Contentamento é sair pela manhãzinha
Ainda com o sol, sonolento, a levantar,
Seguir o caminho que dará a algum lugar
E ver a sair do ninho a doce avezinha.
Contentamento é beber no puro regato
A frescura prateada da sede consolada,
Sentir no bosque a sombra esverdeada,
Até mesmo acariciar o tojo no mato.
Contentamento é entrar no velho moinho,
Já nú, vazio, despojado da alma sem dó,
A moer uma doce compaixão naquela mó.
Como um velho entre paredes, sozinho.
Contentamento é mergulhar na limpidez
Da água fresca da mina na velha represa,
Sentar na erva do chão como se fora mesa
E, em merenda, saciar o suor outra vez.
Contentamento é subir ao outeiro no Outono
E aos prenhes ouriços, abrir-lhes as entranhas,
Encher os bolsos fartos de doces castanhas
Porque dizem, se no caminho, não têm dono.
Contentamento, é afinal, ter tão pouco,
Bastando, não mais, que o poder sentir,
Que se tem tudo mas sem nada possuir,
Ser inocente, puro ou, porventura, louco.