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9 de junho de 2023

10 de Junho, dia de qualquer coisa

Poderia escrever sobre o 10 de Junho, pomposamente designado de Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. 

Seja lá o que isso queira significar, vale pelo feriado, mesmo que neste ano calhe ao Sábado. Mas a propósito, e porque já não há paciência para certas "merdas", para discursos da praxe, paradazinhas militares, medalhas ao peito e colares ao pescoço e o alargamento do clube de comendadores e cavaleiros da ordem da espada e da torre de não sei das quantas, partilho um artigo de opinião de João Gonçalves, no Jornal de Notícias. Subscrevo e não diria nem escreveria melhor. Todavia, para além de mal frequentado, o lugar anda desgovernado. O dia, devia ser, pois, de pesar.

"No próximo sábado, será Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Não sei se é assim que ainda se designa. Por causa do Ultramar, foi durante décadas o Dia da Raça ao qual o regime do Estado Novo associava o nome de Camões.

Jorge de Sena, no primeiro "10 de Junho" institucional, pós-PREC, devolveu Camões às suas origens, desfiliando-o de toda e qualquer circunstância patrioteira. Começada, aliás, não pelo Estado Novo, mas pela "manobra republicana a que a monarquia se associou a contra-gosto", em 1880, com a patética cena dos crepes em redor da estátua do bardo no Largo do mesmo nome. Ignoro que "vulto" terá Marcelo escolhido para ornamentar, com o seu verbo, as comemorações deste ano. E muito menos a cidade, cá e lá fora, onde o evento se desenrola, com o seu tradicional cortejo de "elites" e meia dúzia de tropas a desfilar.

Na verdade, nada existe para comemorar em nome de Portugal, neste ano da desgraça de 2023. Nunca tivemos dramas identitários. Somos o mais sólido e antigo complexo histórico-geográfico da Europa que alguns palermas querem pôr em causa com a regionalização, de exclusivo interesse político-partidário, e nunca nacional. Tal representaria, num certo sentido, uma traição à pátria. Por outro lado, as instituições políticas de soberania não podem estar em piores condições.

Um Governo trespassado de autismo e de autoritarismo, um Parlamento que o secunda com a sua maioria absoluta de improváveis lacaios, salvo uma ou outra forma de vida inteligente, um presidente capturado pelas suas "variantes e variações", a quem muito pouca gente presta atenção, e um sistema judicial, com vértice no Constitucional, que é praticamente uma vergonha latino-americana. Lá onde as democracias (cito Sena) "não são a paz nem o sossego - são a agitação, a reivindicação, a negociação, a discussão", por cá reina a paz dos cemitérios de Schiller e Verdi, sem valentes como o marquês de Posa. Dir-me-ão que sobra o "povo".

Mas o "povo" hesita no que quer e não quer, estando-se verdadeiramente nas tintas para a "situação" ou para a "oposição", esta uma coisa híbrida que paira no plano metafísico. O país (e regresso a Sena) é, hoje, um conjunto de "realidades tremendas que são uma língua ou muitas, uma raça ou várias, uma cultura, por mais adaptável ou capaz de absorção que ela seja, que se identificam com um nome secular - Portugal". Um lugar "para servir de exílio a vencidos e enganados", diria Agustina. Um lugar "onde nada se agita e tudo se murmura". Um lugar mal frequentado."

João Gonçalves - Jornal de Notícias

7 de junho de 2023

O estado a que chegou o Estado

"Os certificados de aforro eram uma pedra no sapato da Banca. A sangria nos depósitos contava-se por milhares de milhões desde o início do ano, ou, dito de outra forma, 67 milhões de euros por dia. Mesmo que ainda não fosse o caso (acredite quem quiser), não tardaria que se transformasse num problema de liquidez.

Pior. O movimento massivo de pequenos aforradores, dos bancos para a dívida pública, equivalia a um grito diário de revolta contra a forma como os banqueiros conduzem o seu negócio. Os bancos cobram, nos empréstimos à habitação, juros quatro vezes superiores aos que pagam pelos depósitos. É esta usura, aliás, que explica que, mesmo depois de um ano de 2022 com lucros fora do normal, estes tenham chegado a um nível absurdo no primeiro trimestre de 2023 (quase mil milhões nos seis maiores bancos).

Confrontado com a questão, o que fez o Governo? Mostrando "zero cedência" perante os interesses dos poderosos, mas preocupado com o défice e a dívida, acabou com a série de certificados de aforro que ameaçava transformar os portugueses em milionários. Ao final de uma sexta-feira, não fosse ainda o malandro do pai aplicar a correr os mil euros da poupança do filho, não fosse algum professor, jornalista, ou empregado de escritório com a mania das grandezas levantar os cinco mil euros que tem guardados para um imprevisto ou para a reforma que se aproxima, aproveitando-se da generosidade do Estado.

Generosidade, sim, que, segundo as explicações iniciais, pagar um juro de 3,5% pela dívida pública não era racional. É verdade que, na segunda-feira, ficou claro que, descontado o IRS que cobra sobre os juros, o Estado paga mais aos grandes investidores estrangeiros do que aos pequenos aforradores nacionais. Mas isso não é caso para perder a face. É preciso pensar na previsibilidade: ou seja, o filho entretanto chega à maioridade, o tal azar acontece, ou o velhote reforma-se mais cedo. Levantam o dinheiro e deixam o Estado, pobre dele, com as calças na mão. E você, também acredita em histórias da carochinha?"

Rafael Barbosa - Jornal de Notícias

Não diria nem escreveria melhor que o Rafael. Na mesma linha do assunto, também subscrevo na íntregra a opinião seguinte de Paula Ferreira:

"Bem pode o secretário de Estado das Finanças dizer que houve zero pressão dos bancos, versão certamente confirmada pelo ministro se, eventualmente, Medina responder ao repto dos partidos e for ao Parlamento. O fim da Série E dos certificados de aforro anunciado numa noite de sexta-feira, depois da hora de jantar, aparenta ser golpe sujo perante os portugueses que amealham as poupanças e têm a veleidade de esperar algum retorno.

Até podemos com bondade, uma dose enormíssima de bondade e candura, aceitar a versão do Governo. Mesmo assim, mesmo que nos esforcemos, não conseguimos acreditar. Tinha havido sinais de que a banca não estava nada contente com a sangria dos depósitos, saídos diretamente para os cofres do Estado. Houve quem o dissesse abertamente. Foi o caso do presidente do Banco CTT. Defendeu, em público, que o Estado devia suspender a emissão de certificados de aforro; outros o terão feito, por certo, com mais discrição. Ora, não demorou uma semana para o desfecho: o Governo cedia. 

Mas, para nem tudo ser mau, acena aos portugueses com a emissão de certificados do tesouro. Com uma nuance: uma taxa inferior aos 3,5% dos certificados de aforro, logo bem menos atrativos, logo menos competitivos com o setor bancário. Que faz a festa. Ontem, passou a remunerar os depósitos, ou seja, o dinheiro que os depositantes emprestam aos bancos, com uma taxa média de pouco mais de 1% - taxa inferior, na Zona Euro, só Chipre e Eslovénia.

Coincidência? Ninguém acredita. Há dados objetivos. Os bancos viram sair dos seus cofres, desde o início do ano, 67 milhões de euros todos os dias, como se pode ler nas páginas seguintes. O Governo é amigo e a medida vai com certeza estancar a sangria. Não porque a banca esteja sem liquidez. Apenas precisa de aumentar os lucros. Ao Estado, os portugueses emprestam dinheiro: nos bancos, depositam em troca de juros. Eufemismos."

Paula Ferreira - Jornal de Notícias