10 de agosto de 2023

Incerteza



Vivo neste cuidado até me cansar

Numa permanente busca do perdido,

Até que logrando, feliz, encontrar,

Me dê, enfim, como bem merecido.


Mas na vã incerteza de tal labuta

Fico quase perdido, em sofrimento,

Em saber se venci ou perdi essa luta

Ou se dela tive algum merecimento.


Um rio, se nasce para o mar corre

E nada se encontra se não perdido;

Então, sem nascimento, quem morre,

E sem luta quem se dá por vencido?


Talvez seja assim o meu destino:

Uma ânsia continuada de indagar,

Ir ao encontro do toque do sino,

A saber se por festa ou por chorar.


A.Almeida - 14-03-2023

Fujamos da chuva!

Num jogo de futebol, vejam lá a novidade, há três desfechos possíveis: a vitória, a derrota e o empate. Por conseguinte, sendo disputado por duas equipas, se não houver empate significa que uma vencerá e a outra perderá. Perceberam?

Por conseguinte qualquer adepto da coisa deve estar preparado para qualquer resultado da sua equipa, seja em que contexto for, para além da outra questão acessória que é a decisão eventual do desempate por penalties. Outros quinhentos.

Todavia, se há muita e boa gente que percebe isto e como tal se comporta, outros há que é tiro e queda, ou seja, convivem mal com a derrota e raramente ou nunca a aceitam. Há quem diga, para o justificar, que isto é fervor, mística e amor ao clube, mas também quem considere que é apenas o elementar fanatismo, falta de fair-play, respeito ou mesmo fanfarronice.

Ora esta situação é mais grave quando esses adeptos ocupam igualmente posições de liderança e como tal com muitos olhos postos no seu exemplo.

Mas em rigor isto já pouco interesse tem e serve apenas para alimentar jornais e debates na TV porque com o futebol na dimensão em que está, não passa de uma mera indústria, um negócio de muitos milhões, que usa os adeptos apenas como fonte de receita para pagar principescamente a jogadores, dirigentes e empresários. Por conseguinte os valores que ainda, pensamos que estão lá, como o desportivismo, o fair-play, o respeito pelo adversário, etc, são na realidade eufemismos sem correspondência e usados apenas para entreter gente sem sono.

Mas que é interessante assistir a este "jogo" para além do rectângulo de jogo, é, porque nele podemos ver até onde vai o pior que o futebol tem, a rivalidade doentia, o desrespeito mútuo, a fanfarronice, a falta de bom senso, etc.

É o que é! Talvez por isso, a leste do paraíso, só soube hoje de manhã do desfecho do resultado de um certo jogo de futebol que terá acontecido ontem ao início da noite. E, como se previa, sem surpresas, não tanto no resultado, que poderia ser qualquer um, mas sobretudo nas reacções a ele. Mais do mesmo.

Se está a chover, fujamos da chuva, a não ser que valha a pena ver alguém a molhar-se!

9 de agosto de 2023

Escolher feijões


E sabem lá os mais novos o que isso é! Escolher feijões? Quando muito pensarão que é, nas prateleiras das grandes superfícies de distribuição, escolher entre as diversas opções de latas ou sacos de branco, preto, vermelho, fradinho, de manteiga, catarino, etc, etc. E se possível já cozido, pronto a misturar com um arroz, massa ou sopa.

Realmente, para quem nunca passou por isso, apesar de, com a internet, não faltar informação disponível na ponta dos dedos, haja vontade e interesse, é certo e sabido que uma grande parte dos mais novos não têm noção do caminho, dos processos que passam os alimentos até chegarem às nossas despensas e depois à mesa. Não custa acreditar que ainda haja gente que não sabe a proveniência de um ovo, de uma salsicha, do fiambre ou do queijo. A ignorância ainda é muita e com o afastamento das pessoas das realidades do campo, tudo é possível. Daí que ainda se veja criançada surpreendida quando visitam uma qualquer quinta com animais domésticos, como galinhas, ovelhas e burros, a que agora pomposamente se designa de pedagógica. Vejam só!

Pois bem! Se é certo que os mais novos pouco perceberão da poda, os mais velhos sabem perfeitamente o que é isso de escolher feijões. Actualmente já nem tanto, apenas umas amostras de feijão de vagem, ou rasteiro, nas nossas hortas, mas ainda há algumas dezenas de anos eram habituais as sementeiras em larga escala, ou como monocultura ou misturado com o milho. Ora, algumas vezes por mistura acidental, outras vezes propositadamente, até porque as sementes recolhiam-se de ano para ano, quase sempre na colheita e depois da debulha, que ao contrário do milho, era em grande parte manual, mesmo que ligeiramente batida na eira, certo é que o habitual era haver feijões de várias espécies e cores pelo que havia então a necessidade de os escolher, ou apartar. Entre os lisos e de várias cores, branco, vermelho, amarelo, roxo, preto, os mais comuns, até aos riscados e ainda o fradinho, era uma tarefa minuciosa, de paciência e obviamnete aborrecida, sobretudo para a criançada quando os pais os obrigavam a essa empreitada.

Mas era uma tarefa que tinha que ser feita, principalmente quando havia a necessidade de vender, e havia compradores que percorriam as aldeias a comprar feijão,  mas também porque se a cozinhar de forma misturada, devido a diferentes graus de dureza, o feijão requeria diferentes tempos na panela, mesmo que depois de demolhados.

Mas mesmo ainda antes da debulha, limpeza com crivo e a escolha, o feijão regra geral era chato de colher, porque semeado entre o milho. Requeria cuidado e sobretudo muita água.

Nos tempos modernos, já pouco feijão se produz nas nossas aldeias à moda antiga, e por conseguinte a sua exploração é feita de forma muito mecanizada e em grandes parcelas e mesmo assim Portugal importa aproximadamente 80% das leguminosas secas (a que pertence os feijões) que consome, apesar dos especialistas afirmarem que com as políticas certas poderíamos ser auto-suficientes. Desta percentagem de leguminosas secas, mais ou menos 75% refere-se a feijão.

Mesmo consumindo boas doses per capita, os nutricionistas consideram que os portugueses deveriam consumir mais, nomeadamente em detrimento de outras origens de proteína animal. Quem não gosta de uma boa feijoada, de branco ou vermelho, com tripas ou à transmontana, ou um grão de bico com um bacalhau com todos ou em rancho? Ou mesmo uma salada fria com feijão fradinho? Lentilhas e ervilhas secas, menos comum, mas também vão à mesa.

Em resumo, isto de feijões tem que se lhe diga mesmo que não se valorize um jogo ou uma aposta a render feijões. Fazem parte das nossas mais antigas memórias associadas aos tempos em que no campo se encontrava a nossa subsistência.

Já agora, o feijão, nomeadamente o feijão-comum (Phaseolus vulgaris), chegou até nós a partir da época dos Descobrimentos, provenientes da América Central e do Sul. As espécies mais comuns englobam o que chamaamos de feijão encarnado, o branco, o manteiga, o catarino, o canário, o amarelo, etc.. Mas há ainda variedades tradicionais portuguesas, com nomes bem engraçados, como o patareco, o vassouro, o raboto, o torino, o papo-de-rola, o crista-de-galo, o cuco,  o arrebenta-panelas e o bigode-de-homem. Mas há ainda mais e perde-se a conta às variedades e espécies, seja na cor, tamanho, sabor e outras características tanto culinárias como vegetativas.

Importa, pois, valorizar os feijões, porque mesmo que disponíveis em lata, já cozidos, têm que ser semeados, regados, colhidos, debulhados, limpos e processados. Só depois é que vão à panela, á mesa e à boca. À pois é, é!

8 de agosto de 2023

Carlos (Cruz) Cruzadas com novo livro

 

Está ainda a fumegar de quente, o novo livro de Carlos Cruzadas (Cruz). 

Depois do primeiro "filho" "Ao longo dos tempos", num registo mais intimista, com poesia e curtos textos de introspecção, desta vez o Carlos concretiza um livro dedicado à biografia de Justino da Silva Cruz, um seu familiar e conterrâneo da terra de nascença, ilustre e reconhecido filatelista entre os seus pares, que considera o autor ser de justiça trazer à luz do reconhecimento também junto das suas humildes origens.

Justino Cruz, é coleccionador de selos há mais de 50 anos, tendo sido co-fundador do Clube Filatélico Português, em 1975, e seu presidente honorário desde 1995. Detém a medalha honorária da cidade de Estugarda - Alemanha, onde é emigrante.

A apresentação está marcada para o lugar de Labercos, freguesia da Lomba - Gondomar, no próximo dia 19 de Agosto, pelas 16:00 horas.

Tem-me dito o Carlos que será porventura o seu último suspiro nestas coisas de publicar livros, mas creio que não, até porque há roseiras que ainda florescem pelo Natal. Ademais, seria uma pena e perda que tantas coisas com sentido ficassem órfãs de páginas impressas.

Quanto à filatelia, o coleccionismo de selos, é um tópico interessante, artístico, histórico e cultural. Pessoalmente é um assunto que também me agrada e de resto tenho centenas de selos de diversos temas. 

Não sou coleccionador, longe disso, muito menos especialista, como será o Justino Cruz,  mas fui juntando, comprando e guardando. É arte. É cultura.

Acudam que há fogo!

 


Não sei o que tem de apetecível a zona dos Quatro-Caminhos para que quase todos os anos seja varrida por incêndios. É certo que aquela mancha sem casario, que descontinua os lugares da Gândara, Leira, Estôse e Azevedo é propícia a que a bandidagem use o isqueiro e dê de frosques facilmente sem que sejam detectados. Mas que há ali coisa, há, e lembro-me a propósito do que acerca de coisas do outro mundo dizia a minha bisavó quando há muito e muito tempo ali passava, quando a acompanhava a casa do Ti Alexandrino no lugar de Azevedo. Também, pelo que vi já hoje de manhã, com o mato ainda a fumegar como se acabado de assar sardinhas, dinheiro em limpeza na margem da rua foi coisa que o dono não gastou. Tudo ajuda.

Mas não se espere mudanças neste calvário que todos os anos tem hora marcada para fustigar o país. A lei e a justiça são brandas e assim vai-se andando a fazer-se de conta que os lavradores, os proprietários é que são os responsáveis e os assadores de sardinhas uns bandidos.

Com estas e outras, há por aí muito terreno de mato e pinhal que dado é caro mesmo que ainda com a obrigatoriedade de limpeza só para alguns. Mas o BUPi está em curso e apesar da salgalhada que por lá vai com prédios sobrepostos duplamente, um destes dias as autoridades já saberão o nome e o número da porta a quem ir entregar a coima.

Ainda há algumas semanas pediram-me: - Ó Américo, dê-me lá uma avaliação para o Mato da Escouça, nos Corgos, que o primo anda a insistir para eu comprar. Eu não queria, porque ali nunca porei os pés, mas como é da família os meus filhos disseram-me para comprar e que ficará para ali. Então sou capaz de comprar mas também não me quero aproveitar da vontade dele. Dê-me um preço justo!

Apeteceu-me dizer-lhe que o preço justo era de graça e ainda com o custo da escritura a suportar pelo vendedor e arrematado com a oferta de um bife no Zé de Vér. Mas lá lhe disse: - Ó Ti Tavares, ali pelos Corgos é só fraga dura, deslavada e até um tractor geme ao lá passar. Além do mais, é terra lambida pelas chamas e o pouco que lá cresce, como os leitões na Bairrada, morre ao nascer. Mas, pronto, por respeito não à Escouça mas ao seu primo, e se tiver lá dinheiro a estorvar, pague-lhe a 1 euro o metro quadrado, que é bem pago e respeitoso. Como por lá será improvável passar a Guarda, pelo menos poupa-se à limpeza. O incêndio faz-lha de graça de dois em dois anos.

Confesso que não sei se o negócio se fez, mas talvez sim, porque o Ti Tavares é bom homem e de dinheiro, já de idade avançada e tem os filhos bem instalados na vida. Com jeitinho nunca chegarão a saber onde fica a propriedade da Escouça e nem talvez o BUPi ajude porque o mais certo é nela estarem encavalitados mais dois ou três proprietários.

Sobre esta situação do baixo valor patrimonial de muitos dos nossos matos e pinhais, trouxe-me à memória um episódio a que assisti há meia dúzia de anos quando o Sr. Pinheiro decidiu fazer a partilha pelos filhos de umas tapadas lá pela serra de Vila Nova e então, já velhinho, pediu-lhes que o levassem pela última vez a ver os seus matos. O Domingos, o mais velho, meteu-o a custo no jipe todo-terreno e serra acima, serra abaixo, lá percorreu aqueles caminhos de cabras infestados de tojo e giestas como numa peregrinação à Senhora da Peneda. - Olha, Domingos, este é o Calvelo, aquele é o da Laje, aqueloutro o da Fraga. Ali, a partir daquela cancela é o da Pedra Alta. Lá em baixo, a partir daquele sobreiro é o Mato do Lajedo.

Uma a uma reconheceu o velhinho aquela dúzia de tapadas, uma ou outra com mais de um hectare, a maioria com pouco mais de mil metros. Mas até pelos nomes daqueles pedaços de terra escalvada se adivinhava a sua natureza granítica onde as poucas árvores se enraizavam com dificuldades e a água escorria sem se deter para as amamentar.

Terminada a peregrinação e levado o pai para a fresca sombra da ramada, disse-me o Domingos, com o zeloso cuidado para que o pai o não ouvisse, não o fosse desgostar: - Foda-se! Vão calhar-me alguns matos que não valem o gasóleo que gastei!

Acudam que há fogo!


[foto; Repórter Brandão]

7 de agosto de 2023

Vergado ao peso da própria espada

Está relativamente bem documentado, até mesmo pelo Fernão Lopes, cronista contemporâneo, ainda por outros autores posteriores, e que mesmo já ouvi da boca do erudito historiador José Hermano Saraiva, que D. João I, para além da forma muito peculiar com que foi aclamado rei de Portugal, foi muito fraquinho no que toca a feitos de cavalaria. Teve melhor desempenho noutras áreas e o melhor legado deste filho bastardo feito rei pelas Cortes de Coimbra, foi a sua ínclita geração, como a chamou Camões.

Sendo certo que interviu na peleja ou batalha de Aljubarrota, na tarde de 14 de Agosto de 1385, que cimentou a independância face a Castela, teria muitas dificuldades em suster o peso da própria espada e num confronto com um nobre castelhano, Álvaro Gonçalves de Sandoval, só não foi morto graças à intervenção salvadora e corajosa do cavaleiro Martim Gonçalves de Macedo, que quando o castelhano se preparava para desferir o golpe mortal na cabeça do fraco rei caído de joelhos, lhe arrancou a maça que quebraria o crâneo ao ex- Mestre de Aviz. De resto este salvamento da morte certa valeu a Martim Macedo generosas recompensas e doações de terras por parte do resgatado à morte.

Em resumo, no manejo da espada ou da adaga, o Mestre de Aviz, apenas fez figura no acto cobarde quando assassinou a sangue frio o desamparado Conde Andeiro no Paço Real.

Mas a estas coisas nem sempre damos destaque porque em regra as desconhecemos e esta e outras figuras da nossa História, que se mostraram fraquinhas, são recorrentemente polidas e pintadas com cores de valentes guerreiros que marchavam destemidos à frente das suas tropas. 

Também na vida e em muitos aspectos dela, com alguma recorrência e similaridade, vamos vendo por aí uns arremedos de nobres e reis com ares de valentões, a fazerem poses de durões, mas que na realidade não passam de umas tristes amostras. De resto a História está repleta destes embustes e até o filme de animação 3D, o Shrek mostra-nos um príncipe minúsculo, o Lord Farquaad, enfiado numa imponente e brilhante armadura. 

Hoje, como no passado, há ridículos que se mantêm.

Senhor do Bonfim - Festa

 



Conforme o panfleto acima, distribuido durante o peditório, vai ser realizada no dia 17 de Setembro próximo uma singela festa em honra do Senhor do Bonfim, com o programa expresso no próprio documento. Por conseguinte, pelas 09:00 horas sairá da capelinha a procissão em direcção à capela do Viso onde será celebrada missa. 

Parece que haverá ainda uma parte de entretenimento musical conforme cartaz a que ainda não tive acesso.

Em todo o caso, a história impressa no interior do referido panfleto procura dar um esclarecimento sobre a origem da construção da capelinha, mas torna-se confusa porque não se sabe quem está a falar na primeira pessoa. Por outro lado, de um modo um pouco caricato mistura uma história de lobos que não tem nada a ver com a capela e com o assunto.

Falei a este propósito com o André Silva, um devoto do Senhor do Bonfim e interessado nestas histórias e origens de coisas antigas relacionadas à nossa freguesia. Assim, fiquei de ajudar ao esclarecimento. 
Pois bem, a história não é contada pelo André, nem poderia ser, pois a sua mãe tem uma bonita idade mas não seguramente mais de 100 anos, caso tivesse, como é escrito, nascido em 1917.

De facto a autora do testemunho sobre a origem da capela foi a D. Maria Isaura C. Resende Borges, da Casa do Loureiro, na Barrosa (esposa do Dr. António Ferreira da Silva e Sá,  falecida em 2015, tendo sido recolhido e escrito pelo André quando ela ainda era viva. A referência à data de nascimento da mãe foi feita posteriormente ao André por um seu filho (Francisco Borges de Sá).

Já quanto à história dos lobos, que apareciam lá para os lados do sítio de Casinhas, nada tem a ver com o assunto da capela e terá sido impressa por alguma desatenção, pois estando ambos os apontamentos juntos, quem o mandou fazer e quem o imprimiu não percebeu que estavam fora de contexto e foi tudo impresso de rajada.

A intenção foi boa mas houve esse descuido o que faz-nos ter em conta que é sempre bom haver algum cuidado nestas coisas, antes de as imprimir, sobretudo quando as andamos a distribuir.

Mas, aparte esta curiosidade que aqui se esclarece, para quem naturalmente ficou confuso, é de enaltecer o esforço e voluntarismo de quem se predispôs a organizar a singela festa.

Quanto à história da origem da capelinha do Senhor do Bonfim, um destes dias voltaremos a ela porque é interessante.