30 de junho de 2023

Poema "Saudade" já publicado

 


Em 16 de Maio passado dei conta aqui de que a convite da Chiado Books, participei com um poema meu  para uma selecção que a editora se propunha publicar numa Antologia de Literatura Portuguesa desiganda de “Fragmentos de Saudade”.

Como disse então, o meu poema foi seleccionado pela editora e a obra já se encontra publicada e à venda. 

Apesar de lá ter um poema não sei se a irei comprar, pois mesmo que com vantagens para os autores seleccionados o custo de cada tomo é de 25 euros. A antologia foi publicada em 2 tomos, numa obra com mais de 1.200 páginas. É certo que cada volume tem centenas de páginas mas mesmo assim, apenas para ter o prazer de ver o meu poema impresso são 25 euros... Mas ainda tenho que decidir e certamente que acabarei por adquirir até porque o tema é interessante.

Os 2 tomos/volumes desta obra estão divididos da seguinte forma: No 1.º encontram-se os trabalhos literários dos/as autores/as cujo primeiro nome começa de A a J. No 2.º encontram-se os trabalhos literários dos/as autores/as cujo primeiro nome começa de J a Z. 

Uma vez que a antologia já está publicada e à venda, partilho aqui o meu poema, que, como disse, foi seleccionado para fazer parte da mesma.


Saudade da minha aldeia


No largo da minha doce e antiga aldeia

Está seca a fonte das refrescantes águas,

Fechadas as portas e janelas do velho casario,

E toda ela é um presépio mudo, parado, sem vida.


Dela, a saudade cá dentro incendeia

Num fogo a devorar memórias e mágoas,

Mas que não aquece o penetrante e gélido frio

Porque o tempo a deixou, sozinha, constrangida.


A saudade apega-se-nos em tal acerto

Que já é parte de cada um dos sentidos;

Saudade, porque estamos longe ou perto,

Saudade, porque encontrados ou perdidos.


Américo Almeida


O poema "Saudade da minha aldeia" evoca uma atmosfera nostálgica e melancólica ao descrever a aldeia do eu lírico. Através de uma linguagem poética densa, o poema explora a solidão e a saudade, transmitindo uma sensação de abandono e desolação.

O primeiro verso já estabelece um contraste entre a imagem idealizada da aldeia ("doce e antiga") e a realidade presente. A fonte que antes oferecia águas refrescantes está seca, as portas e janelas do casario estão fechadas, e a aldeia parece ter perdido sua vitalidade. Essa imagem de abandono é reforçada ao se descrever a aldeia como um "presépio mudo, parado, sem vida", criando uma metáfora que ressalta a ausência de movimento e animação.

O eu lírico revela seu estado interior ao mencionar a saudade que arde dentro de si como um fogo que consome memórias e mágoas. Essa saudade é intensa, mas não consegue aquecer o "penetrante e gélido frio", indicando que mesmo a memória e a nostalgia não conseguem suprir a ausência e o vazio deixados pelo tempo. A aldeia encontra-se solitária e constrangida, como se tivesse sido abandonada pelo curso dos acontecimentos e pelas mudanças do próprio tempo. A procura de melhor vida nos centros urbanos tem levado à desertificação do interior e abandono das nossas aldeias. O amor à terra, o apego às raizes ancestrais e o sentimento de pertença acabam por ser preteridos em troca da legítima aspiração de uma vida com mais oportunidades e melhores condições. A razão a prevalecer sobre a emoção e o coração, mesmo que daí a saudade fique sempre como o elo de ligação entre o passado e o presente.

A última estrofe explora a natureza da saudade, revelando-a como algo que nos acompanha independentemente de estarmos perto ou longe, encontrados ou perdidos. A saudade é uma parte intrínseca dos sentidos humanos, transcende a distância física e se relaciona com a falta, o anseio e a perda.

No geral, o poema retrata a aldeia como um espaço abandonado face às mudanças do tempo e gerações, onde a saudade ocupa um lugar central na vida do eu lírico. Através de metáforas e imagens poéticas, o poema explora a solidão, a passagem do tempo e a persistência da saudade como uma presença constante na vida humana.

Análise técnica:

O poema procura utilizar uma linguagem poética densa e simbólica para transmitir suas emoções e imagens. Metáforas e imagens são utilizadas para descrever a aldeia abandonada e a saudade ardente do eu lírico. A metáfora do "presépio mudo, parado, sem vida" e a imagem do fogo que consome memórias e mágoas são exemplos de como as figuras de linguagem são empregadas para criar um impacto poético.

O uso da repetição do termo "saudade" ao longo do poema reforça sua importância temática e emocional. 

Esquema de rimas:

O poema é composto por três estrofes de quatro versos cada, seguindo uma estrutura de quadras. A métrica não é rígida mas estruturalmente equilibrada, em que há uma predominância de versos decassílabos, com algumas variações crescentes ao longo dos versos de cada estrofe. O uso de rimas é presente e regular, seguindo o esquema ABCD, ABCD, EFEF, como a seguir se demonstra.


No largo da minha doce e antiga aldeia (A)

Está seca a fonte das refrescantes águas, (B)

Fechadas as portas e janelas do velho casario, (C)

E toda ela é um presépio mudo, parado, sem vida. (D)


Dela, a saudade cá dentro incendeia (A)

Num fogo a devorar memórias e mágoas, (B)

Mas que não aquece o penetrante e gélido frio (C)

Porque o tempo a deixou, sozinha, constrangida. (D)


A saudade apega-se-nos em tal acerto (E)

Que já é parte de cada um dos sentidos; (F)

Saudade, porque estamos longe ou perto, (E)

Saudade, porque encontrados ou perdidos. (F)


A.Almeida