21 de março de 2023

A ditadura da democracia

Ainda está quente a questão da decisão por parte do Governo de António Costa a possibilidade de tomada coerciva de imóveis para arrendamento, no que constitui um atentado ao direito e defesa da propriedade. Não faltam especialistas a afirmarem a inconstitucionalidade da medida e a ver vamos como ficará definida. Sendo certo que é enorme o nosso parque de edifícios devolutos e em ruínas a conspurcarem aldeias, vilas e cidades, existem muitas medidas que podem ajudar a mitigar esse problema, desde logo pela esfera da tributação ou apoios à reconstrução por parte dos proprietários e também em muitos milhares de casos na desburocratização de partilha e registo de propriedade que em muitos casos continuam em comum.

Também ainda estão na nossa memória as proibições de sair de casa e de passear em zonas florestais e outras medidas atentatórias dos direitos e liberdades, mesmo que justificadas no âmbito do combate à pandemia da Covid 19.

Agora parece que o Governo se prepara para proibir os moradores das  zonas rurais de sairem de casa sempre que for declarado alerta de perigosidade alta de incêndios, sem contrapor apoios que mitiguem a perda de rendimentos por não poderem exercer as suas actividades.

Em resumo, mesmo que Portugal não esteja longe dos lugares cimeiros dos países considerados com democracias plenas (28.º lugar no  Democracy Index 2022), era de esperar que não fossem tão longe certos atentados e com este tipo de situações a passarem na nossa sociedade por entre os pingos da chuva, porque mansos cordeiros. Até podem amanhã estabelecer a idade da reforma nos 70 anos que todos ficaremos impávidos e serenos quando, em contraposição, aquela mescla de raças e culturas que dizem ser a França, manifesta-se violentamente por alargarem a idade da reforma de 62 para 64 até 2030, o que mesmo assim ficará bem abaixo da nossa actual meta (66 anos e 4 meses).

Por tudo isto, por estes atentados aos direitos, liberdades e garantias, a pretexto de outros argumentos, em muitos aspectos somos já uma ditadura, mas pior do que as ditaduras porque disfarçada de democracia. Hoje um dedo, amanhã a mão e depois o braço. Foi assim que todas as ditaduras e autocracias começaram.

20 de março de 2023

Nabos e nabeiros

Faleceu o Comendador Rui Nabeiro, de 92 anos, empresário, patrão da Delta Cafés, figura por demais conhecida e reconhecida como empresário de sucesso e sobretudo dotado de um grande sentido de humanidade para todos quantos com ele colaboravam e trabalhavam. Para além de empresário foi sempre um exemplo de cidadania ao serviço dos seus e da comunidade.

Sendo certo que já com uma bonita idade, mas naturalmente deixa tristes não só os familiares como os seus colaboradores e toda a região de Campo Maior e Alentejo.

As suas qualidades empresariais, de cidadania e humanas eram por demais reconhecidas em todos os sectores e por isso não espanta que muitas figuras locais e nacionais o enalteçam quando chamados a dar opinião sobre a sua pessoa.

De minha parte, como a maioria dos portugueses, nunca com ele contactei e por conseguinte a opinião pessoal resulta apenas da percepção do que ao longo dos tempos tenho lido e ouvido sobre a sua personalidade e de facto parece ser unânime a opinião muito positiva da sua acção empresarial e humanista, e desde logo com o reconhecimento a começar pelos trabalhadores das suas empresas.

Em resumo, partiu um homem grande, amigo dos seus, com uma visão e legado do que deve ser um empresário no sentido pleno do seu significado. Ser empreendedor, criar riqueza e mais valias para a região e país, mas igualmente partilhar riqueza porque com um importante sentido humanista e social.

No nosso tecido empresarial, certamente que há bons empresários e muitos deles com as mesmas qualidades e virtudes que teve Rui Nabeiro. Mas, reconheçamos, serão uma gota no vasto oceano porque a larga maioria tem uma actividade apenas baseada nos crescimentos e lucros, com estes todos canalizados para as riquezas pessoais, luxo e ostentação, enquanto que os seus colaboradores, os trabalhadores, são meros números, descartáveis, a quem se paga o mínimo possível, sem acrescento de qualquer função social ou humanista. Assim, para um desses muitos vulgares empresários, um automóvel de luxo, um relógio de ouro ou uma moradia de férias sobrepõe-se a qualquer funcionário e por isso a precariedade e os incumprimentos são mais que muitos, tantas vezes no mais básico que é pagar pelo trabalho. O que não falta por aí são empresários a ostentar riqueza e caloteiros para com os seus funcionários. Parasitas que vivem do suor dos outros.

Neste contexto, nos nossos empresários, temos alguns, poucos, Nabeiros, espécies raras no meio da larga maioria, os nabos.

As coisas são como são e as actuais realidades não se compadecem com lamechices de índole social e humanista. Primeiro o lucro, o estatuto social, a riqueza, o poder e o bem estar. A partilha com os demais, é coisa de somenos importância.

19 de março de 2023

Caminhadas na minha terra - O velho marco





O Domingo nascera fresco com um algodão branco a polvilhar o azul do céu mas percebia-se que com o avançar da manhã o astro rei acabaria por se revelar pleno e reinar no resto do dia desse final de Março.

Subiu a encosta de Trás-os-Lagos ao alto da Gandarinha por entre caminhos já mal delineados numa floresta onde reinam os eucaliptos e os poucos pinheiros, ainda juvenis que brotaram sob as cinzas dos últimos incêndios, eram apenas um testemunho pobre do que foram densos pinhais há cerca de meio século. Por esses tempos, havia limpeza e tudo se aproveitava: O tojo ou mato e os fetos para atepetarem os quinteiros e a cama do gado e os gravetos que secos se desprendiam das árvores sacudidas pelos ventos agitados do Inverno e que lançados ao lume ajudavam a aquecer os longos serões. 

Já no alto, atravessou a estrada e tomou para sul o velho caminho que dava em linha recta ao arraial de Santo Ovídeo, feliz e e inusitadamente limpo. No princípio dessa velha ligação por onde outrora passavam carros de bois, ali estava o granítico marco de limite de freguesa entre Guisande e Lobão que um velho cantoneiro, por esperteza mandada, o deslocou para o lado oposto na desculpa de desobstruir a cancela do Mato do Capitão. 

Diziam os antigos que mexer em marcos, fosse de demarcação de freguesias ou simples dentes encravados como limites de propriedades, era pecado que dava direito ao inferno. Mas o velho cantoneiro, que dizem que se chama Tucas, ou era avesso a esses ditos e superstições ou então agiu de pura boa fé sem nisso ver pecado ou roubo, apenas conveniência, mas certo é que com essa mudança, acrescentou e retirou metros quadrados da geografia de uma e outra freguesias. Coisas.

Com o caminho limpo como não se via há anos, logo surgiu o amplo arraial do Santo Ovídeo, também ele limpo e de erva reverdescida pelas últimas chuvas. Rodeou a capela e lá estava o velho campanário sem a sineta que dizem os de Lobão ter sido roubada pelos rivais de Guisande para com ela adornarem a capela do Viso, como se uma mentira repetida lendariamente muitas vezes se tornasse verdade. Mas de lendas, mesmo que mentirosas, se faz também a riqueza cultural das terras. 

Lá dentro desse amplo espaço que a fabriqueira de Lobão arrebatou na justiça à Junta de Freguesia, no fresquinho do interior da capela o Santo Ovídeo conversaria com os parceiros de altar, o S. Lázero e a Senhora da Guia, talvez discutindo que vai sendo tempo, lá para o final de Agosto, de voltarem a ter uma festa digna das romaria que noutros tempos se faziam. Pois vai...

Desceu depois pela estrada que leva ao lugar do Ribeiro e logo depois, a marcar a subida, o pequeno regato com o mesmo nome do santo que por ali reina. Percebia-se que o enorme movimento de terras ali defronte talvez tivesse ajudado a obstruir a plena passagem das suas águas e então à farta delas se formou ali uma lagoa, tão bonita e límpida quanto perigosa, porque um descuido de carro, pessoa ou animal, ali cairá direitinho e a profundidade pode consumar uma tragédia. 

Logo de seguida cortou à esquerda e meteu pelo pinhal acima e percorreu o velho mato de familiares antepassados, a confinar com o atrás referido regato que debaixo de uma velha parede tomada por vegetação, brotava farto das águas da Gãndara. Na regueira, ainda ali estava o alicerce do velho eucalipto gordo que uns anos antes fora abaixo. 

Voltou-se para sul e e percorreu o limite da linha de fronteira entre Guisande e Lobão e onde a mesma faz uma quebra mais brusca, lá estava, ainda, o velho marco com a Cruz de Cristo, ainda ensanguentada pelo rubor de alguém que a pintara. Ainda firme e erecto. Dali apontava para sul para a divisão já no limite com o lugar de Azevedo, ali mais ou menos pela represa de sede do rancho, onde os mais velhos ainda se lembram de existir outro marco. Mas esse, pela indiferença de quem terraplanou para do pinhal bravio abrir caboucos para o crescimento do lugar, revolveu indiferente como se fora um simples calhau. Se pecado foi, nunca ninguém se confessou e até mesmo quem já chegou a ter poderes, mesmo perante as evidências, negou-se a reconhecer que ali ainda era Guisande porque dava jeito que o lugar de Azevedo crescesse para cima dos calos dos vizinhos. Quem foi, já não faz parte do mundo dos vivos e importará que esteja e descanse em paz mas que cometeu esse pecado, de omissão, cometeu.

Logo depois virou à esquerda e rapidamente estava a cruzar os Quatro-Caminhos, hoje em dia mais aberto e airoso, pelo menos de dia, mas outrora um lugar temido mesmo para os destemidos e ali se erguiam altares de oferendas a deuses menores, a bruxas e feiticeiros que o breu da noite adensava de um escuro sinistro e lúgrebe.

Mais adiante já passava sob uma ramada acabada de podar, agora mais comedida, mas que noutros tempos cobria de uma sombra fresca e desejada, de um verde denso e cachos de tinto,  o velho caminho, hoje Rua da Ramada.

Não tardou, estava regressado a casa. Uma simples caminhada, mesmo que curta e ao perto, pode revelar muita coisa, memórias passadas e presentes, bastando que não baste apenas dar à sola numa correria a encurtar minutos e segundos, mas a olhar com atenção e perceber as mensagens que nos transmitem um regato, um carreiro, um muro, uma pedra, uma árvore ou muitas delas. A natureza, impoluta ou transformada, está sempre pronta a falar com quem a sabe escutar.

17 de março de 2023

À deriva...

Greve nacional dos funcionários públicos, serviços de urgências em ruptura e encerrados com direcções em demissão, a TAP a voar rasteirinho e a fazer voar milhões, os professores em greve, os ferroviários em greve, os barcos eléctricos da Transtejo adquiridos sem baterias e os barcos da Marinha a serem eles próprios (sucata) e o almirante da guerra das vacinas a mostrar-se indignado com a insubordinação de uma dúzia de marinheiros temerosos que promete meter na ordem. 

Com tudo isto, e não é tudo, porque o mar deste país é de águas agitadas, e a nação é toda ela um barco à deriva a meter água e a largar óleo, apetece dizer: - Ó senhor almirante, se foram uma dúzia os insubordinados, foram poucos. O que este país precisa mesmo é de uma insubordinação geral, aí de uns 10 milhões! 

14 de março de 2023

A causa da pausa

Parecendo que não, tenho estado afastado da rede social Facebook há quase três meses. Apenas alguns breves segundos para uma ou outra partilha que considerei com motivo para a interrupção da pausa, de resto, népias, zero!

Por conseguinte não tenho publicado, nem sequer lido o que os "amigos" e os outros publicam, partilham e comentam. Tenho estado mesmo a leste.

A verdade é que, como alguém que nunca se viciou na coisa, não custa fazer a pausa, seja de dias, semanas ou meses. De resto, a maioria das coisas ali publicadas são banalidades que se dispensam. Na larga maioria, egocentricidades, vaidades, partilha e replicação em cadeia de coisas de terceiros. A originalidade, aquilo que é nosso e vem de nós, que nos diferencia , é coisa pouco abundante. 

Assim, mesmo que periodicamente, sabe bem passar ao lado dessas banalidades, de gente que fala muito quando devia estar calada e que se cala quando devia falar, dos vaidosos, dos mestres das poses, das simpatias, dos likes dos mesmos aos mesmos, dos tomilhos, dos alecrins, dos loureiros, dos exageros e fundamentalismos da malta da bola, do chover no molhado, da cegueira da malta da política, dos diários dos extraordinários, dos "olha p´ra mim!" e das proezas dos novos inventores da roda e da pólvora. E agora com o ChatGPT, não devem faltar por ali novas novidades como se de repente, num click, o mais bronco seja o maior poeta e o analfabeto uma promessa das artes e da escrita a debitar pensamentos e reflexões. Fantástico! Nada como um mundo inclusivo!

Sabe bem, muito bem, como quem sorve a brisa fresca e iodada numa praia deserta pela manhã! Como costuma dizer o meu amigo A.P., as "coisas são como são" e "nem sempre nem nunca". Nunca digas "desta água não beberei" porque podes vir a ter sede, mas considera não a beber se ao lado tiveres uma fresca cerveja. Se com tremoços, melhor!

13 de março de 2023

O meu pessegueiro já floriu


Uma constatação básica e decorrente do ciclo das estações e que coordenam o ciclo vegetativo de plantas, mas que para além do óbvio pode nos levar a reflexões profundas sobre a vida e a natureza. Afinal, o florescimento do meu pessegueiro não é apenas um evento isolado, mas um símbolo da passagem do tempo e da renovação cíclica da vida.

Observando o pessegueiro em flor, podemos nos maravilhar com a beleza efêmera da natureza. As flores rosadas surgem por um curto período de tempo, antes de serem substituídas pelas verdes folhas e, em seguida, pelos saborosos frutos. Esse ciclo de renovação é uma constante na natureza e nos recorda da impermanência de todas as coisas.

Assim como o pessegueiro floresce e se renova a cada ano, também nós estamos em constante transformação. A cada dia, aprendemos algo novo, enfrentamos desafios e superamos obstáculos. Essas experiências nos moldam e nos tornam quem somos, assim como cada estação molda e transforma a paisagem ao nosso redor. Somos, de algum modo pessegueiros, mais ou menos floridos, mais ou menos produtivos.

Mas, assim como as flores do pessegueiro são efêmeras, também a nossa vida é finita. A cada ano que passa, o pessegueiro floresce mais uma vez, mas nunca da mesma forma. Cada temporada traz novas surpresas e desafios, assim como cada etapa da vida nos apresenta novas oportunidades e obstáculos a serem enfrentados.

Em última análise, a frase "o meu pessegueiro já floriu" é uma lembrança de que a vida é uma jornada constante de transformação e renovação. Podemos encontrar beleza e significado em cada momento, mesmo quando enfrentamos dificuldades ou incertezas. Assim como o pessegueiro em flor, somos parte de um ciclo maior de vida e renovação, e devemos aproveitar cada momento da nossa existência enquanto podemos.

Pe. Farinha de visita

A comunidade de Guisande teve a alegria de receber por estes dias a visita do seu anterior pároco, o Pe. Arnaldo Farinha. Regressou de Angola por uns dias ao nosso país para tratar de assuntos pessoais e fez questão de passar em Guisande, tendo neste Sábado, 11 de Março, concelebrado a eucaristia das 17:30 horas com o pároco Pe. António Jorge.

Obrigado e bem-haja!