4 de fevereiro de 2022

O BUPi é uma (quase) valente "merda"


O BUPi é uma daquelas formas que o Governo arranjou para fazer incidir as responsabilidades e custos da realização do cadastro predial directamente aos proprietários. 

Depois de anos com o Estado a suportar o processo mas ainda com a maior parte do território do país por cadastrar, o Sr. Costa e acólitos tiveram uma epifania e voilá: Aí temos o BUPi, uma plataforma electrónica que vai dar trabalho e ocupar muitos técnicos, uns profissionais, outros aprendizes e outros nem uma coisa nem outra.

Para além de tudo, uma plataforma que parece pouco prática e algo complexa e aparentemente não funcional já que são mais que muitas as vezes em que está fora de serviço.

Mas o que vem a ser esta quase "merda" do BUPi, uma terminologia para  Balcão Único do Prédio (BUPi)?

Segundo a Wikipedia, "Balcão Único do Prédio (BUPi) é uma plataforma de interoperabilidade que agrega a informação relevante sobre os prédios urbanos, rústicos e mistos em Portugal, e os seus titulares, incluindo informação disponível nas várias bases de dados públicas das entidades parceiras do projeto BUPi, através da articulação entre o registo predial, a matriz predial, o cadastro predial e a informação geográfica. A Lei n.º78/2017, de 17 de agosto, cria o Sistema de Informação Cadastral Simplificado e o BUPi como plataforma única nacional de registo e cadastro do território, com o intuito de conhecer o território português de forma simples e inovadora, aumentar a eficiência no planeamento e gestão do território, no combate aos incêndios rurais e na criação de valor económico a partir dos recursos naturais".

Claro que tudo isto é uma quase valente "merda" porque em rigor quem lida com estas coisas sabe perfeitamente que a articulação dos serviços da Conservatória do Registo Predial e Finanças é coisa que não existe e a regra é que a caracterização e descrição dos prédios sejam invariavelmente diferentes em ambos, seja na área, nas confrontações, na titularidade de propriedade, etc. De resto é desta falta de harmonização entre ambas as entidades que surgem as dificuldades, já que as diferenças entre ambas, mesmo que de pormenor e pouco relevantes, são motivo para a submissão ser considerada inválida. Depois a questão do título, como escrituras de partilhas, de compra e venda, etc.

Um exemplo típico desta desarmonia: Se num prédio na matriz está como titular a Maria dos Santos Silva mas na Conservatória está como Maria dos Santos Silva Azevedo, porque acrescentado com o apelido do marido, tal é suficiente para ser invalidada a inscrição no tal BUPi. Ou então, se na matriz o prédio está com 700,00 m2 mas na Conservatória está com 701,00 m2, novamente um motivo para invalidade. Em resumo, são mais que muitas as "merdices" que podem emperrar o registo e a validação  na plataforma

Em resumo, esta nova plataforma não vem resolver esse problema nem uniformizar o registo predial. Muito menos para simplificar ou descomplicar. Seja como for, está aí para complicar a vida aos contribuintes e naturalmente com isso mexer na sua carteira. 

É certo que muitos municípios aderiram criando balcões de atendimento, como o de Santa Maria da Feira,  onde os proprietários podem, em teoria, fazer a coisa de forma gratuita. Ora esta suposta gratuitidade é apenas uma questão de semântica porque na realidade os proprietários na sua maioria analfabetos ou iletrados nestas coisas das ferramentas digitais, não são capazes de identificar de forma correcta os limites dos seus prédios, nem os técnicos no tal balcão os podem ajudar, e por conseguinte têm que recorrer e pagar a quem o faça, nomeadamente a um topógrafo para lhe realizar um levantamento topográfico georreferenciado ao sistema de coordenadas ETRS89.

Depois toda a complexidade do sistema e dos requisitos; Eu próprio que tenho formação e experiência em topografia e desenho, tive problemas no respectivo registo e aprendi que importará fornecer o mínimo de informação. Num dos casos tive a ousadia de fornecer para o mesmo prédio a caderneta predial e a certidão da conservatória e porque há entre ambas uma ligeira e insignificante variação de área, o técnico responsável pela análise acabou por não validar o registo. 

Por estes pintelhos vê-se a complexidade da coisa e obstáculos criados, de modo a que as coisas tenham mesmo que ser feitas no tal balcão de atendimento, mesmo que por lá estejam eventualmente azelhas, estagiários e pessoas com poucos ou nenhuns conhecimentos de topografia e georreferenciação.

Para além de tudo, com o avançar do cadastro surgirão inevitavelmente sobreposições de prédios que levarão a conflitos jurídicos e a decisões demoradas nos já por si lentos e arrastados tribunais. 

Assim vamos indo, cantando e dançando ao ritmo de quem nos dá música. É o que temos e não há como escapar.