31 de julho de 2018

Assalto ao castelo


O "assalto" a Castelo de Paiva, tal como a Arouca, tem sido dificultado por acessos bonitos mas com muitas curvas e de perfil estreito, pouco dados a rapidez, nomeadamente a partir do concelho de Santa Maria da Feira, Tanto Arouca como Paiva foram já há anos dotados com variantes (estradas nacionais 326 e 222), mas à falta de dinheiro e de desinteresse de sucessivos governos pelo interior, as vias rápidas ficaram-se a pouco mais ou menos pela metade. Este ostracismo do poder central obviamente que resulta em prejuízos no desenvolvimento destes concelhos vizinhos, ficando longe mesmo estando perto.

Volta e meia fala-se da coisa mas no que a Castelo de Paiva diz respeito, talvez por comportar menor investimento e menor extensão (à volta de 10 Km), está novamente na ordem dia a continuação da variante, que está parada na Zona Industrial de Lavagueiras - Pedorido, até ao nó de Canedo - Santa Maria da Feira,  permitindo a ligação à A32.  Assim por estes dias o Governo lançou o concurso para o estudo prévio e projecto de execução, num valor de 1,8 milhões de euros. 
É certo que depois desses passos faltará ainda adjudicar a obra e realizar a mesma, o que não será para breve e, dentro do que é habitual, dependerá da vontade e folga financeira do futuro Governo.

Seja como for, é uma notícia que se aplaude, como diz Gonçalo Rocha, presidente da edilidade paivense "Significa que, de facto, [o Governo] está com uma vontade clara de que esta obra aconteça, dando sequência ao compromisso que foi assumido. Isso para nós é motivo de grande satisfação".

Ler a notícia [aqui] e [aqui] .

30 de julho de 2018

Festa do Viso - O passado é lá atrás



Já chegara no início da semana a pista de carrinhos de choque. A custo, os camiões lá subiram a rampa do Monte do Viso e despejaram à sombra das acácias e do velho sobreiro todas as peças desse puzzle que, montadas uma a uma à força de braço, dariam lugar a uma espécie de tenda de circo onde o palco era uma pista de asfalto de chapa metálica, sem princípio nem fim, nivelada numa estrutura de barrotes e pranchas de madeira. O carrinho número 1, branco, que todos queriam pilotar, porque dizia-se ser o mais rápido, lá estava pronto a “faiscar” num cenário kitsch adornado com pinturas reluzentes de animais e paisagens.

Lá pela quarta-feira ao fim da tarde também chegava a "Almeida Rádio", com os seus altifalantes cinzentos que eram colocados no alto do sobreiro, apontados para os quatro cantos da freguesia, em que por alguns dias haviam de esganiçar as melodias da moda. No átrio da entrada da Escola do Viso montava-se a cabine de som, com gira-discos e torres de discos, onde se misturavam o Rancho Folclórico de Santa Marta de Portuzelo e Conjunto Típico Maria Albertina ou “Pais e Filhos” com José Cid, Amália Rodrigues, António Mourão, Fernando Farinha, Demis Roussos, The Nazareth ou The Rubetts, entre muitos outros que pela época eram sucessos da rádio. Quase sempre os agudos do “Sugar Baby Love” abriam as hostilidades musicais e o grego que cantava inglês, o Demis, actuava logo de seguida.

Entretanto a Comissão de Festas já começara a delimitar, com postes de eucalipto e arames, o espaço reservado à elite à qual havia de cobrar bilhetes para sentarem o cu em bancos macios e corridos. Podiam assim ver mais de perto “Os Marinheiros de Ovar”, os “Estrelas Incomparáveis” ou os “Peles Vermelhas”. Pagavam, mas dava-lhes estatuto, sobretudo quando estava em causa causar boa impressão às namoradas. Os outros, para quem o dinheiro era para queimar em quarteirões de branco com açúcar ou em lambarices, ficavam de fora, encostados aos arames num KO de indiferença.
Por esses tempos não havia dinheiro para mais folguedos musicais e os “pimbas” ainda estavam para nascer. Mesmo quando por ali passou a Ana Malhoa e a a Filipa Lemos (dos Santamaria) eram ainda crianças em início de carreira.

Um a norte e a outro a sul, à sombra das mimosas, estavam já montados os pequenos coretos de madeira vindos empoeirados da Casa da Quintão e do Sr. Gomes do Reguengo, juntamente com os mastros embandeirados com a vermelha Cruz de Cristo. Os coretos eram pequenos mas as filarmónicas também e como passarinhos lá se acomodavam em tão pequeno ninho. As festeiras e a raparigada, há semanas que, entretidas, vinham a entrelaçar cordas com papel recortado e a tecer delicadas flores coloridas que a qualquer chuvisco murchariam mas que engalanavam a dura rampa do monte até às Quintães por onde haveria de passar a procissão solene no Domingo à tarde.

Debaixo das frondosas austrálias, o Alcides da Casa Neves já montara a tasca onde se serviriam cervejas, pirolitos, gasosas e laranjadas da Gruta da Lomba a acompanhar suculentas fatias de melão e sardinhas do mar de Espinho, bem assadas. Mais tarde fazia-lhe companhia e na concorrência o saudoso Neca dos Santos.
Depois eram as tendas de brinquedos, da fruta, da regueifa, doces e outras lambarices como pacotinhos de bolachas de baunilha, torrões de amendoim em caramelo e chupas em forma de guarda-chuva ou de bolacha. Os brinquedos, para os quais a criançada andava um ano a juntar tostões, eram ainda de chapa ou de madeira pintada com cores garridas. O plástico era ainda novidade. Os rapazes compravam uma carrinha ou um taxi e as meninas uma máquina de costura ou um conjunto de cozinha com fogão, ferro de engomar, ou mesmo uma boneca despida para a qual faziam vestidinhos com as sobras dos trapos.

Era assim a nossa Festa do Viso lá pelos idos anos 60 e 70. De lá para cá as coisas foram mudando e a magia foi-se reduzindo conforme o palco ía crescendo e o orçamento aumentando. É certo que ainda continua a ser marcante, motivo e pretexto para reencontro de famílias e emigrantes com saudades matadas numa boa e farta mesa onde não falta o assado caseiro de vitela, carneiro ou cabrito e o melão da época mas, verdade se diga, já não é a mesma coisa. Mudaram-se os tempos e com eles as modas , os gostos e as dinâmicas e até mesmo o arraial. Já não há espaço para pistas, carroceis "8 "ou "zero", cestas ou aviões. Mesmo que algo ali se acomodasse com jeitinho, os empresários destes divertimentos só querem festas bem graúdas e barulhentas como a de Canedo, Lourosa, Arrifana e outras mais. Por cá, já foi chão que deu uvas e cascas de melão.

É verdade que a génese da nossa festa, a religiosa, está ainda quase intacta,  porque a mais genuína, mas a componente popular, à imagem de quase todas as festas e romarias da zona, há muito que deram lugar a manifestações incaracterísticas onde o sucesso das mesmas se mede pelas figuras e figurões dos cartazes musicais e do nome ou prestígio da pimbalhada. Os aspectos puramente tradicionais foram perdendo muito da sua autenticidade e terminarão quase definitivamente com o desaparecer das gerações mais antigas.

Apesar de tudo, mesmo que as coisas já não sejam o que foram, e até nós próprios, porque já não vemos as coisas com os olhos da infância, onde tudo nos parecia mágico e deslumbrante, ainda há muito de positivo nas festas das aldeias, incluindo a nossa, e são ainda um elemento agregador e identitário. Por isso, que continuem por muitos e bons anos e que no final da mesma, que cada Comissão de Festas continue a sentir-se orgulhosa do trabalho desenvolvido, na certeza de que, não agradando a todos, fez por isso e à causa dedicou-se com empenho e compromisso com os valores da nossa freguesia. Bastará isso para que valha sempre a pena.

24 de julho de 2018

Ilustração - Rosas - 24072018

a. almeida


Notas pessoais

Eu sei que depois das pessoas desaparecerem do mundo dos vivos é sempre fácil cair-se no elogio fácil. Por sinceridade ou em contexto de politicamente correcto, quase todos acabamos por nos deparar com situações destas. Mas as coisas são mesmo assim.

Neste contexto, já depois de iniciado o luto com o inesperado desaparecimento do Sr. vereador da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira, o Arquitecto José Manuel Oliveira, também tomo a liberdade de publicamente tecer algumas palavras e não como alguém que o conheceu e com ele conviveu com proximidade e frequência, mas apenas por contactos circunstanciais e em face de testemunhos vários, isso sim, de quem com ele foi contactando mais amiúde, pessoal ou profissionalmente no âmbito da sua actividade política e autárquica.

No âmbito profissional estive algumas, poucas, reuniões técnicas com ele enquanto vereador do urbanismo a discutir assuntos relacionados a processo de obras particulares. Dali pareceu-me sempre uma pessoa de trato fácil, conhecedora e muito objectiva e activa na solução dos problemas que se colocavam.

Politicamente, foi ele, acompanhado de outra figura do PSD concelhio, que me convidou a integrar a lista do PSD concorrente às eleições intercalares de 2014 para a Junta da União das Freguesias de Lobão, Gião, Louredo e Guisande. A par de alguma prévia vontade de dar o meu contributo na defesa da freguesia de Guisande no contexto da futura Junta e da nova realidade administrativa, foi de facto o poder de argumentação do José Manuel que me fez reflectir e depois, não sem a habitual pressão, aceitar integrar a lista. Depois foram algumas reuniões preparatórias do programa e da campanha e uma vez mais, entre todos, destacava-se pela sua objectividade e sentido prático e demonstrando uma enorme sagacidade na leitura de todos os momentos e ritmos necessários à campanha. 

Durante os momentos em que já no âmbito da Junta contactei com ele, continuou a parecer-me muito objectivo e assertivo nas decisões e de facto destacava-se entre os parceiros e creio que todos, mesmo os mais chegados, respeitavam-no e consideravam-no como alguém com espírito de liderança e de experiência. 
Ainda no contexto da Junta ajudou a resolver e a negociar o sério imbróglio decorrente das dívidas transitadas do anterior executivo de Guisande. No geral, contribuiu positivamente para que os problemas judiciais com os empreiteiros, já em curso, fossem resolvidos e negociados com alguma vantagem para a Junta, facilitando o pagamento em prestações ou em condições bem mais favoráveis do que aquelas que acarretariam para outro cenário de esgrima judicial.

Da figura política do José Manuel Oliveira e da relação partidária e no contexto da Junta, apenas guardo alguma ligeira mágua (obviamente já sanada e esquecida) pelo facto de no momento de se decidir uma eventual recandidatura não me ter procurado pessoalmente a saber da minha posição e da minha opinião quanto ao exercício e mandato de três anos que iria terminar. Em resumo, sendo certo que a minha resposta seria a mesma, a de não me recandidatar, por manifesta desilusão com o mandato terminado e por me sentir incapaz de mudar a direcção dos acontecimentos, pela falta de poder objectivo e por um rumo de gestão muito centralista, muito longe do que eu inicialmente preconizava e pensava ser possível enveredar tendo em conta o contexto da União, a verdade é que esperava que as mesmas figuras que me convidaram três anos antes tivessem pelo menos a consideração e a objectividade de me abordar e ouvir a versão de quem esteve por dentro, até para, sendo útil, limar arestas e ajustar objectivos para a lista e campanha que iria começar. Certamente que iriam ouvir algumas das "boas". Mas não foi assim e ninguém da concelhia, incluindo o José Manuel, me procurou para saber se sim, se não, como e porquê. Por um lado ainda bem, porque assim foi mais fácil dizer não e de resto seria muito difícil dizer sim a um modelo que no meu entender falhou redondamente, pelo menos à luz do que tinham sido as minhas expectativas e as que em campanha transmiti ao eleitorado guisandense, a ponto de ter vencido com larga  maioria.

As coisas são o que são, e mais do que as pessoas devem valer os projectos e as dinâmicas e a sua predisposição para o serviço, eu entendi que em ambas um segundo mandato seria demasiado penoso pelo desenquadramento de modelo de gestão que certamente não iria mudar no essencial, embora num contexto financeiro já bem mais dasafogado. Daí, com toda a naturalidade, uma vez o dever cumprido o melhor possível, face ao eleitorado guisandense que no geral saiu defraudado com a actuação da Junta da União, ficou também o  dever e a obrigação de dar o lugar a outros e desejar que estes fizessem (façam) mais e melhor, porque no final o que é importante é o que se possa fazer pelas pessoas e não quem o possa fazer.

Com tudo isto, sendo apenas a minha simples opinião sobre o José Manuel Oliveira, creio que perdeu-se uma importante figura política e autárquica do nosso concelho e, no geral, isso tem sido e será reconhecido pelos diversos quadrantes do município. Infelizmente a vida tem de continuar e o cemitério está cheio de insubstituíveis. 

Fica a dor e o sentimento de vazio e perca para os familiares e também, acredito, para toda a estrutura do PSD local e da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira, de modo particular para o seu presidente Dr. Emídio Sousa, mas a vida continua e acredito que o executivo camarário saberá encontrar uma solução de substituição mas de continuidade, fazendo ocupar o cargo certamente alguém com conhecimento e competência, e se não com muita experiência, certamente que bem assessorado.

Paz à sua alma!