18 de setembro de 2018

Micas, muda de saia e vamos à Feira dos Dezoito


Hoje é dia de "Feira dos Dezoito" que se realiza mensalmente na freguesia e vila de Cesar, concelho de Oliveira de Azeméis. Sempre no dia próprio, excepto quando coincide com o Domingo, sendo então antecipada para o Sábado.

As feiras, tal como as conhecemos, continuam ainda muito vivas e dinâmicas, mas já sem o fulgor e importância social de outros tempos em que então o acesso a determinados produtos ou artigos só se conseguia mesmo nas feiras, nomeadamente utensílios e alfaias para a lavoura. 

É certo que as feiras actuais já pouco ou nada têm a ver com as origens em que então predominavam as trocas, mas ao longo dos tempos têm sido importantes no abastecimento das populações e suprimento das suas necessidades quotidianas e delas desenvolveram-se outros espaços como os mercados municipais, dotados estes com condições mais adequadas a quem vende e a quem compra, tanto de conforto como de higiene e salubridade.

Para além dos aspectos relacionados com a origem e desenvolvimento das feiras, que para já não é assunto deste artigo, de forma mais genérica trazemos aqui sobretudo a memória e as particularidades da importância do contexto da "Feira dos Dezoito" para a nossa região, incluindo a nossa freguesia. 

É certo que nas redondezas ainda hoje se realizam várias feiras com uma certa importância, como a "Feira dos Quatro", em Arrifana, a "Feira dos Dez" e "Feira dos Vinte e Oito", em Lourosa, ou mesmo a "Feira dos Vinte", na sede do nosso concelho e ainda a Feira de Espinho (todas as segundas-feiras) e a Feira dos Carvalhos (todas as quartas-feiras). Ainda que mais pequena, a "Feira dos Treze" em Cabeçais - Fermedo. Todavia, creio que eventualmente pela proximidade e pela sua amplitude e diversidade, a "Feira dos Dezoito" será aquela com mais ligação às gentes de Guisande, seguida eventualmente das "Feira dos Quatro" e "Feira dos Dez".

Esta feira é secular pois terá sido iniciada em 1835. Realiza-se no largo chamado Praça da Liberdade e estende-se por algumas ruas adjacentes, nomeadamente a que conduz ao Largo de S. Sebastião, onde se vendem os produtos hortícolas para plantações e sementeiras na horta, peixe e carne, e lugar onde outrora se fritavam iscas de peixe, nomeadamente solha, que ali se comiam na hora. Não tenho a certeza se actualmente ainda há por lá alguma fritadeira de iscas. Havia gente, como o saudoso avô de minha esposa, Sr. Belmiro Henriques, do lugar da Igreja, que com muita frequência ia à feira a Cesar propositadamente para comer iscas de solha frita. Como ele muitos. Mesmo eu, em pequenote, recordo-me de ali ir com o meu pai, comprar umas sogas de couro para a parelha de bois e com passagem pelas velhinhas fritadeiras, de roupa tão preta como a frigideira ondealouravam largas postas de boa solha ou outros bichos do mar.

Como se pode imaginar, nesses tempos tudo ou quase tudo se podia comprar na feira, desde botões, colchetes, elásticos, rendas, agulhas e carrinhos de linhas para as costuras, até a uma vaca ou um boi, galinhas e outra bicharada de bico. Roupas, calçado, incluindo os tamancos de madeira e velas de sebo para as engordurar e taxas para as solas, arreios para o gado, cestas, gigas, canistréis, ceroulas, cuecas e outras roupas, chapéus e bonés, louça, tachos e panelas, serrotes, fouces e foucinhas, machados, ancinhos, ganchos e enxadas e respectivos cabos para as encabar. Plantas como couves, cebolo e tomates para dispor na horta. Etc, etc. Qualquer abastado labrador ou humilde caseiro ali encontrava remédio para as suas necessidades de trabalho, de vestir, comer e viver. Até ouro ali se vendia. E, claro está, ir à feira era também um momento de recreio e convívio, até aproveitado por namorados. Os homens também faziam negócios de gado, de venda de pinhal e outros empreendimentos.

Desde muito pequeno que tenho memória de pessoas da freguesia e do lugar que mensalmente iam à feira, mesmo numa jornada de ida e volta (carregados) a pé, e mais tarde, já pelos idos anos 60, com a Feirense a fornecer nesse dia transporte de autocarro, de ida e volta. Desde então, era frequente a cada dia 18 ver pessoas à espera em Fornos, na Leira ou em Estôse à espera da "carreira" para irem à feira a Cesar. Com a generalização dos automóveis, creio que já há alguns anos que essa carreira deixou de se fazer.


Quanto a Cesar,  destaca-se por ser uma das freguesias mais industrializadas do concelho de Oliveira de Azeméis, tendo sido elevada a vila em Maio de 1993. Tem um território com 5,43 km² e uma população de 3 166 habitantes (Censos 2011).

Ao longo da sua já longa história, com origens pré-romanas, Cesar conheceu três épocas importantes de desenvolvimento: a primeira, no final século XIX, quando muitos dos cesarenses que emigraram para o Brasil, voltaram e fizeram investimentos, dando um grande contributo no crescimento da terra que ainda hoje se verifica. Dessa migração, é possível ver em Cesar vários edifícios, quase palacetes, designados de "casas de brasileiros", com uma arquitectura muito característica e elaborada, tanto ao nível dos volumes como coberturas e utilização de elementos decorativos em ferro fundido, nomeadamente guardas de escadas e varandas, grades e portões de muros; a segunda época, entre 1930 e 1935, com a fundação da Sociedade Eléctrica e a instalação do primeiro telefone público que deram um avanço significativo no progresso de Cesar; e a terceira, a época mais importante, a partir de 1943 com o início da Era Industrial.

É nesse período pós-guerra que começa a grande viragem para a vila que, até então era predominantemente agrícola e vê, a partir deste momento, a implementação da indústria em diversas áreas mas, essencialmente, na louça metálica (nomeadamente Silampos e Celar). A par da fixação das empresas e consequente crescimento, surgem também os serviços e as sociedades comerciais que, ao longo de todos estes anos, foram evoluindo e fomentam a economia da vila. Este crescimento possibilitou a conquista e a criação de novas infraestruturas e equipamentos que vieram colmatar as necessidades sentidas pela população.

Cesar, a exemplo de muitas freguesias nas redondezas, há muito tempo abandonou as suas características de meio rural e se afirmou, verdadeiramente, como um centro semi-urbano, que aposta fortemente na expansão tecnológica e industrial, com implantação de empresas importantes no contexto regional e mesmo nacional, mas sem nunca esquecer o seu passado ligado à terra, à agricultura.