12 de agosto de 2023

Por terras de Esteves

Numa manhã de Sábado a convidar a sair de casa, fomos em nova visita às belas terras de Sever do Vouga, e novamente a Couto de Esteves onde percorremos um dos fantásticos trilhos que nos levou até à aldeia dos Amiais (em dia de vindima) com a albufeira de Ribeiradio, no rio Vouga, a encher os olhos, e depois o regresso por Couto de Baixo.

Este percurso vale pela bela aldeia dos Amiais e pela sua eira comunitária com um belo  conjunto de 7 espigueiros restaurados e com um parque de lazer que permite aceder à praia da albufeira. Ali, de vez em quando há convívios em que a comida é à borla e apenas paga-se a cerveja ao preço da uva chorona.

Para além de tudo, uma grande parte do percurso a bordejar viçosos campos de verdes milheirais amamentados à moda antiga por regos e levadas com água fresca sempre a cantar. Ainda passagens sob frondosos bosques de carvalhos e ao som das águas límpidas do rio Gresso, também chamado de rio Branco e por vários outros ribeiros que apesar de minguados pelo estio, ainda com pressa de chegar ao Vouga.

Um percurso não muito longo mas com um sobe e desce constante e um desnível significativo.

O repasto poderia ser ali mesmo em Couto de Esteves, no Júnior, onde já comemos soberbamente, mas como ainda não era tarde viemos almoçar já em Fajões de Oliveira de Azeméis, junto à Senhora da Ribeira, com diárias económicas e bem servidas.

Em suma, mais um fantástico percurso daqueles que enchem o olho de recantos bucólicos e ainda com muitos vislumbres de tempos passados que por cá, pelas nossas bandas, já quase só são memórias.

O próximo percurso, já agendado, será ainda por aqueles lados, porque muito ainda há por ali a percorrer entre bosques e rios cantores, como o Gresso e o Arões. Raios me partam se não havemos de lá ir pelo Inverno, só para os ver vigorosos a espumarem-se de liberdade e com aquela persistência que amacia e arredonda as mais duras rochas.

De seguida alguns olhares dos muitos absorvidos com os olhos e a alma. 


Ó trigueirinha, diz-me aonde vais

Pela fresca, ligeira, apressada?

- Vou lá abaixo, à eira dos Amiais

Onde à noite vai haver desfolhada.


Mas não vás sozinha, desacompanhada

Que o caminho é breu por carvalhais;

És bonita, sozinha, eu sem namorada,

De mão dada, os dois, vamos aos Amiais.































































10 de agosto de 2023

Incerteza



Vivo neste cuidado até me cansar

Numa permanente busca do perdido,

Até que logrando, feliz, encontrar,

Me dê, enfim, como bem merecido.


Mas na vã incerteza de tal labuta

Fico quase perdido, em sofrimento,

Em saber se venci ou perdi essa luta

Ou se dela tive algum merecimento.


Um rio, se nasce para o mar corre

E nada se encontra se não perdido;

Então, sem nascimento, quem morre,

E sem luta quem se dá por vencido?


Talvez seja assim o meu destino:

Uma ânsia continuada de indagar,

Ir ao encontro do toque do sino,

A saber se por festa ou por chorar.


A.Almeida - 14-03-2023

Fujamos da chuva!

Num jogo de futebol, vejam lá a novidade, há três desfechos possíveis: a vitória, a derrota e o empate. Por conseguinte, sendo disputado por duas equipas, se não houver empate significa que uma vencerá e a outra perderá. Perceberam?

Por conseguinte qualquer adepto da coisa deve estar preparado para qualquer resultado da sua equipa, seja em que contexto for, para além da outra questão acessória que é a decisão eventual do desempate por penalties. Outros quinhentos.

Todavia, se há muita e boa gente que percebe isto e como tal se comporta, outros há que é tiro e queda, ou seja, convivem mal com a derrota e raramente ou nunca a aceitam. Há quem diga, para o justificar, que isto é fervor, mística e amor ao clube, mas também quem considere que é apenas o elementar fanatismo, falta de fair-play, respeito ou mesmo fanfarronice.

Ora esta situação é mais grave quando esses adeptos ocupam igualmente posições de liderança e como tal com muitos olhos postos no seu exemplo.

Mas em rigor isto já pouco interesse tem e serve apenas para alimentar jornais e debates na TV porque com o futebol na dimensão em que está, não passa de uma mera indústria, um negócio de muitos milhões, que usa os adeptos apenas como fonte de receita para pagar principescamente a jogadores, dirigentes e empresários. Por conseguinte os valores que ainda, pensamos que estão lá, como o desportivismo, o fair-play, o respeito pelo adversário, etc, são na realidade eufemismos sem correspondência e usados apenas para entreter gente sem sono.

Mas que é interessante assistir a este "jogo" para além do rectângulo de jogo, é, porque nele podemos ver até onde vai o pior que o futebol tem, a rivalidade doentia, o desrespeito mútuo, a fanfarronice, a falta de bom senso, etc.

É o que é! Talvez por isso, a leste do paraíso, só soube hoje de manhã do desfecho do resultado de um certo jogo de futebol que terá acontecido ontem ao início da noite. E, como se previa, sem surpresas, não tanto no resultado, que poderia ser qualquer um, mas sobretudo nas reacções a ele. Mais do mesmo.

Se está a chover, fujamos da chuva, a não ser que valha a pena ver alguém a molhar-se!

9 de agosto de 2023

Escolher feijões


E sabem lá os mais novos o que isso é! Escolher feijões? Quando muito pensarão que é, nas prateleiras das grandes superfícies de distribuição, escolher entre as diversas opções de latas ou sacos de branco, preto, vermelho, fradinho, de manteiga, catarino, etc, etc. E se possível já cozido, pronto a misturar com um arroz, massa ou sopa.

Realmente, para quem nunca passou por isso, apesar de, com a internet, não faltar informação disponível na ponta dos dedos, haja vontade e interesse, é certo e sabido que uma grande parte dos mais novos não têm noção do caminho, dos processos que passam os alimentos até chegarem às nossas despensas e depois à mesa. Não custa acreditar que ainda haja gente que não sabe a proveniência de um ovo, de uma salsicha, do fiambre ou do queijo. A ignorância ainda é muita e com o afastamento das pessoas das realidades do campo, tudo é possível. Daí que ainda se veja criançada surpreendida quando visitam uma qualquer quinta com animais domésticos, como galinhas, ovelhas e burros, a que agora pomposamente se designa de pedagógica. Vejam só!

Pois bem! Se é certo que os mais novos pouco perceberão da poda, os mais velhos sabem perfeitamente o que é isso de escolher feijões. Actualmente já nem tanto, apenas umas amostras de feijão de vagem, ou rasteiro, nas nossas hortas, mas ainda há algumas dezenas de anos eram habituais as sementeiras em larga escala, ou como monocultura ou misturado com o milho. Ora, algumas vezes por mistura acidental, outras vezes propositadamente, até porque as sementes recolhiam-se de ano para ano, quase sempre na colheita e depois da debulha, que ao contrário do milho, era em grande parte manual, mesmo que ligeiramente batida na eira, certo é que o habitual era haver feijões de várias espécies e cores pelo que havia então a necessidade de os escolher, ou apartar. Entre os lisos e de várias cores, branco, vermelho, amarelo, roxo, preto, os mais comuns, até aos riscados e ainda o fradinho, era uma tarefa minuciosa, de paciência e obviamnete aborrecida, sobretudo para a criançada quando os pais os obrigavam a essa empreitada.

Mas era uma tarefa que tinha que ser feita, principalmente quando havia a necessidade de vender, e havia compradores que percorriam as aldeias a comprar feijão,  mas também porque se a cozinhar de forma misturada, devido a diferentes graus de dureza, o feijão requeria diferentes tempos na panela, mesmo que depois de demolhados.

Mas mesmo ainda antes da debulha, limpeza com crivo e a escolha, o feijão regra geral era chato de colher, porque semeado entre o milho. Requeria cuidado e sobretudo muita água.

Nos tempos modernos, já pouco feijão se produz nas nossas aldeias à moda antiga, e por conseguinte a sua exploração é feita de forma muito mecanizada e em grandes parcelas e mesmo assim Portugal importa aproximadamente 80% das leguminosas secas (a que pertence os feijões) que consome, apesar dos especialistas afirmarem que com as políticas certas poderíamos ser auto-suficientes. Desta percentagem de leguminosas secas, mais ou menos 75% refere-se a feijão.

Mesmo consumindo boas doses per capita, os nutricionistas consideram que os portugueses deveriam consumir mais, nomeadamente em detrimento de outras origens de proteína animal. Quem não gosta de uma boa feijoada, de branco ou vermelho, com tripas ou à transmontana, ou um grão de bico com um bacalhau com todos ou em rancho? Ou mesmo uma salada fria com feijão fradinho? Lentilhas e ervilhas secas, menos comum, mas também vão à mesa.

Em resumo, isto de feijões tem que se lhe diga mesmo que não se valorize um jogo ou uma aposta a render feijões. Fazem parte das nossas mais antigas memórias associadas aos tempos em que no campo se encontrava a nossa subsistência.

Já agora, o feijão, nomeadamente o feijão-comum (Phaseolus vulgaris), chegou até nós a partir da época dos Descobrimentos, provenientes da América Central e do Sul. As espécies mais comuns englobam o que chamaamos de feijão encarnado, o branco, o manteiga, o catarino, o canário, o amarelo, etc.. Mas há ainda variedades tradicionais portuguesas, com nomes bem engraçados, como o patareco, o vassouro, o raboto, o torino, o papo-de-rola, o crista-de-galo, o cuco,  o arrebenta-panelas e o bigode-de-homem. Mas há ainda mais e perde-se a conta às variedades e espécies, seja na cor, tamanho, sabor e outras características tanto culinárias como vegetativas.

Importa, pois, valorizar os feijões, porque mesmo que disponíveis em lata, já cozidos, têm que ser semeados, regados, colhidos, debulhados, limpos e processados. Só depois é que vão à panela, á mesa e à boca. À pois é, é!

8 de agosto de 2023

Carlos (Cruz) Cruzadas com novo livro

 

Está ainda a fumegar de quente, o novo livro de Carlos Cruzadas (Cruz). 

Depois do primeiro "filho" "Ao longo dos tempos", num registo mais intimista, com poesia e curtos textos de introspecção, desta vez o Carlos concretiza um livro dedicado à biografia de Justino da Silva Cruz, um seu familiar e conterrâneo da terra de nascença, ilustre e reconhecido filatelista entre os seus pares, que considera o autor ser de justiça trazer à luz do reconhecimento também junto das suas humildes origens.

Justino Cruz, é coleccionador de selos há mais de 50 anos, tendo sido co-fundador do Clube Filatélico Português, em 1975, e seu presidente honorário desde 1995. Detém a medalha honorária da cidade de Estugarda - Alemanha, onde é emigrante.

A apresentação está marcada para o lugar de Labercos, freguesia da Lomba - Gondomar, no próximo dia 19 de Agosto, pelas 16:00 horas.

Tem-me dito o Carlos que será porventura o seu último suspiro nestas coisas de publicar livros, mas creio que não, até porque há roseiras que ainda florescem pelo Natal. Ademais, seria uma pena e perda que tantas coisas com sentido ficassem órfãs de páginas impressas.

Quanto à filatelia, o coleccionismo de selos, é um tópico interessante, artístico, histórico e cultural. Pessoalmente é um assunto que também me agrada e de resto tenho centenas de selos de diversos temas. 

Não sou coleccionador, longe disso, muito menos especialista, como será o Justino Cruz,  mas fui juntando, comprando e guardando. É arte. É cultura.

Acudam que há fogo!

 


Não sei o que tem de apetecível a zona dos Quatro-Caminhos para que quase todos os anos seja varrida por incêndios. É certo que aquela mancha sem casario, que descontinua os lugares da Gândara, Leira, Estôse e Azevedo é propícia a que a bandidagem use o isqueiro e dê de frosques facilmente sem que sejam detectados. Mas que há ali coisa, há, e lembro-me a propósito do que acerca de coisas do outro mundo dizia a minha bisavó quando há muito e muito tempo ali passava, quando a acompanhava a casa do Ti Alexandrino no lugar de Azevedo. Também, pelo que vi já hoje de manhã, com o mato ainda a fumegar como se acabado de assar sardinhas, dinheiro em limpeza na margem da rua foi coisa que o dono não gastou. Tudo ajuda.

Mas não se espere mudanças neste calvário que todos os anos tem hora marcada para fustigar o país. A lei e a justiça são brandas e assim vai-se andando a fazer-se de conta que os lavradores, os proprietários é que são os responsáveis e os assadores de sardinhas uns bandidos.

Com estas e outras, há por aí muito terreno de mato e pinhal que dado é caro mesmo que ainda com a obrigatoriedade de limpeza só para alguns. Mas o BUPi está em curso e apesar da salgalhada que por lá vai com prédios sobrepostos duplamente, um destes dias as autoridades já saberão o nome e o número da porta a quem ir entregar a coima.

Ainda há algumas semanas pediram-me: - Ó Américo, dê-me lá uma avaliação para o Mato da Escouça, nos Corgos, que o primo anda a insistir para eu comprar. Eu não queria, porque ali nunca porei os pés, mas como é da família os meus filhos disseram-me para comprar e que ficará para ali. Então sou capaz de comprar mas também não me quero aproveitar da vontade dele. Dê-me um preço justo!

Apeteceu-me dizer-lhe que o preço justo era de graça e ainda com o custo da escritura a suportar pelo vendedor e arrematado com a oferta de um bife no Zé de Vér. Mas lá lhe disse: - Ó Ti Tavares, ali pelos Corgos é só fraga dura, deslavada e até um tractor geme ao lá passar. Além do mais, é terra lambida pelas chamas e o pouco que lá cresce, como os leitões na Bairrada, morre ao nascer. Mas, pronto, por respeito não à Escouça mas ao seu primo, e se tiver lá dinheiro a estorvar, pague-lhe a 1 euro o metro quadrado, que é bem pago e respeitoso. Como por lá será improvável passar a Guarda, pelo menos poupa-se à limpeza. O incêndio faz-lha de graça de dois em dois anos.

Confesso que não sei se o negócio se fez, mas talvez sim, porque o Ti Tavares é bom homem e de dinheiro, já de idade avançada e tem os filhos bem instalados na vida. Com jeitinho nunca chegarão a saber onde fica a propriedade da Escouça e nem talvez o BUPi ajude porque o mais certo é nela estarem encavalitados mais dois ou três proprietários.

Sobre esta situação do baixo valor patrimonial de muitos dos nossos matos e pinhais, trouxe-me à memória um episódio a que assisti há meia dúzia de anos quando o Sr. Pinheiro decidiu fazer a partilha pelos filhos de umas tapadas lá pela serra de Vila Nova e então, já velhinho, pediu-lhes que o levassem pela última vez a ver os seus matos. O Domingos, o mais velho, meteu-o a custo no jipe todo-terreno e serra acima, serra abaixo, lá percorreu aqueles caminhos de cabras infestados de tojo e giestas como numa peregrinação à Senhora da Peneda. - Olha, Domingos, este é o Calvelo, aquele é o da Laje, aqueloutro o da Fraga. Ali, a partir daquela cancela é o da Pedra Alta. Lá em baixo, a partir daquele sobreiro é o Mato do Lajedo.

Uma a uma reconheceu o velhinho aquela dúzia de tapadas, uma ou outra com mais de um hectare, a maioria com pouco mais de mil metros. Mas até pelos nomes daqueles pedaços de terra escalvada se adivinhava a sua natureza granítica onde as poucas árvores se enraizavam com dificuldades e a água escorria sem se deter para as amamentar.

Terminada a peregrinação e levado o pai para a fresca sombra da ramada, disse-me o Domingos, com o zeloso cuidado para que o pai o não ouvisse, não o fosse desgostar: - Foda-se! Vão calhar-me alguns matos que não valem o gasóleo que gastei!

Acudam que há fogo!


[foto; Repórter Brandão]