29 de maio de 2023

Vila Maior num portugal dos pequenitos

Há coisas assim, enganadoras no nome. Vila Maior é uma terra que nem é vila e até será menor entre as demais do concelho e de resto, na União de Freguesias para onde foi encaixada (com Canedo e Vale), é cauda da mesma, tal como Guisande com Lobão, Gião e Louredo.

Será concerteza terra de boa gente, pacífica, trabalhadora e orgulhosa da sua identidade e tradições, mas é óbvio até para os forasteiros que a sua integração numa União de Freguesias nada lhe acrescentou e até nas coisas mais básicas, como limpeza e conservação de ruas, está desmazelada. Por exemplo, pela Rua do Salgueiro e Rua do Barreiro, por onde passei, a erva nas valetas já dava para uns bons fardos de palha e o piso já teve melhores dias e aguarda por uma não sei das quantas fases das pavimentações no concelho. Nisto de uniões de freguesias é como com certos cães, em que a cabeça é que come e por vezes até tenta morder a própria cauda. Um perigo! Melhor será cortarem-lhes a cauda. E no caso, agradecem.

Vila Maior nestes dias teve a sua tradicional festa em honra do Espírito Santo mas S. Pedro não esteve pelos ajustes e concedeu uns dias cinzentos e de chuva, naturalmente a tirar brilho à romaria e ao envolvimento social. Mas as coisas são mesmo assim e se pudéssemos intervir no clima seria sempre sol na eira e chuva no nabal. Calha a todos e até num bonito mês de Maio a chuva pode cair por mais que atrapalhe certas eiras.

Na bonita igreja matriz, perfilavam-se uns 16 andores todos engalanados das mais vistosas e exôticas flores, alguns a precisar que os olhos se arregalassem para neles vislumbrar o santinho, minúsculo de tamanho mas enorme em graças, no meio daqueles jardins ambulantes. 

Fora da igreja, no palco esperava encontrar uma Banda Filarmónica a executar a abertura 1812 de Tchaikovsky, mas nada disso.  Ao som de hips-hops, misturado com o spunk-spunk dos carrocéis, exibiam-se vários grupos de adolescentes, no geral empenhados e bem mexidos mas pouco coordenados. Por curiosidade perguntei a mim mesmo se fossem convocados para plantar ou arrancar batatas num campo se apareceria alguém daqueles dezenas. Talvez não, porque a nossa juventude gosta destas coisas de palco, mas sujar as mãos e partir as unhas na terra que dá sustento, é que não. Além do mais plantar batatas também implica meter os dedos no estrume. Mas pelo menos nas escolas que lhes ensinem que as coisas que vão ao prato, como as saborosas batatas fritas, são provenientes do trabalho no campo. Mas adiante, que isto é brincadeira! A malta gosta é de festa. Trabalho, outros que o façam!

A nossa freguesia de Guisande partilha com Vila Maior o santo padroeiro, S. Mamede, mas no que à sua imagem diz respeito são tão distintos que se diria que fillho de diferentes mães. O nosso S. Mamede é discreto, formal, mesmo que com uns pequenos e mansos leões a seus pés. Já o Mamede de Vila Maior tem ares de jovem rebelde, com cabelos revoltos e a seus pés umas mansas ovelhas.  Talvez retratos de diferentes fases da vida. Por outro lado, os santos, como as pessoas, são como a gente os pinta ou talha. A mesma pessoa pode ser vista como um santa ou um diabo, dependendo dos olhos que a medem.

Na lateral norte do exterior da igreja matriz, lá estavam estampadas as contas da paróquia. Entre outros itens, as verbas pagas ao pároco no mês de Abril, que totalizavam pouco menos que 400 euros. Reparei que também teve direito a uma parcela de gratificações. Os padres hoje em dia são assim, bem gratificados e ainda temos que dar graças por se dignarem a ser gratificados. Eu não sei se é muito se é pouco o que ganha um padre, sendo que o de Vila Maior tem ainda a seu cargo duas outras grandes paróquias, como são Lobão e Sandim. Mas mais arroba menos quintal, todos reservam para si um muito bom e excelente ordenado e trabalho ao mínimo porque isto de rezar missas é cansativo. Hoje em dia aquela coisa chamada de vocação e votos de pobreza ou de simplicidade é um eufemismo desaparecido com os antigos eremitas. Já não vivem de comer amoras silvestres e gafanhos nem rompem sandálias pelos caminhos ásperos dos montes. Os tempos actuais são de uma nova era e nela o senhor dinheiro tem um peso substancial, quase cósmico, e sem ele o mundo não gira nem o sol brilha.