucarística. E resulta deste acto, também uma função social, afectiva e caritativa já que há sempre tempo e lugar para uma pequena conversa de ânimo e que tão bem faz a quem durante a semana está preso na sua própria casa ou remetido à cama. Só quem passa por elas é que valoriza estas situações.

Por conseguinte, no que diz respeito à apreciação e entendimento que possamos ter em relação às pessoas que noutras ou na nossa comunidade asseguram este serviço, devemos ter em conta a sua importância e dentro do possível saber prestar esse reconhecimento ou pelo menos não o menosprezar.

[foto: voz portucalense]

7 de junho de 2024

Postal do Dia - O azulejo


Creio que nisto todos estaremos de acordo: Quando fazemos algo, de forma despretenciosa, a favor da nossa freguesia e comunidade, sem qualquer proveito que não o do simples prazer e gosto, é sempre bom ter do lado de quem recebe, algum eco dessa dedicação e que funciona assim como reconhecimento e incentivo.

Ora no contexto desta página que exige muita dedicação, mesmo algum custo monetário e muito tempo dispendido, frequentemente recebo esse reconheceimento, sobretudo de malta que está na condição de emigrante, em França e Suiça, e que quando regressam, sempre que me encontram, disso dão conta, de que seguem atentamente as novidades da freguesia por esta página.

Mesmo por aqui, sei que há visitantes frequentes e diários e que sempre que notam uma pausa nas publicações procuram saber pessoalmente o que é que se passa, pois habituados que estão não dispensam as "novidades" ou novos apontamentos sobre as coisas da nossa freguesia, do seu presente e do passado.

Assim foi, e um dia destes parou à porta da casa um desses visitantes frequentes, a dar conta de que já não publicava nada desde o dia 23 de Maio. 

Fiquei, pois, reconhecido por esse interesse e amizade e por ele e por todos os outros que diariamente ajudam a que esta minha/nossa página tenha médias de 500 a 1000 visitas diárias, uma boa parte da comunidade emigrante.

Obrigado a todos quantos valorizam este trabalho e o incentivam desta forma tão próxima, mesmo que nem sempre de forma assim reconhecida de modo tão pessoal e directo. Obrigado ao L.A.

E agora perguntarão pelo nexo da escrita com a fotografia e o título do artigo? 

Pois bem, considerando a quantidade de visitantes desta página, como analogia, cada um será um dos muitos azulejos que desde 1969 revestem a fachada principal da nossa bonita capela do Viso, dedicada à Senhora da Boa Fortuna e Santo António. Apesar de muitos, todos ali organizadinhos, a apanharem com o sol da tarde, há ali um azulejo em falta, e ele pode corresponder a um visitante da página que teve a amabalidade de me contactar pessoalmente para saber se havia algum problema comigo a ponto de nada publicar há quase três semanas. No fundo, muitas vezes basta um no todo para se fazer notar a diferença. É preciso é olhar com olhos de ver e perceber, como em tudo na vida, que o muito é feito de pouco.

23 de maio de 2024

Ad perpetuam rei memoriam


Nesta vontade e gosto de por aqui partilhar coisas do nosso presente e passado comuns, fico sempre numa ambiguidade quanto à resposta em saber a quem tudo isto interessa. Aos da minha idade, alguns, aos mais velhos, poucos, aos mais novos, muitos? Aos mais velhos, que melhor identificarão certas coisas, determinadas memórias, ficará um gosto amargo e de saudade em recordar pessoas e tempos passados; aos mais novos, porventura, uma mera curiosidade a que provavelmente não darão valor, porque, por um lado alheios a coisas, pessoas e factos que não conheceram nem vivenciaram, e por outro lado também sem o bichinho da curiosidade e interesse em saberem e conhecerem o passado dos seus e da sua terra. E assim não sendo, o futuro será de esquecimento do passado.

Diz-se que só podemos gostar ou mesmo amar algo ou alguém se apenas deles tivermos um bom conhecimento. Ora sem a faísca do interesse e curiosidade em saber, pouco adiantará ao conhecimento.

Seja como for, do muito que com teias de aranha aqui partilho, é num sentido não de missão mas simplesmente de procurar registar e deixar indícios para memória futura, como que a dar sentido ao secular termo latino "ad perpetuam rei memoriam".

Neste contexto, sabendo que já tenho falado nisto, e as coisas vão sendo adiadas, mas de facto é minha intenção e propósito que parte destas coisas e outras mais, venham oportunamente a dar lugar a um livro de apontamentos monográficos. Está praticamente feito em termos de estrutura e conteúdo, mas falta concluir a parte de composição gráfica, para poupar algum gasto, e depois a publicação. Não sei quando será, mas vou dizendo que oportunamente, sobretudo se chegar a vontade necessária para concluir o que falta do processo, o que nem sempre é fácil porque muitas outras coisas se sobrepõem.

Posto isto e quanto a isto, é ir andando e esperando. Se não neste ano, porventura no próximo. Além do mais, há sempre novos (velhos) apontamentos a surgirem ou a merecerem actualizações.

Tal trabalho será, nem mais nem menos, uma forma clássica, em livro, de dar novamente sentido à locução "ad perpetuam rei memoriam". Pouco interesse terá no presente, mas talvez no futuro alguém lhe dê a devida importância, quem sabe em algum momento em que haja uma geração mais interessada no passado, raízes e origens dos seus e da sua terra. Quem sabe...

22 de maio de 2024

Postal do dia - Partiu a Rosarinho


Não, não pretendo copiar a rubrica do jornalista Luís Osório, que bem melhor do que eu escreve, mas de quem nem sempre estou de acordo, porque também muito cingido a uma agenda politicamente correcta, mas porque postais do dia se deparam a qualquer um que tenha olhos e cabeça entre as orelhas. Olhar para o lado de pouco serve.

Ontem houve funeral em Guisande, com uma grande participação de que não tenho memória em tão grande número, senão o mais participado, seguramente  um deles, quer por uma boa parte da comunidade local, quer de gente vinda de fora.

E compreende-se o motivo: Dava-se sepultura a uma pessoa filha da terra, filha de boa gente e família, e que Deus permitiu que fosse praticamente a  meio de uma vida que se espera a um ser humano. Mas também sabemos que as contas de Deus, ou do destino para quem menos dado a esta amplitude da fé e crenças espirituais, não se fazem assim de forma académica, matemática, estatística. Todos sabemos que o mais comum é morrerem os mais velhos, mas pelo meio são muitos, e infelizmente cada vez com maior predominância, os que vão em idades jovens, na flor da vida, seja por acidente, porque cada vez mais nos expomos aos perigos, seja por doenças fatais, por  incidência genética mas em muito pelo modo de vida que levamos, pelo que comemos e bebemos, pelos medicamentos que ingerimos por tudo e por nada. 

Se é certo que já não se morre por causas que no passado eram comuns e frequentes, desde logo a falta de vacinas, cuidados médicos e hospitalares , ainda por má nutrição e condições deficientes de  higiene, a verdade é que tem vindo a aumentar a prevalência de mortes em idades consideradas jovens.

Seja como for, são contas e desfechos sempre imponderáveis e até que a ciência médica, já tão desenvolvida, chegue a um ponto de nos imortalizar ou prolongar a vida para além dos limites que consideramos actualmente como expectáveis, seremos sempre confrontados com mortes relativamente prematuras, como agora com a Maria do Rosário Giro, a Rosarinho para os mais chegados. Acontece a cada momento e em cada lugar, mas só damos conta do drama e profunda tristeza quando a fatalidade nos bate à porta, nos chega a casa, aos nossos, aos próximos, à comunidade.

Mas dizia, partiu a Rosarinho e às suas cerimónias fúnebres acorreram familiares, amigos e de um modo geral todos quanto tinham relações familiares, de amizade pessoal,  de mera relação comunitária ou até mesmo profissional ou de outras ligações. Concerteza que a maioria só conhecia a Rosarinho de forma circunstancial  e por conhecimento da sua relação com os demais familiares, desde logo o falecido pai, a mãe, os dois irmãos, o marido e a filha, e por isso ali estavam não tanto, a maior parte, pela homenagem pessoal a quem partiu mas em solidariedade para com quem cá ficou com a dor e a tristeza pela partida de um dos seus de sangue e de relação. É assim em todos os funerais e percebe-se.

De facto a Rosarinho, que naturalmente bem conhecia desde criança, e de um modo geral a freguesia, pelo rumo próprio que deu à sua vida pessoal, familiar e profissional, com certeza que  já não era uma pessoa de muita ligação à nossa paróquia nem foi dela participativa nos diferentes contextos. Todavia, era uma das nossas, e nestas coisas uma comunidade expressa-se sempre de forma sentida e comovida e a tristeza e pesar da família é também partilhada por cada um de nós. E quem passou por elas compreende o quanto é importante um abraço sentido, uma palavra de conforto e incentivo à coragem. 

É nisto que uma comunidade local e pequena como a de Guisande tem de positivo. Terá já sido mais solidária, é certo, mas mesmo com os desligamento dos novos tempos, felizmente, ainda tem muito de seu e por isso na hora de partida de um dos seus, sobretudo quando nestas idades e circunstâncias, une-se e partilha a mesma dor e tristeza. 

Assim, partilhei eu, e muitos dos presentes, um abraço sentido com o Rui Giro, de quem prezo ser amigo desde sempre, desde os 8 anos em que na escola primária partilhava comigo a sua caixa de 12 lápis de cor e depois no percurso e ligação que tivemos na Associação Cultural da Juventude de Guisande, no jornal, na rádio, no teatro, etc. E ainda depois na Associação “O Despertar”. 

Igualmente um abraço de conforto à D. Célia, a mãe, a professora, que não chegou a ser a minha, mas que também pela relação que tinha com o Rui, era naturalmente muito chegado e frequentava a casa com regularidade. Da D. Célia, todos reconhecemos as suas qualidades humana e pessoal e Guisande, freguesia e paróquia, é toda uma comunidade que lhe reconhece valor e prestígio ou não passassem por ela gerações a quem ensinou a ler, a escrever e a fazer contas, certamente que escolares mas também de vida. É doloroso a qualquer mãe ver partir um filho, uma filha, mas certamente que mesmo que com uma imensa dor e tristeza saberá ainda dar esta úlitma lição, a da coragem que sempre se reconhece a uma mãe.

Também um abraço ao Alexandre, sempre bem disposto e positivo, apaixonado pelas pombas e que numa certa analogia vê agora uma pomba próxima partir para mais não regressar ao pombal da casa, à família. Ambos, mãe e irmãos, com certeza que terão a Rosarinho bem viva nos seus corações e nas suas memórias.

Do marido Paulo e da filha Leonor, naturalmente que só conhecidos de vista, mas neste momento de perda e dor, certamente que a esposa e mãe permanecerá viva e contarão com a família para de algum modo mitigar a perda e a dor. O tempo tudo cura, mas leva tempo, mas será sempre um desafio encontrar na tristeza e vazio algo que ajude a superar. É aqui que entra a fé e a esperança. Creio que ambos, a família, serão capazes de encontrar esse lenitivo.

Na missa de corpo-presente, celebrada pelo Pe. Benjamim e acompanhado pelo nosso pároco Pe. António, as palavras e a homilia do Pe. Benjamim foram sempre motivo de reflexão e emoção, porque com o seu peculiar estilo, fala de coração e recorrendo a testemunhos de muita gente que em circunstâncias parecidas, também viu partir e que acompanhou nos últimos tempos de vida. Emociona, faz soltar as lágrimas de comoção mas conforta e reconforta.

Bem sabemos que mesmo nestes casos, há sempre uma tendência do elogio fúnebre, fácil, por vezes aqui e ali com uma pontinha de exagero ou sobrevalorização das virtudes de quem se sepulta, mas é perfeitamente compreensível e de algum modo positivo se for num sentido de chamar aos presentes a importância que devemos dar às nossas vidas e da relatividade das mesmas, por isso a ter em conta o desfecho que a todos está por natureza destinado e como tal importará valorizar cada vez mais as coisas boas, as pessoas, as nossas relações humanas com vista à preparação do destino que a todos espera. 

Com mais ou menos fé no que será o nosso destino depois da morte, é sempre bom e enriquecedor que enquanto por cá andarmos o façamos como se cada dia fosse o último e que no fim de contas, a nossa imortalidade permanecerá para quem quem cá fica, apenas pela memória e mérito do bem que formos capazes de fazer, quer a cada um de nós quer ao próximo ou à comunidade. 

Dos fracos não reza a história e quem por cá passa de forma fútil e negativa, poderá ser lembrado por algum tempo, por poucos,  mesmo que com despeito, mas dificilmente será lembrado e evocado para sempre e por todos. Facilmente cairá no esquecimento e permanecerá por todo o sempre sob a poeira do tempo.

Está em paz a Rosarinho e permanecerá viva entre a comunidade e seguramente entre os seus.

20 de maio de 2024

Moinhos de Jancido - Sonho e realidade


Porque já visitei e caminhei pelo local, e apreciei o resultado e a beleza do local, de vez em quando lá vou acompanhando o trabalho voluntário, altruísta e dedicado dos amigos dos moinhos de Jancido - Foz do Sousa – Gondomar. Recuperação dos moinhos, limpeza dos trilhos e matas envolventes, controlo de espécies florestais e fluviais invasivas, colocação de ninhos, plantação de espécies autóctones, como o castanheiro, carvalho, medronheiro,  etc, etc. 

É notável em todos os sentidos o esforço e amor à causa daquele grupo de pessoas, e que tem rendido frutos no que se refere a projecção turística do local e reconhecimento,  e como comparação penso em inúmeros sítios em que seria possível recuperar e entregar à fruição, até mesmo em Guisande. Apesar disso, creio que não passa de um sonho. 

Aqui há uns anos, quando funcionava em pleno a Associação Cultural da Juventude de Guisande, ainda realizamos umas acções de limpeza na ribeira da Mota, perante a incúria e desleixo de pessoas e autoridades, e havia uma vontade de fazer mais coisas, incluindo o manter limpo e transitável um trilho à face da ribeira da Mota.

Infelizmente os apoios oficiais eram inexistentes e num período de transição de gerações na Associação, a coisa não passou dali. Depois de mais uma geração e sem renovação, os afazeres e compromissos sociais, profissionais e familares e  hoje em dia e desde há muito tempo a colectividade está mesmo parada.

Dizia atrás que o replicar por aqui do que tem sido feito em Jancido, é mesmo uma utopia porque não sinto na juventude actual nem tempo nem vontade para estas coisas e mesmo nos mais velhos, como acontece em Jancido, sinto um desligamento, uma erosão do sentido de orgulho comunitário e identitário e já pouco ou nada se faz de forma colectiva e isso percebe-se mesmo na dificuldade de organização de eventos como uma Festa do Viso ou de cariz religioso, etc..

Noutros tempos, havia esse sentido comunitário e de entreajuda, mas isso é passado. 

Apesar disso, quando vejo certos entusiasmos à volta de outras coisas, mesmo que numa perspectiva de lazer, é fácil perceber que se tal entusiasmo e dedicação fosse voltado para outras causas mais comunitárias e não tanto individualistas ou de grupos, ainda seria possível fazer coisas interessantes. 

Mas, francamente, talvez pelo pessimismo próprio da idade e de quem já viu melhores tempos no que à comunidade diz respeito, face ao panorama actual, parece-me mesmo uma dificuldade intransponível. De resto, com a reforma administrativa e a extinção da Junta  e freguesia, foi a machadada final. Por mais vontade que uma qualquer Junta de União de Freguesias demonstre, nunca será a mesma coisa até porque é inevitável a perda de proximidade. A reversão poderá ainda vir a tempo de recuperar alguma coisa do que perdido tem sido, mas sinceramente não estou nada optimista e nem sei se o actual Governo irá dar andamento aos processos encalhados em S. Bento. Mas ver para crer.

Para já fica o bom exemplo da boa malta de Jancido.





5 de maio de 2024

Todos os dias da mãe


Não dou especial interesse ao que dizem ser o Dia da Mãe, que se celebra hoje. Pela minha própria natureza, pelos motivos de não ter sido educado a dar relevo a estas datas, assim como aos aniversários, mas também, desde logo, porque  nos tempos que correm é motivo o "dia de qualquer coisa" para uma vestimenta muito comercial. Não que seja negativo, porque é apenas a oportunidade de negócio, e onde há procura há oferta, mas também é verdade que com isso há uma tendência para que estas coisas sejam apenas rotinas, lugares comuns. Ainda hoje, antes das 10 horas, liguei para quatro restaurantes que frequento com regularidade e todos eles já estavam sem vagas e alguns a desculparem-se que se tivessem mais salas também as encheriam face à procura. E tão somente porque, disseram, é Dia da Mãe.

Por este e por outros motivos, dou pouca ou mesmo nenhuma importância ao Dia da Mãe, ao Dia do Pai e outros parecidos nas intenções. De resto à mãe e ao pai, impõem-se que sejam todos os dias e faz-me cócegas ver alguns gestos, mesmo que carinhosos, de filhos para com os pais, sobretudo com as mães, apenas neste dia e porventura os demais dias, sem proximidade, sem interesse. Mas somos assim, dados a estes impulsos e que a fama efêmera das redes sociais ajudam a espalhar e a mostrar aos outros, nem sempre o que somos, mas o que queremos que pensem que somos.

Felizmente ainda tenho mãe, mesmo que numa fase de debilidade crescente e por isso a necessitar de cuidados redobrados a que a irmandade, dentro das suas limitações, vai procurando atender. E desse modo, face a essa necessidade, são esses dias todos os dias da mãe, de lhe levar as refeições, de lhe fazer tomar os medicamentos, de cuidar da sua higiene, de a confortar mesmo sabendo que tudo o que por ela possa ser feito é uma ínfima parte do que merece e do que deu enquanto mãe. Quem com uma infância que não teve, dura e amargurada, com uma adolescência substituída pelo papel de mulher adulta, quem desde os 18 anos, na flor da vida, gerou, amamentou e criou oito filhos e depois ainda ajudando netos, só pode merecer que todos os dias sejam dela, da mãe. 

O resto é lirismo, muito para a fotografia, muito para o boneco, com frases e dedicatórias de circunstância que tantas vezes não têm correspondência no dia-a-dia.

Sem moralismos, sem lições, sem julgamentos, porque cada um é cada um, e há sempre verdadeiro amor pelas mães, mas mais do que mostrar importa fazer e se possível de forma discreta, sentida, interior. 

Visitei-a já hoje, a minha, mas estava a dormir e não a incomodei, porque nestas idades e neste estado de saúde, talvez haja alguma serenidade  quando se dorme,porque se acordados e de consciência mais ou menos alerta, há todo um mar de sofrimento e de angústia que se revela perante a incapacidade de sermos nós próprios, na plenitude das faculdades. Mas a vida é assim, nua e crua, no lado melhor e pior, caminho a percorrer até que se transponha a linha do destino e esse só a Deus é dado conhecer e traçar.

18 de abril de 2024

Aniversários e parabéns


Sempre que os recebo, mesmo virtualmente, respondo com simpatia e consideração, mesmo sabendo que na maior parte das vezes os votos de parabéns pelo aniversário, são feitos de forma automática ou circunstancial. E quantas vezes por pessoas que logo a seguir se cruzam connosco na rua e nem um sorriso nem um ólá. É o que é! Apesar disso, por respeito, estima e consideração, quando se propicia ou me lembro, também distribuo alguns parabéns.

Em todo o caso, cresci a dar pouca ou nenhuma importância aos aniversários, dos outros e do meu, talvez porque lá por casa, desde que me tenho como gente, também era assim. Regra geral os aniversários de toda aquela gente, avôs, pais e irmãos, passavam despercebidos e não havia lugar nem a bolo nem a velas a apagar. Nem me recordo de, por isso, o jantar ser melhorado. E se no meu caso há uma espécie de lembrete, é apenas pela particularidade de celebrar em dia feriado. Calhasse à semana, em dia de trabalho, e nem daria por isso.

Serve isto para dizer que na família alguém, alguém com a importância de uma mãe, celebra hoje, 18 de Abril, 82 anos. Mas, para meu profundo pesar, os tempos não são de celebração nem de especial tratamento, porque o peso da idade e as mazelas de uma vida dorida já não deixam lugar a coisas triviais, sem sentido. É apenas mais um dia e se é assim para todos, mesmo para os mais novos, é necessariamente para os mais idosos, doentes e debilitados, em que cada dia a somar, e com eles os anos, raramente acrescentam conforto, saúde e bem estar. Pelo contrário, pela lei natural das coisas, cada dia é de dores e só se pode esperar o agravamento e com isso mais sofrimento e menos vontade de  viver e muito menos em celebrar aniversários.

Com tudo isso, mais que celebrar ou recordar aniversários, mesmo que dos nossos, importa é fazer alguma coisa pelas pessoas, estar presente, quando mais necessitam, e isso vale mais que as costumeiras tretas de circunstância, cantigas da praxe, bolos e espumante.

14 de abril de 2024

Alicerces

Numa altura em que voltam a estar na espuma dos dias os conceitos de "família tradicional", em contraponto com o que possam ser outros tipos de família, tenho que concordar com o que por estes dias li algures na blogosfera, em que resumidamente se dizia que "...a morte dos avós é o divórcio da família, no sentido em que sendo, em muitos casos, o elo de ligação e de respeito patriacal ou matriacal, actuam como referência e alicerce a evitar a erosão de cada uma das famílias, por vezes tão diferentes.

Mas sejamos realistas, sendo que sempre continuará a haver famílias tradicionais (pai, mãe, filhos, avôs, netos e netas, e por aí fora), no geral o conceito de família está já há muito em processo de erosão, não porque os seus valores fundamentais, biológicos e cristãoas, tenham mudado, mas porque importa aos obreiros do politicamente correcto cimentar as novas narrativas e modelos onde se encaixem tudo e todo o resto, como as mono-parentais, homossexuais, etc, etc e o mais que possa vir na fila e que emprestem algum sentido a eufemismos.

Mas, meus caros, a sociedade, para o bem ou para o mal, vai por aí. Nem tudo é mau, nem tudo é bom, antes pelo contrário.

25 de março de 2024

Viver não custa, custa é saber viver

Não tenho inveja de quem vive bem à custa do seu talento, da capacidade de trabalho e seu suor. Já o contrário, dos outros é que não. E não faltam destes a viver à fartazana, rodeados, eles e os seus, de tudo, do bom e melhor. Ele é boas casas, de boas vistas, com amplas garagens, potentes carros, motas, bicicletas, relógios de ouro, piscinas, churrasqueiras, ginásios, etc, etc. Sempre bem vestidos e calçados, perfumados, unhas e cabelos nos trinques, férias a toda a hora, mesmo passando fronteiras, etc, etc. Alguns até se permitem a viver à grande e à francesa em suites de hotéis de luxo, não de férias, uma vez por outra, mas como residência. Outros até têm motoristas que acumulam a leal função de entregas de envelopes atestados de notas vindas dos cofres generosos de mãezinahs ricas e amigos empresários de sucesso. Vidinhas fartas, é o que é.

Ensinado pela vida de que só com o trabalho se pode aspirar a uma vida condigna, mesmo que sem luxos, e certo de que lotarias, totolotos e euromilhões são sortes tão prováveis acontecer como a uma hora certa cair um meteorito pelo buraco da nossa chaminé, sempre desconfio de quem vende cabritos sem ter cabras, mesmo que não um rebanho, pelo menos as suficientes para alimentarem um pastor e família.

Mas isto sou eu, com a mania de que na vida as coisas devem ser justificadas e merecidas e devem obedecer ás leis da física, da matemática e da biologia, ou, mais prosaicamente com o parecer a encaixar no ser. Mas, estou certo, ando de passo desacertado, porque isso é esperar ciência complexa quando a alguns basta fazer as contas básicas de contar pelos dedos para perceberem que juntar o que ao próximo se subtrai é somar para si. Afinal, o que vai dando é o viver à custa dos outros, com estratagemas, chico-espertices, burlar tanto o vizinho como o Estado, desenvolver uma teia de negócios escuros e obscuros e com trabalhos invisíveis ou nocturnos sem que sejam padeiros ou agraciados com milagres divinos.

Eles andam por aí, tantas vezes disfarçados de empreendedores, de empresários, de políticos, etc. Em suma, gente esperta e qualificada para viver sem nada fazer. É uma classe em crescimento, reconheça-se. 

19 de março de 2024

O meu pai não foi o melhor do mundo



Ao contrário do que toda a gente parece dizer por aí, neste dia que é do pai, eu não tive o melhor pai do mundo. Também não o serei. Somos uns exagerados, e como animais sociais vamos uns atrás dos outros, tantas vezes a repetir os mesmos clichês, os mesmos lugares comuns e o convencional ou politicamente correcto. Pastamos da mesma erva.

Mas não, eu não tive o melhor pai do mundo e pela simples razão de que não conheço os outros pais do mundo, a ponto de comparar o meu a cada um deles. De resto, poderia ser uma tremenda injustiça para com pais que foram realmente exemplos extremos de amor que em tantos casos ao longo da História deram literalmente a vida pelos filhos e levaram uma vida de penas e dores para lhes dar pelo menos o direito ao pão.

Agora o que eu tive, foi um pai, e basta-me isso. Nem melhor nem pior que os demais. Diferente como devem ser todos os pais. Porventura até teve mais defeitos que virtudes e não terá sido o melhor exemplo do pai modelo e várias vezes se terá demitido dos seus deveres de pai e marido. Mas sei também que não sei quais os motivos que o limitaram na sua paternidade, as lutas íntimas que travou, os obstáculos que lhe surgiram, as injustiças que lhe fizeram, nem quais os pecados que cometeu, se os confessou e se Deus o perdoou. 

Tenho do meu pai a imagem nítida de uma boa pessoa, honesta, inteligente e simples, até a ponto de ser enganado, roubado mesmo por outros mais "espertos", e basta-me que tenha sido apenas isso para ter a certeza que foi um bom pai e não o trocava por outro.

Um bom pai não é o que dá ao filho uma moto quando faz 18 anos, um carro novo, um relógio de marca, um computador da Apple, umas férias à grande e à francesa, casamento pago em quinta de luxo, lua-de-mel oferecida num qualquer paraíso terreno, chave na mão de um bom apartamento ou de uma moradia luminosa. Essse tipo de pai existe mas não vale nada, porque limita-se a dar o que pode dar, mesmo que a negar ao filho o valor da responsabilidade e a omitir a mensagem de que as coisas boas da vida devem ser conseguidas com mérito e suor próprios.

Se o meu pai nada me deu de material, porque não o podia fazer, e por isso tive eu que ganhar para comprar a minha primeira bicicleta, a minha motorizada, o meu carro velho, pagar o casamento, comprar terreno e nele construir casa, todavia, deu-me e transmitiu-me outros valores que tenho-os em maior conta que tudo o resto. Esses valores são imensuráveis e difíceis de descrever porque tantas vezes surgiram do nada, de pequenas centelhas que só mais tarde, já adulto, maduro e também na condição de pai, consegui decifrar.

Tive pois, um pai, simples como tantos outros, com defeitos e virtudes postas nos pratos da balança, ora a pender para um lado, ora para outro, porque o equilíbrio na vida é sempre uma labuta diária, constante. Basta-me isso!

Já partiu o meu pai, é certo, mas tenho-o presente quase diariamente nas minhas orações. Fico contente que toda a gente tenha o melhor pai do mundo. Eu também poderia alinhar e cantar em coro e afinado a mesma cantiga, mas, sem inveja de quem tem o melhor pai do mundo, fico-me pela simplicidade do meu.