27 de dezembro de 2021

A beleza...



A verdadeira beleza não se exibe, 

não se mostra em poses, 

não se anuncia com rótulos, frases feitas e lugares comuns.

A verdadeira beleza é simples mas não simplória.

É discreta, quase envergonhada.

Pode estar numa flor na borda de um caminho, 

numa pedra vestindo musgo, numa descolorida ave cinzenta.

A verdadeira beleza é aquela 

que os teus olhos vislumbram e não a que exibes numa vaidade vazia.

A verdadeira beleza 

não veste seda nem cetim nem se cinge de veludo, mas talvez num aconchego de tojo.

26 de dezembro de 2021

Nuvens negras

Há dias, alguém que prezo e estimo, um guisandense ausente mas presente, e que vai seguindo os meus apontamentos sobre algumas coisas relacionadas à freguesia e paróquia, manifestava-me o seu agrado pelos mesmos, e que os acompanha interessado, porque mais do que memórias trazidas à tona do dia, são elementos que guardam um pouco do que é a nossa história comum. E rematava dizendo que entendia que estas coisas deviam ser mais divulgadas e consideradas.

Em resposta, e agradecendo o interesse, ressalvei que porventura a coisa não mereceria tanta atenção. De resto nem o faço para colher bênçãos mas antes para ficar como um simples registo escrito para memória futura e até porque um dia destes alguns desses apontamentos irão para livro. Mas no essencial tenho noção que estas coisas pouco ou nada interessam à generalidade das pessoas. Quando muito a meia dúzia.

Quando alguém sai a caminhar com o céu carregado com nuvens escuras e a ventar, não pode ter a expectativa de que não vai chover e que o sol vai aparecer sorridente. As coisas são como são. Se vires um animal a caminhar como uma galinha, a cacarejar como uma galinha e a pôr ovos, então o mais certo é que seja mesmo uma galinha.

No fundo a freguesia é pequena e cada vez mais, porque esta história das uniões de freguesias, paradoxalmente só veio contribuir para uma desagregação, e nela escasseiam as pessoas com sensibilidade cultural e de amor à terra suficientes para apreciar e valorizar o que por ela se vai fazendo. E dessas poucas, algumas não passam de polícias sempre de bastão levantado, invejosas, com comichão por quem lhes faça sombra ou as incomode nas suas vaidadezinhas. Mas a maioria será mesmo completamente insensível a estas coisas e a freguesia será apenas uma coisa em abstracto, nela apenas exercendo o papel de cidadãos anónimos, sem qualquer tipo de intervenção. Ou seja, daqueles que não levantam uma palheira a favor do todo comunitário.

Neste panorama, seja em que vertente for da nossa comunidade, nunca se pode esperar muito. Vamos, pois, indo e vendo, mesmo a remar contra correntes, e fazer de conta que ainda estamos nos bons velhos tempos em que mesmo com as naturais diferenças, se remava para o mesmo lado e o sentido de comunidade e freguesia era muito vivo.

Bons velhos tempos que já não voltam, ande-se por onde andar.. 

25 de dezembro de 2021

Feliz Natal!

 



Pequena, minha aldeia,

Luz serena na candeia

Que no lar doce habita;

Que Deus bem te proteja,

Bendito e Louvado seja

Por graça tão infinita.

 

Humilde mas honrada,

Com gente tão dedicada

De coração tão grande;

 Nesta noite de consoada,

Com mesa abençoada,

Feliz Natal, Guisande!

24 de dezembro de 2021

O Natal já não é o que era...

O Natal já não é o que era! Dizemos muitas vezes. Não será bem assim, mas haverá alguma verdade. Desde logo porque necessariamente os tempos nunca são os mesmos, mesmo que nem sempre o avançar deles signifique evolução.

Depois, quer se queira ou não, há diferentes percepções do Natal e do seu espírito. Ora a percepção dos mais velhos não é de todo igual às dos mais novos. Estes porque em regra crescerem num contexto de facilidades e abundância, nada lhes faltando, aqueles porque um pouco ou tudo ao contrário. Hoje os mais novos não sentirão a diferença de comer rabanadas, chocolates, aletria, bolo-rei, etc, porque os têm e comem durante todo o ano. Quando muito farão uma cara feia como a uma sopa de nabos. Já os mais velhos sabem que noutros tempos essas coisas eram mesmo só pelo Natal e nunca à fartazana, daí o sentido e percepção do sabor das coisas, tanto na boca como na alma.

Mas adiante. Hoje em dia, de facto, o Natal é muita coisa e coisa nenhuma, porque já pouco do essencial e do que ao longo dos séculos lhe deu substância. É verdade que o espírito de comunhão em família ainda se mantém, bem-haja, mesmo que o conceito de família esteja já a ser subvertido, mas no geral é puramente comercial e consumista. Da componente tradicional e religiosa já pouco resta. Uma larga maioria, mesmo num país dito católico, celebra o Natal sem celebrar o seu motivo nem passar pela igreja. - Coisas de velhos!

Depois é tudo muito rápido e fácil. Já muitos começam a consoar num restaurante chique e a ostracizar o bacalhau, por coisas mais à chef, e daí esta pandemia estar a ser uma chatice do caraças. Não se cozinha, e tudo já se compra feito e pronto. Não se descascam as batatas, as nozes nem os amendoins, sequer. Já não se fatia presunto ou queijo. Compram-se as “tábuas de festa”. Tudo pronto a consumir. 

É esse o espírito e o comércio faz questão de no-lo lembrar com a devida antecedência, quando por meados de Outubro já apanhámos com o velhote da Coca-Cola, as marcas do perfume com as gajas boas, as operadores de telecomunicações a dizerem-nos que o que está a dar é o 5G, as marcas de relógios a mostrarem joias como se fôssemos todos Cristianos Ronaldos, os amigos do Sócrates ou os Rendeiros, e as grandes superfícies engalanadas com pirâmides de Ferreros, árvores de bacalhau e azeite, etc, etc.

O Natal está mesmo a mudar e os fundamentalistas da inclusão até lhe querem dissociar o simbolismo e contexto religioso. Ora, para esses, vão-se foder e entalem-se com as trufas! Para os demais, um Feliz e um Santo Natal!

23 de dezembro de 2021

A todos um bom Natal!

 


Para todos quantos acompanham ou visitam este espaço, votos sinceros de um Santo e Feliz Natal!

22 de dezembro de 2021

Pe. Manuel Francisco de Sá

 


O Pe. Manuel Francisco de Sá nasceu na Casa da Costa Velha, em Duas Igrejas, Romariz - Vila da Feira, em 7 de Outubro de 1883, filho de Francisco José de Sá e de Maria Josefa de Oliveira. Faleceu em 3 de Julho de 1944, relativamente novo, com 61 anos..

Sendo mencionado como filho de Francisco de José de Sá, na certidão de baptismo, que abaixo reproduzo, foi registado como sendo filho de pai incógnito, mas na mesma certidão, em assento posterior, foi assinalado que foi legitimado na paternidade por Francisco José de Sá aquando do casamento deste com a sua mãe Maria Josefa.




Foi pároco de  Fiães, que dirigiu durante uma dúzia de anos, entre Julho de 1920 e Setembro de 1931, a freguesia de Fiães, onde se tornou empreendedor e estimado pelas gentes locais. Depois de sair de Fiães foi paroquiar a freguesia de Paramos - Espinho. Com problemas de saúde voltou depois para Fiães, onde residia no lugar dos Valos, ali falecendo em 3 de Julho de 1944.
Por vontade própria quis ser sepultado em Fiães. numa demonstração de amor à freguesia apesar da proximidade da sua terra natal.

Do muito que representou para Fiães, pela sua dedicação, destaca-se a importante monografia sobre a terra, de sua autoria e publicada em 1940, cuja capa abaixo se reproduz. De resto, tinha este sacerdote essa vontade e interesse histórico e documental bem vivos pelo que igualmente escreveu e deixou importantes monografias sobre Paramos, que paroquiou, bem como sobre o lugar de Duas Igrejas de Romariz, onde nasceu, numa edição de 1936, a qual em 1968 foi actualizada e acrescentada pelo Pe. José António Ferreira de Castro, a que se refere a capa abaixo.





Em 17 de Julho de 1969, o então pároco de Fiães, Pe. Inácio António Gomes da Silva, endereçou uma missiva ao pároco de Guisande, o Pe. Francisco Gomes de Oliveira, também natural de Fiães, a convidá-lo a fazer parte numa homenagem póstuma que a paróquia iria prestar ao ex-pároco, Pe. Manuel Francisco de Sá. Abaixo se reproduz o documento que pode ser lido. 


Do programa da homenagem póstuma, para além da parte religiosa, seria colocada uma lápide com o seu nome, junto à casa onde residira e  atribuir o seu nome a essa rua.

Não temos a confirmação se o convite foi aceite pelo então nosso pároco, mas naturalmente que sim, enquanto fianense, bem como dado o prestígio e carinho do Pe. Manuel Sá em Fiães. 
Não tendo, pois, uma relação directa com a paróquia de Guisande, o  Pe. Manuel Sá, até pela proximidade e vizinhança, quer de Duas Igrejas, quer de Fiães, é uma figura e personalidade deveras interessante. Daí o merecido apontamento neste espaço.

O fado do pau para toda a colher

 


O que por aqui vou dizendo e escrevendo, e isto dever ser perfeitamente natural e compreensível, reflecte sempre e apenas a minha opinião e qualquer outra, em concordância ou em contrário, é legítima, concorde-se ou não. 

A propósito de alguns recentes eventos de cantoria de fados em espaços de igrejas e capelas cá pela zona, parece-me que  o fado não é o tipo musical que mais se adeque à natureza de tais espaços. 

Gosto de fado (mais do clássico do que o moderno), aprecio o fado e julgo, sem falsa modéstia, que conheço minimamente a história e evolução deste género musical, para lhe reconhecer um lugar importante na nossa cultura musical, mesmo que de cariz urbano e limitado no espaço, já que essencial e reconhecidamente identificado a Lisboa e com a variante que se reconhece no ambiente académico de Coimbra, mesmo que o fado ligado à cidade do Mondego e ao contexto universitário, tenha, de algum modo, depois seguido a sua própria evolução e de forma independente da do fado lisboeta. 

O resto é paisagem, mesmo que o fado hoje em dia se cante por todos os lados e os fadistas ou pseudo-fadistas sejam mais que as mães. De resto, pela sua qualidade e valor enquanto elemento identitário, cultural e imaterial, foi já reconhecido pela UNESCO. 

Voltando à questão, apesar dessa qualidade cultural e musical, volto a dizer que não acho que se adeque a ser cantado em espaços de culto religioso. Desde logo porque na sua essência o fado é de origem popular, castiça, vadia e associada à vida boémia da capital, quase subversiva. 

O reportório clássico ou mais moderno, continua a focar temas como o amor romântico, sentimental ou carnal, o desamor, o maternalismo, a paisagem urbana e humana de uma certa Lisboa antiga, e naturalmente outros temas mas seguramente não de índole intrinsecamente  religioso ou espiritual. Pode-se chamar à equação o conhecido Frei Hermano da Câmara, que em determinada altura deu esse toque mais religioso ao fado, popularizando até a balada de fado de Coimbra “Samaritana”, de autoria de Álvaro Cabral (1865/1918), e mesmo outras figuras,  mas no geral foi coisa rara e mais adaptada do que evoluída. De resto, se alguma religiosidade mora no reportório do fado, essa é muito mais notória na variante do fado coimbrão. 

Mesmo hoje em dia, se o fado foi de algum modo moldado na sua essência original, tal deve-se a uma certa modelação que foi inevitável durante o longo período de ditadura do Estado Novo onde a este importava um fado mais domesticado e a tocar em valores a ele mais caros, como o de cariz religioso. Portanto o fado num largo período da sua história viveu muito desta ambiguidade.

Não tenho dúvidas que o fado, sobretudo pela sua matriz puramente musical e melódica, nos seus ritmos lentos, compassados e chorosos, até se pode prestar a uma intervenção mais recatada, introspectiva, mas não é seguramente da sua natureza mais genuína. 

Não basta, pois, que nos poemas cantados no fado se invoque Jesus, Maria ou José, ou os santinhos das aldeias, as capelas de Santo Estevão, S. Domingos ou outras, para que a coisa se possa considerar ou disfarçar de sacra e litúrgica, embora haja quem pense que sim, como se o fado possa ser pau para toda a colher. Um lobo nunca será cordeiro mesmo que lhe vista a pele.

Há por aí uma tese de doutoramento muito interessante e que aborda este tema da relação do fado com a religião e que pode levar a várias leituras e interpretações. Será o documento, dos que conheço, que melhor aborda e aprofunda esta relação sob um ponto de vista analítico e histórico. Interessante mas que, pela minha parte, não me leva a mudar a opinião quanto à legitimidade contextual de classificar o fado como religioso ou litúrgico. De resto, o fado nem precisa desses atributos e só perderia se assim fosse. Já muito mal se tem feito ao fado dentro do próprio contexto de fado.

Em resumo, e porque aqui não se pretende fazer a história do fado, até porque ela está mais ou menos feita e por quem melhor percebe da poda, volto à opinião inicial de que pessoalmente, apesar da tal ambiguidade de relação do fado com a Igreja e a religião, não acho adequada a sua interpretação em ambientes interiores de espaços de oração.  Não que tal me cause surpresa e ou espanto, porque vamos andando num tempo em que a subversão e mistura das coisas é norma corrente, mas apenas porque ainda gosto da velha máxima de que cada coisa no seu lugar, como quem diz, cada macaco no seu galho. 

A este propósito, para perceber o enquadramento, e porque também gosto de saber opiniões, pedi informações na Diocese sobre a realização destes eventos. Em resposta, pelo Vigário Geral foi-me esclarecido que para os referidos concertos ocorridos há pouco tempo, não emitiu a Diocese qualquer autorização.

Gostaria de saber um pouco mais, nomeadamente sobre se há orientações superiores para este tipo de eventos e que de algum modo regulamentem e uniformizem o uso dos templos para eventos não religiosos, em todo o território da Diocese, mas por ora ainda não obtive resposta. Aguardo.