17 de fevereiro de 2020

Racismo e anjinhos

Todas as formas de racismo devem ser, obviamente, condenadas. Mas devem igualmente ser condenadas todas as acções e princípios que para elas possam concorrer. E se num jogo de futebol ou num qualquer evento desportivo de competição entre duas partes, os actos provocatórios e arrogâncias susceptíveis de "incendiar" a despoletar reacções de violência, nomeadamente os dirigidos às massas adeptas, devem igualmente ser condenados, tanto mais se por parte de actores que se devem pautar pelo respeito mútuo para com os adeptos, mesmo que adversários e para quem, afinal de contas, lhes pagam os normalmente chorudos proventos.

Por outro lado, não os desculpabilizando, importa perceber e distinguir os insultos ou actos racistas num contexto de futebol, já que todos percebem que no antagonismo e rivalidade de grupos e tribos o racismo não é mais que uma das extensões da ofensa e da provocação gratuitas. Muita da massa adepta do fenómeno do futebol teve a sua escola nas competições regionais onde os insultos gratuitos aos adversários e árbitros, e às mãezinhas e filhas destes, foram sempre a tónica, quase sempre sob a indiferença e impunidade de dirigentes e autoridades. 

Os que agora, perante os episódios de Guimarães, vêm a terreiro mostrar a sua indignação não se mostraram tão indignados com as recentes e habituais manifestações de "carinho" com que os jogadores e adeptos do S.L. Benfica foram recebido para o lado do Porto, com recados intimidatórios, sicilianos e inaceitáveis de bonecos enforcados, e bancadas em uníssono com cânticos patrióticos de "SLB, filhos da pu...", e outros mais mimos dignos de pessoas civilizadas. Mas, diga-se, quase sempre de forma mútua, porque nestas coisas do irracional não há, por regra, exclusividades. Nem os do Porto são diabos nem os do Benfica anjinhos, e vice-versa. Esta podridão e carência de cultura de respeito mútuo é mais ou menos generalizada e de resto em consonância com a falta de valores cívicos na sociedade, que vai sendo regra e pasto para os populismos e demagogias da esquerda à direita.

Assim, sendo, para além do sempre muito politicamente correcto, que pelos tempos que correm, começa a tresandar tanto quanto o populismo, convém que se dê a devida importância a ambos os fenómenos e que quem exercita a indignação fácil o faça pelo menos com algum equilíbrio e menos facciosismo, que no caso clubístico ou político, é também ele perigoso e condenável.