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13 de fevereiro de 2023

Viagem

Chegado aqui,

numa escalada suada,

eis-me no ponto cimeiro

do promontório agreste.

Em frente,

Diante dos meus olhos, 

Oferece-se um mar imenso,

Regaço pronto a acolher

a última nau ou caravela.

Embarcarei na viagem final

como marinheiro destemido

à descoberta do continente celeste, 

de uma nova terra 

que sustente a imortalidade.


7 de fevereiro de 2023

Sorriso

Se soubesses, amor,

Quão me domina o teu sorriso,

Tinhas todo o poder sobre mim,

No arbítrio do bem ou mal.

Todo eu seria dor

Se me privasses do pleno juizo,

Mais valendo, que sofrer, o fim,

Como ferido um animal.


Mas creio que se por bem, apenas,

Sorrindo esses teus lábios doces,

Tão bom seria ter-te plena em mim.

Sorri, sorri sem dores ou penas,

Sorri, linda,  ainda como se fosses

A vida contida entre princípio e fim.

6 de fevereiro de 2023

Partícula



Ascendi à serra, sereno e só,

buscando um encontro de intimidade,

naquela aspereza criadora

granítica, despojada,

para me sentir envolto

numa nudez primitiva

onde a cama é de erva

e o cobertor de estrelas e luar.

A serra, ampla, sincera, tem este dom:

o de nos submeter

à insignificância que somos,

mas como um grão de areia

que faz sentido e dá forma

ao areal na imensa praia.

O universo majestoso é, afinal, 

uma massa densa de partículas, 

ínfimas mas plenas, 

onde cada ser

tem lugar, espaço e sentido.

22 de dezembro de 2022

Sentidos

Não sei o que em mim falha

Que os sentidos se trocam

Numa percepção baralhada.

Vejo-te com os olhos cerrados,

Saboreio o picante do teu olhar,

Escuto o calor do teu corpo,

E acaricio o som da tua voz.

Apesar disso, sinto-te toda,

Plenamente desvendada,

Porque os meus sentidos,

Todos num e cada um em todos

Para ti convergem

E em ti e de ti  se inundam.

21 de dezembro de 2022

Vaidades

Deixem de lado essas vossas vãs vaidades,

Por feitos que pouco a tão poucos vale;

Sejam tão simplesmente alma e emoção.

Esvaziem essas ocas frivolidades

Próprias de quem quer todos e tudo igual

Num ego inflamado, cheio como balão.

20 de dezembro de 2022

Vazio



Não! Talvez já não valha a pena

Esperar do homem epifanias

Que o levem a mais humanidade;

Foi-se a esperança na última cena,

Sala e cadeiras ficaram vazias;

E nada sobrou dessa veleidade.


O poeta assim não sente remorsos

Porque o homem já não o inspira,

Sombrio jardim onde nada medra;

Lamenta-se, vencido de esforços

Por ver na alma, cheia de mentira,

Menos poesia do que numa pedra.

18 de dezembro de 2022

Natal

Abaixem-se, submissos, os montes,

Aplanem-se os  vales viçosos,

As aves cantem hinos de louvor,

E amansem o trovão e o vendaval.

Fiquem límpidos os horizontes,

Alegrem-se os regatos chorosos,

Porque é nascido Jesus Senhor

No mistério de renovado Natal. 

12 de dezembro de 2022

Era bom que chovesse

Era tão bom que hoje chovesse,

Esta míngua de tudo inundasse

Até que o céu de novo rompesse

E lá de cima o sol espreitasse.

17 de novembro de 2022

Rio Uima







Velho e sempre novo rio Uíma

De lágrimas frescas do monte,

Num misto de alegria e mágoa,

Correndo sereno, todo encanto.

Das fraldas do Mó, logo acima,

Brota num bolhão dito de fonte

E nem sabemos se feito de água

Ou, tão somente, rio de pranto.


Rio Uíma, antigo e velho Uma

Vais sem pressa, sem fulgores,

A saciar amieiros e carvalhos

A tecer com fio de prata e ouro.

De Duas Igrejas até Crestuma,

Seja lá mais por onde fores,

Segues o caminho, sem atalhos,

Ao encontro materno do Douro.

14 de novembro de 2022

Dilema



Pensou com seus dourados botões

A bela fidalga Dona Ana Maria:

-Quero casar, ter filhos varões

Que perpetuem minha fidalguia.


- Neste dilema profundo fico

Entre D. Gil, glamoroso nobre,

Feiote mas poderoso de rico

Ou então Antão, bonito e pobre


Quem deles escolher p´ra casar

Com tão ilustre e fina donzela,

Se ao amor ou estatuto atentar?

Decisão ingrata de tal chancela.


- Sobra tempo e não tenho pressa!

Adiou a setença.- Fica pra depois!

Um dia, decidida, à coisa regressa

Resolvendo assim: - Fico c´os dois!

13 de novembro de 2022

O tempo e o vento

 


O vento é vento, Contratempo da brisa Alterada; O tempo é tempo, Sentimento que pisa A passada.
O tempo é o vento A soprar Enfurecido, em ronco Ou em murmúrio apenas; Ora a derrubar o tronco, Ora a afagar penas.
O tempo e o vento São a alma a esvair Num despreendimento Total da vida, Como um abraço lento, Na calma a resumir O descontentamento Da despedida.

Ilusão



De quem é o olhar que te espreita,

A boca que te sorri e beija,

As mãos que o cabelo te ajeita?


E quem o teu corpo macio deseja?


Serei eu? Mereço-te?

Quero manter a ilusão,

De que me queres a mim.

Mas se não, peço-te,

Não me digas que não,

Mesmo que não digas que sim.

11 de novembro de 2022

S. Martinho

Bom dia, este de tradição

Em celebrar o S. Martinho;

Logo com sol do seu Verão,

Fogueira, castanhas e vinho.

3 de novembro de 2022

A chuva e a ribeirinha

Esta chuva miudinha,

Parecendo que não molha,

Vai caindo boa, fecunda;

Bebe dela a ribeirinha

Sedenta na sua recolha

Quando o vale se inunda.


Corre, corre, ribeirinha,

Vai assim toda ligeira

Como prata feita num fio;

A chuva cai, vais cheiinha,

Numa correria de canseira

Ao encontro de maior rio.

2 de novembro de 2022

Movimento perpétuo

São já frescas as manhãs 

em Novembro,

Depois, deixado p´ra trás,

Virá Dezembro,

Com o Natal, mais adiante,

Apetecido;

O tempo corre em instante

Ressurgido;

A roda roda em todo o tempo

Sem se deter,

Num só perpétuo movimento,

A renascer.

O tempo tem tempo demais,

Não se cansa;

Com começo e fim iguais

Quem o alcança?

1 de novembro de 2022

Sessenta



Eis-me aqui, sereno, nos sessenta,

Se é que nisso haja importância;

Não mais que onda que arrebenta

Na dura costa da irrelevância.


Deixe-se, pois, que o mar do tempo

Se debata até que a falésia caia;

Virá depois, manso, em contratempo,

A espumar-se, sereno, na praia.

30 de outubro de 2022

Serra da Freita
















Há em toda a serra da Freita,

Um não sei quê de encantamento

Que nos extasia de cor, de luz;

Uma beleza singela, perfeita,

Um horizonte a planar no vento

Um seio farto que dá-se e seduz.

24 de outubro de 2022

O oleiro do tempo

Deixem-me, amigos, que vos diga,

O tempo, esse nunca volta p´ra trás,

Um ano, um mês, sequer um dia.

Os anos têm um peso que fustiga,

Que da frescura viçosa dum rapaz

Transforma-a em doce melancolia.


O tempo é assim, um laborioso oleiro

A moldar o barro de que somos feitos,

Inacabados desde o momento primeiro

Como vasos a girar na roda, imperfeitos.

21 de outubro de 2022

Quadro cinzento



No céu da velha Europa

Há névoas a amortalhar a plenitude

Da liberdade conquistada,

De cada homem, mulher, criança,

Como se toda fora vã a esperança,

A de viver, somente viver.

Já não há neste jardim a quietude

De uma rosa fresca cheirada,

De uma carícia desejada,

De um sol morno pela manhã,

De um retempero fraternal.

Há uma ânsia desmedida

A de ceifar a vida, a esborratar

A frescura de um desenho infantil,

Devastando as coloridas flores mil

Pintando um triste e vil excremento

Num quadro só de cinzento.

20 de outubro de 2022

Sem pressa



Que adianta ao homem ter pressa

Numa constante busca do incerto,

Quando, afinal, o que lhe interessa

É de si próprio estar bem perto?


A ânsia, perturbada, desmedida,

É uma névoa espessa de fatalidade,

Que num ápice nos absorve a vida

A devolver-lhe toda a efemeridade.


Um após outro, seja firme cada passo

Num caminhar sentido, de peregrino;

Não haja esmorecimento ou cansaço,

Mas tão somente o esperado destino.