Eu não sei se é eticamente censurável, com falta de transparência na gestão pública ou se configura nepotismo, a decisão de Emídio Sousa, actual secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, enquanto presidente da edilidade de Santa Maria da Feira, de aprovação de uma nomeação por parte do seu vereador da Cultura, para um cargo político de uma sua familiar indirecta, no caso uma sobrinha, para secertária do gabinete do respectivo pelouro. Talvez seja, talvez não!
Talvez o ex autarca se tenha posto a jeito para a censura e para o escrutínio público, mas, de acordo com a lei, e disseram-no os especialistas, a aprovação da nomeação foi legal. De resto, uma nomeação política é isso mesmo, escolher alguém que se conhece e de quem se tem confiança. De resto, Emídio Sous não nomeou mas apenas aprovou, o que poderá dar ao mesmo, ou talvez não. Além do mais, do que conheço e me têm transmitido, a pessoa em causa, há mais de 10 anos que tem exercido a função com qualidade e competência, afinal que o que se espera do respectivo cargo.
A questão essencial aqui será esta? É legal? É ilegal? Se é ilegal, que actue a Justiça, ou deveria ter actuado no tempo próprio. Se é legal, então nada a opor. Se estão em causa questões de transparência, ética e nepotismo e se tal é censurável ou não, mesmo sendo um cargo de confiança política, então que se altere a lei para impedir estas coisas, estas dúvidas, este pasto para chamas, porque este não foi caso único e, de uma forma ou outra, aqui, ali e acolá, é prática corrente. Ademais, custa acreditar que num Estado de Direito, em que se defende a individualidade, alguém possa ser prejudicado no acesso a funções públicas só porque é familiar indirecto do presidente, do vereador ou do director. Terá menos direito que qualquer outro cidadão?
Talvez mais do que isso, é censurável, e mesmo eticamente reprovável, que sob um ponto de vista jornalístico, um assunto que foi público e legal, venha agora a terreiro através de um meio de comunicação social com estatuto de serviço público, quando passado mais de uma dezena de anos sobre o facto. A que propósito, com que objectivo?
Reitero, o ex-presidente da nossa Câmara pôs-se a jeito, e eu não o faria, mas actuou apenas dentro do que a lei permite. Quanto à ética e aos outros valores que se procuram aqui debater, e se foi ou não censurável ou reprovável, revestem-se de subjectividade e interpretação de acordo com os interesses de quem critica, para além de que tais valores há muito que deixaram de ser considerados, sobretudo no contexto de serviço público e político. Porventura, quem agora defende que faltou ética no caso, é defensor de que um médico quebre o seu juramento e possa praticar o aborto e a eutanásia, ou que um jornalista revele as fontes, ou que um oficial de Justiça quebre o segredo de processos, e que a acção de um criminoso informático, invadindo o foro particular deterceiros, como a sua correspondência, seja elevado aos céus como benfeitor, só poque supostamente em nome do bem público, como se, em consonância, a um advogado seja legítimo revelar a confissão de um seu cliente, admitindo o crime, por mais banal ou hediondo que seja. Além do mais, se há sector da sociedade que há muito perdeu o crédito da ética, é precisamento o da comunicação social e do jornalismo, precisamente o que agora vem a terreiro fazer de juíz. O jornalismo, de um modo geral, não só os dos órgãos conotados com o sensacionalismo, como mesmo o da RTP, tem sido digno de retrete. É disto que se trata, mesmo que fique por clarificar o propósito.