Dizia o nosso povo, e uso o pretérito imperfeito do modo indicativo, porque isso era noutros tempos, que não os de agora, que “palavra dada, palavra honrada”.
Mesmo que mais lenda que facto, os mais velhos terão aprendido na escola primária o quadro da nossa História em que face à incapacidade de cumprir a sua promessa em nome de D. Afonso Henriques, o aio D. Egas Moniz se fez apresentar perante D. Afonso VII, rei de Leão, com a sua família, com a corda ao pescoço, num sinal de oferta das suas vidas como penhor da palavra não honrada.
A palavra dada, e honrada, é um dos pilares mais antigos e fundamentais da convivência humana. Mesmo antes dos contratos escritos, eram as promessas verbais que definiam alianças, acordos, parcerias e até destinos inteiros de pessoas e reinos. Dar a palavra é mais do que falar — é empenhar algo de si mesmo. É colocar a própria honra em jogo. Quando alguém diz "eu prometo", "pode contar comigo", ou "estarei lá", está, de forma simbólica, estendendo a mão e oferecendo confiança.
Assumir um compromisso mesmo que não escrito, porque a palavra é volátil e não deixa vestígio, é reconhecer a responsabilidade que vem com a confiança depositada. É compreender que alguém dependerá da sua presença, da sua acção, da sua fidelidade àquilo que foi dito. E isso vale tanto para compromissos grandes, como um contrato de trabalho, quanto para pequenas coisas do dia-a-dia.
O valor da palavra está justamente na coerência entre o que se diz e o que se faz. Uma palavra honrada constrói reputações sólidas, fortalece vínculos e inspira respeito. É a base da confiança, sem a qual não há relacionamentos duradouros, nem comunidades verdadeiramente unidas. Logo, quem se compromete com a palavra e a honra, mostra o valor do seu carácter. O contrário também.
Por outro lado, quando a palavra é quebrada, quando o compromisso não é honrado, o dano vai além da situação pontual. Rompe-se um elo invisível. A decepção que nasce do não cumprimento de uma promessa fere mais do que o atraso ou o erro prático. Ela fere a confiança. E confiança, uma vez quebrada, é difícil de reconstruir.
A falha da palavra revela descuido, desrespeito, às vezes até desinteresse ou interesses mesquinhos ou objectivos negativos. Não cumprir o que se prometeu é dizer, com acções, que o outro não importa tanto quanto parecia importar no momento da fala. É banalizar o compromisso, transformar o que deveria ser sagrado em algo descartável, mutável, adaptado às conveniências.
Por isso, é sempre melhor prometer menos e cumprir tudo, do que prometer muito e falhar. E quando a falha acontece — pois todos somos humanos — o mínimo que se espera é a humildade de reconhecer, pedir desculpas e buscar reparar.
No fim, a palavra é um reflexo daquilo que somos. Quem cuida do que diz, cuida também das relações que constrói. E num mundo tão cheio de ruídos e desconfiança, ser alguém cuja palavra tem valor é um acto de coragem, de caráter — e, sobretudo, de humanidade.
Em todo este contexto, não raras vezes, são os políticos, com mais ou menos impacto ou responsabilidades, nacionais ou locais, acusados de serem pouco cumpridores de promessas, compromissos, da palavra dada. Por dificuldades próprios ou simplesmente por despeito, estratégia e conveniência pessoal ou de grupo, facilmente se “vira o bico ao prego”, desonra a palavra, reduzindo-a a um valor de lixo, como se nunca tivesse sido proferida.
Sendo certo que ainda há políticos, pessoas e entidades que fazem por honrar a palavra dada, cumprir as promessas ou compromissos, infelizmente, vai sendo corrente o incumprimento, mais ou menos descarado, grosseiro, talvez porque o valor ou significado da honra ande, de há muito, desonrado.
Definitivamente, já não somos feitos da mesma massa dos nossos antepassados. A honra ou a desonra, a palavra ou a falha dela, valem agora tanto como dez réis de mel coado.