23 de dezembro de 2021

O Salão Paroquial de Guisande



Salão Paroquial na actualidade.

Para quem nasceu depois da primeira metade dos anos de 1960, sempre conheceu o Salão Paroquial de Guisande tal como ainda está nos dias de hoje, sendo um edifício destinado à catequese,  à realização de eventos comunitários ligados à paróquia, como encontros, reuniões, convívios, espectáculos, saraus recreativos, teatro, etc.

O Salão Paroquial tal como o conhecemos, foi edificado na primeira metade dos anos 1960, tendo a maior parte das suas obras sido realizadas no ano de 1964 e terá sido concluído por volta de 1965 ou mesmo início de 1966. 

Desenvolve-se em dois pisos, Rés-do-Chão e Andar, com a comunicação vertical entre os pisos a ser assegurada por uma escada exterior praticada na fachada lateral a norte. O acesso do espaço público ao edifício processa-se pelo caminho público localizado entre o salão e a igreja.

A planta é rectangular, de orientação poente/nascente e com dimensões aproximadas de 15,00 x 8,00 m, por isso com uma área de implantação de 120,00 m2.

Plantas dos dois pisos do Salão paroquial.
Em baixo o piso do Rés-do-Chão e em cima o pavimento do Andar.

No piso térreo desenvolve-se o salão propriamente dito, com um espaço amplo e na parte posterior um palco elevado a cerca de 1,00 m. Não tem espaços de apoio ao palco pelo que os acessos processam-se por detrás do cenário, tanto dos lados como na parte posterior. A zona do palco tem uma saída directa para o exterior do lado norte.

O Andar é composto por 5 pequenas salas, numa organização aproximadamente simétrica, a que se acedem a partir de um vestíbulo central o qual desemboca no pátio da escada exterior.

Este edifício emblemático da nossa freguesia e paróquia, foi implantado no mesmo local onde até então e desde de 1909 existiu um outro edifício, com uma implantação de área aproximada ao actual edifício mas apenas com um piso térreo, chamado de Casa dos Mordomos ou Casa das Sessões. Para além de um espaço de arrumos e apoio às actividades da paróquia, o mesmo dispunha de uma ampla sala onde a Junta de Freguesia e antes dela a Junta Paroquial, bem como os mordomos das diferentes festas, confrarias e irmandades, tinham as suas reuniões.

Pelo que é possível perceber de algumas poucas fotografias dessa antiga construção, a mesma estava implantada à face do caminho, mais larga que o actual salão e dotada com duas  portas na fachada principal, dispostas simetricamente, voltadas a poente e encimadas na parte superior central por um elemento talhado em pedra, tipo florão, com um anagrama formado pelas letras C A P. 

Não tenho a certeza do significado do anagrama, mas sendo plausível que possa corresponder a Casa de Administração Paroquial, considero, todavia, que a mais provável e para a qual me inclino, se refere a Custódio Alves de Pinho, rico proprietário do lugar do Outeiro, que terá contribuído para a construção desse edifício e que assim desse modo quis ou quiseram perpetuar esse benemérito. De resto o seu nome também está gravado na parte exterior da caixilharia do guarda-vento no entrada principal de igreja matriz a propósito das obras de melhoramentos ocorridas entre os anos de 1923 e 1929.

Florão em granito, com o anagrama C.A.P.

De referir que este elemento, na imagem acima, foi aproveitado mas afixado no actual edifício do salão, mas na fachada norte, na zona debaixo do vão da escada exterior. Creio que se o mesmo tivesse um significado relacionado ao nome ou função do salão, o Pe. Francisco teria colocado o mesmo sobre a fachada principal e não de forma discreta e quase escondida na fachada lateral norte, debaixo da escada, como já referi. Ainda lá está para ser testemunhado como o único vislumbre da antiga Casa dos Mordomos. 

Ainda quanto à configuração da antiga Casa dos Mordomos, esta teria uma cobertura com desenvolvimento em "quatro-águas", solução que acabaria por ser adoptada igualmente no edifício que lhe sucedeu.



Fotografia (colorizada) do princípio dos anos 1940, em que se vislumbra parcialmente a antiga Casa dos Mordomos.

A foto acima, datada do início dos anos 1940, apesar de captar parcialmente o edifício, será uma das poucas que permite deixar perceber o aspecto da fachada da antiga Casa dos Mordomos, com as tais duas portas, com umbreiras em cantaria e o tal florão em granito incrustado na parte central da fachada. Veja-se que, pela projecção do alinhamento do muro norte do cemitério, o antigo edifício estaria implantado um pouco mais para sul do que o actual salão.

Também pelo que é dado testemunhar por algumas fotografias da época, as paredes exteriores do nível do rés-do-chão do actual salão foram erigidas com granito, dito perpianho, e certamente aproveitando a pedra da antiga construção. Já o piso superior, o Andar, foi realizado com paredes exteriores em tijolo de barro vazado. As lajes de pavimento e tecto do Andar foram realizadas com laje em cimbre. A cobertura tem estrutura de madeira e revestimento de telha de barro do tipo "francesa".

Quando o Pe. Francisco celebrou as suas bodas de prata sacerdotais, em 15 de Agosto de 1964, o salão ainda estava em obras, praticamente na fase de pedreiro, mas foram adiantadas e mesmo com acabamentos improvisados para que no Rés-do-Chão ali fosse possível acolher com a dignidade possível a boda da celebração. Há fotografias desse evento e nota-se que o interior estava revestido com panos e elementos de verdura para disfarçar as paredes que certamente ainda não tinham o acabamento final. Mesmo o pavimento estaria apenas em cimento.


Nas fotos acima, datadas de 8 de Julho de 1964 (data de aniversário do Pe. Francisco, que então completava 49 anos de idade, pois nasceu em 1915), vê-se partes das fachada do salão paroquial e como se percebe, as paredes estavam ainda em pedra e tijolo à vista, sem reboco ou acabamento, bem como se nota no interior alguns materiais. Mesmo o beiral da cobertura ainda estava com escoras.

Já agora, na foto, reconhecem-se várias pessoas, para além do Pe. Francisco e suas irmãs, o Pe. António Santiago e seu pai,  Dr. António da Casa do Loureiro, O Sr. Domingos Azevedo “Patela”, o Sr. Belmiro Henriques, da Igreja e o Sr. José Gomes, do Reguengo. Os demais, não os identifiquei.

Como as bodas de prata seriam dali a pouco mais de um mês, a 15 de Agosto de 1964, certamente que as obras ao nível do piso térreo foram aceleradas. Nas fotos publicadas abaixo, referentes a momentos do almoço do evento celebrativo, já se percebe que pelo menos havia porta exterior e janelas, embora, como atrás se disse, com as paredes ainda em pedra e revestidas com panos brancos.


Na foto acima, também do ano de 1964 mas já depois da data das Bodas de Prata do Pe. Francisco, em 15 de Agosto desse mesmo ano, vê-se parcialmente o salão, percebendo-se as paredes do Rés-do-Chão realizadas em granito e as paredes do Andar realizadas em tijolo de barro mas já com as janelas colocadas. Também se nota que no Andar já estavam colocadas as janelas e o edifício já tinha cobertura e telhado. 




Pela leitura das fotos acima, que captam momentos do banquete das Bodas de Prata Sacerdotais e Paroquiais do Pe. Francisco, percebe-se que devido à necessidade de acolher o almoço, as obras foram aceleradas. Distingue-se o embelezamento das paredes com panos brancos bem como como existência da porta principal e certamente as janelas.

Certamente que depois de passada a data e cerimónias das Bodas de Prata foi dada continuidade aos trabalhos, tendo começado o revestimento com reboco, tanto na parte interior como na exterior e seguindo-se naturalmente os demais acabamentos, de modo a que as obras se concretizariam nos meses seguintes.

Só por 1965 é que as obras terão sido concluídas oficialmente como terminadas em fevereiro de 1966. Há fotografias (acima uma sequência de algumas delas) de um sarau recreativo, coma  data de 16 de Maio de 1965 (um Domingo), pelo que corresponderão à data da inauguração e entrada ao serviço. Esse evento recreativo constou de danças, pequenas peças de teatro e mesmo a actuação de um grupo musical, que, a ter em conta informações de alguém mais velho, terá sido o Conjunto Típico “Os Peles Vermelhas”, vindos de Lourosa.

A paróquia esmerou-se com os ensaios e apresentação do sarau que para além da parte musical contou com peças de teatro e danças. Terá sido, assim um dia importante e memorável na vida e História da paróquia.




Apesar dessa data referida como da inauguração, certo é que o prédio foi dado como concluído em 15 de Fevereiro de 1966, e dado como ocupado no dia 20 do mesmo mês.  Foi inscrito nas Finanças em 25 de Fevereiro de 1966, conforme o documento reproduzido abaixo


A importância do salão Paroquial:

O Salão Paroquial tem sido ao longo dos tempos de uma extrema importância no contexto não só da paróquia como da freguesia, mesmo que em muitos aspectos tenha sido sempre bastante básico, com uma escada exterior, sem instalações sanitárias e com o salão sem espaços de arrumos e de camarins que possam servir de apoio às actividades teatrais. Também devido às técnicas e materiais de construção, foi sempre bastante frio, sobretudo a parte do auditório, por isso desconfortável sobretudo no Inverno.

Vista da fachada norte do actual salão.

Por conseguinte, ao longo dos anos, para além do desconforto em tempos de catequese e reuniões, foi sempre um cabo dos trabalhos ali realizar teatro, como nos tradicionais saraus de Natal e de Reis, sobretudo em tempo de chuva e de frio. Quem de algum modo já ali participou em eventos recreativos e culturais compreende sobremaneira estas dificuldades, tendo que se trajar no Andar e transportar móveis e outros adereços, escada acima, escada abaixo, muitas vezes expostos ao frio e chuva. 

Neste contexto, se por um lado se compreende que o edifício não tenha de início, por dificuldades financeiras, sido dotado com os referidos elementos que em muito tornariam o espaço mais funcional, prático e confortável, espanta, por outro lado, que nos tempos posteriores nunca se tenha tido a iniciativa e coragem de fazer esses melhoramentos. Cheguei a propô-los ao Pe. Francisco, mas certo é que nunca se entusiasmou com a ideia. 

Por parte das consecutivas juntas de freguesia, o facto do terreno e do prédio ser pertença do Paço (Diocese) também foi sempre uma barreira e obstáculo a qualquer obra que ali se pudesse acrescentar. Por conseguinte, com mais ou menos obras de conservação, como pinturas e substituição de caixilharias exteriores, certo é que o velhinho Salão Paroquial se mantém tal qual foi edificado há mais de meio século. 

Por outro lado, nunca na freguesia, nem mesmo com a construção do edifício sede da Junta de Freguesia de Guisande, inaugurado em 1981, se projectou qualquer coisa em grande e que contemplasse um auditório polivalente e espaço para as diferentes associações ou grupos. Mesmo bem mais recente, a construção do Centro Social, aproveitando o edifício da velhinha escola primária do Viso, também não previa resposta a esse requisito sendo que com a junção das duas salas numa única (por minha sugestão ao presidente do Centro, a que a arquitecta autora do projecto, acedeu), pelo menos criou-se uma sala ampla e com alguma versatilidade e polivalência. Mesmo que com algumas adaptações, como a colocação de um palco ou estrado amovível, será possível ali realizar pequenos espectáculos culturais e recreativos bem como espaço de jantar. 

Do mal o menos, mas certo é que Guisande continua sem um grande auditório projectado e edificado de raiz, tal como têm, por exemplo, Louredo e Lobão. Por outro lado e em contraponto, o movimento associativo nunca andou tão mal e desinteressado pelo que pode-se colocar a questão sobre a necessidade de construção de um auditório ou casa de cultura se não há dinâmica associativa que o justifique? Veja-se, por exemplo, o caso do rinque polidesportivo em Casaldaça, há muito abandonado e sem qualquer uso e utilidade e com as instalações já degradadas. Esta é a realidade actual. Poderá ser que no futuro por um qualquer “milagre” as coisas venham a melhorar, mas por ora é o que a casa vai gastando.

Apesar de tudo isso, e por tudo isso, o Salão Paroquial de Guisande tem um lugar marcado na história da nossa paróquia, freguesia e comunidade e de várias gerações de guisandenses, seja por ali frequentarem a catequese, seja por terem realizado ou assistido a momentos recreativos de teatro e variedades ou mesmo participado em reuniões da paróquia ou tão simplesmente participarem nas dádivas de sangue, que ali também se realizaram.

Alguns elementos sobre a construção do Salão Paroquial:

Como atrás ficou dito, as obras de construção do Salão Paroquial ocorreram na sua maior parte em 1964 e parte de 1965.

Consultando no meio de papeladas da paróquia, demos com alguns elementos curiosos sobre as obras. Fica-se a saber que a empreitada de pedreiro foi realizada por Manuel da Conceição, a parte de trolharia a cargo de Joaquim Gomes da Silva, de Cimo de Vila e a carpintaria também da responsabilidade de um outro Joaquim Gomes da Silva. As grades da escada e portão, foram realizadas por Bernardo Pereira Baptista.

Nos documentos abaixo estão representados alguns dos comprovativos de pagamentos aos empreiteiros. Pela sua leitura constata-se que as obras de pedreiro terão custado 31.662,50 escudos.