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4 de março de 2022

Ao longo dos tempos - Carlos Cruzadas


Sob o pseudónimo de Carlos Cruzadas, Carlos da Silva Cruz, um bom guisandense nascido em Labercos - Lomba - Gondomar,  tomou-se de coragem e em edição de autor fez publicar um livro de textos e poemas a que deu o título de "Ao longo dos tempos - Letras, palavras e frases cruzadas"

De algum modo, um registo autobiográfico em que nos diferentes poemas e textos exprime com sensibilidade o seu pensamento e visão sobre os lugares onde nasceu, cresceu e vive e, para além deles, da visão poética das coisas e  do mundo e do seu lugar nele.

Noutros tempos, falamos de poesia e do poema permanente que é nossa freguesia de Guisande e mesmo na partilha da figura que em certa medida me ajudou a cultivar, a de Miguel Torga. De resto, não estará esquecido quando aqui há já uns anitos fomos em peregrinação a S. Martinho de Anta conhecer um pouco daquele reino fantástico de que falava o transmontano.

Assim, aos livros que noutras alturas tive o privilégio dele receber, soma-se agora este muito particular e certamente mais significativo. 

Fico à espera do próximo livro do Carlos Cruzadas. Quanto ao meu, para breve, e um segundo, esse com outro contexto e menos pessoal, se não correr mal será para meados do próximo ano. De resto já está em fase final.

Parabéns ao Carlos e um bem-haja! Deixo como remate um bonito poema do nosso patrono das coisas da poética, Miguel Torga.


Prospecção

Não são pepitas de oiro que procuro.

Oiro dentro de mim, terra singela!

Busco apenas aquela

Universal riqueza

Do homem que revolve a solidão:

O tesoiro sagrado

De nenhuma certeza,

Soterrado

Por mil certezas de aluvião.

Cavo,

Lavo,

Peneiro,

Mas só quero a fortuna

De me encontrar.

Poeta antes dos versos

E sede antes da fonte.

Puro como um deserto.

Inteiramente nu e descoberto.


3 de março de 2022

À Senhora da Boa Fortuna



Nossa Senhora da Boa Fortuna,

Virgem Imaculada, mãe bondosa,

Que na aflição a todos seguras;


És porto de abrigo, forte coluna,

Alma dócil, materna, carinhosa,

Com o Menino  em tuas mãos puras.


Dá-nos a graça do teu paraíso,

Do olhar materno, doce e sereno,

Como Mãe que pelos filhos vela;


Lá no alto, onde te invocam, no Viso,

És presença, bondade e amor pleno,

A encher de graça a simples capela.



A.Almeida

1 de março de 2022

Borboleta


Olha! Uma borboleta!

Procura flor, pela certa,

onde pousar,

onde comer.


Olha! Uma borboleta!

Amarela e preta,

sempre a voar

a planar,

a viver.


Olha! A borboleta!

Lá se foi, esperta,

voando

ao namoro

de outra flor.


A flor vazia, em solidão,

Lamenta. 

Mas, pela certa,

Virá, que emoção,

A ela, 

Outra, doce e bela

Borboleta.


A. Almeida

28 de fevereiro de 2022

Maldito seja!



No turpor da noite fria

Avançam as máquinas da dor,

Do ódio e da prepotência.


O descanso merecido dos heróis,

Homens, mulheres, crianças,

É quebrado e a noite esturpada

Com vómitos de fogo e sons de medo.


O exército de gente indiferente

Marcha à ordem de um homem só,

Numa fúria que esmaga casas e gente,

Deixando um rasto de sangue e pó.


Um homem pequeno, pequenino,

Num elmo negro de cobardia

Com o poder na ponta do dedo

De mandar fazer trevas o dia.


Se os tanques fossem ceifeiras,

Os mísseis foguetes de alegria,

Quem dera que assim fosse,

Como chuva benfazeja.

Mas não! Que maldito seja! 


A. Almeida

28 de janeiro de 2022

Fonte


Ali, ao cair da tarde,

sussurra cansada a fonte

na morna sombra do sobreiro,

brotando sem alarde,

água que desce lá do monte

da Mó, ao cimo do Outeiro.

16 de janeiro de 2022

A ceifa do tempo

 


Seja maldita esta verdade assim nua,

Mas a minha aldeia já não é o que foi;

Já não lhe rasgam leiras, arado ou charrua,

Esventrando-lhe a leiva o possante boi.


Aplanaram-se-lhe os caminhos fundos,

Alargaram-se-lhe as estreitas veredas;

Foram-se as gentes para outros mundos,

Já não há palha nem dela as medas.


Remexendo na distância das histórias

O sopro do tempo chegou em vendaval,

Dispersando a poeira das memórias

E para sempre nada mais deixou igual.


O tempo, esse ceifador de rosto antigo,

Devastou, insano, searas de fecundidade,

Colheu, indiferente, pasto, joio e trigo

E vive, agora, farto para a eternidade.


A.Almeida - 16012022

15 de janeiro de 2022

Lamento


Nas portas do tempo andado

secou o musgo nas ombreiras cansadas

e os gonzos já não rangem

a anunciar caminheiros novos.


Na mansidão das sombras caducas

já não há descansos nem retemperos

de pés e ossos cansados.


Já não tem som o chilreio dos pássaros

e a ribeira corre dorida na fraga

como a fugir para um descanso inalcançável.


O peso dos anos vividos

quebraram o viço de homens novos

num aperto de mandíbulas 

de um cão fantasma

que vive na noite de breu

à espera do seu repasto.


Tudo finda num lamento de nada, 

num vazio sem fundo, 

imensurável,

final.


A.Almeida 15012022

30 de dezembro de 2021

O velho Monte

 


Olha lá o velho monte, 

como agora, então bonito,

e nele, bem assente,

linda e simples, a capela.


Não tinha, então, fonte,

nem calçada de granito,

mas crianças e mais gente

à fresca sombra dela.

25 de dezembro de 2021

Feliz Natal!

 



Pequena, minha aldeia,

Luz serena na candeia

Que no lar doce habita;

Que Deus bem te proteja,

Bendito e Louvado seja

Por graça tão infinita.

 

Humilde mas honrada,

Com gente tão dedicada

De coração tão grande;

 Nesta noite de consoada,

Com mesa abençoada,

Feliz Natal, Guisande!

7 de dezembro de 2021

Semente de luz


SEMENTE DE LUZ


Da semente da aurora nova,

A luz há-de brotar mais clara, 

mais intensa, 

a dissipar a decisão sombria.

Os caminhos serão largos,

mais planos, 

e neles as crianças terão prados, 

macios e ternos, 

onde dormirão com travesseiros de sonhos mansos,

coloridos e brilhantes, 

mesmo nas noites mais densas de escuridão.


A. Almeida

23 de maio de 2021

A minha rua

 



Na minha rua mora o mundo e moro eu,

O verde é mais ele e o azul é mais céu.


Ecoam passos antigos 

no chão da minha rua,

Vislumbro  brincadeiras de amigos, 

A sombra do sol, a paz da lua.


O casario, mais vazio, é certo, 

Continua ali, tão longe e tão perto,

À distância da memória plena, 

Ao alcance de uma brisa amena.


A minha rua, é palco, é arena,

É escada para mais alto, ou mais fundo,

Por onde se sobe ao fim da esquina,

Por onde se desce ao fim do mundo.

25 de junho de 2020

Ossos do ofício


Restos da carne, do vício,
Que à terra, ao pó devolve,
À morte, à tristeza e ais.
Afinal, ossos do ofício.
Duma força que nos move
Como barca rumo ao cais.

30 de março de 2020

Noutra Primavera


Noutra Primavera,
haverá tempo e lugar
ao namoro,
sentadinhos, lado a lado,
na frescura de plátanos
e dos reflexos de águas.

Por ora, há flores,
há chilreios de pássaros,
há verde e mais verde
mas ainda cheira a Outono,
como num adormecer suspenso
à espera de nova alvorada.

Havemos de nos sentar
No regaço de uma nova Primavera,
E juntos celebraremos o renascer.

Cada vida partida,
chorada,
há-de ser uma flor,
A inundar o jardim de um tempo novo.

10 de fevereiro de 2020

Claridade

Olhei ao alto
na procura
de um lençol de claridade,
mas a sombra
de um sonho
mal sonhado
pairava como mortalha
acendida
no braseiro febril
do delírio.

A chuva mitigadora,
refrescante,
tardava
no desejo de um afogamento
nos teus braços
onde a paz mora abençoada.

No teu seio,
há uma lagoa,
límpida, clara,
onde velejo,
suave,
nas mornas ondas
do sopro dos teus lábios.


Ocirema  Adilema

23 de dezembro de 2017

É Natal na nossa aldeia



É Natal na nossa aldeia,
Feliz tempo que enternece;
Cada casa com mesa cheia,
E uma lareira que aquece.

À casa doce paterna,
Vão dar todos os caminhos,
Todos a ela acorrem
Quais aves aos seus ninhos.

Chegam filhos, genros e noras,
Chegam netos, já crescidos,
Qual bagos de doces amoras,
Todos juntos, bem juntinhos.

Na mesa grande há fartura
De coisas boas, da avó,
A fome também  é de ternura
De aconchegos e não só.

Abre-se espaço na mesa
Que a rainha é chegada,
Qual tesouro da pobreza,
Já fumega a caldeirada.

O bacalhau lá está, claro,
A batata e a penca que é couve,
O azeite dourado, do mais caro.
- Que Nosso Senhor o louve!

De vinho bom, bem regadas,
Santa e doce esta alegria,
Lá vêm, vejam, as rabanadas,
As filhoses e a aletria.

A mãe, avó eternecida,
Enlevada neste amor,
Junta as mãos, agradecida:
- Louvado Deus meu Senhor.

É Natal na nossa aldeia,
O do Menino, o de Jesus;
Nossa alma está cheia
Da sua imensa, intensa luz.

É Natal na nossa aldeia!



A. Almeida 12/2017

24 de dezembro de 2016

Boas Festas! Feliz Natal!

 

feliz_natal_2016

NATAL NA MINHA ALDEIA

Na minha aldeia
O Natal voltou a desabrochar,
A florir como flor tardia
De uma Primavera de geadas.

O fumo, cinza de prata,
Voltou a ondular pelas velhas chaminés,
Almas vadias de troncos defuntos.

A mesa pariu
A abundâncias das coisas doces.
As travessas voltaram a abarrotar
De bacalhau, batatas e couves do nosso campo.

As nossas almas ficaram mais cheias,
Mais solenes,
Mais embriagadas
Deste espírito,
Deste Natal.

A. Almeida