Mesmo que legais e regulamentadas, as certificações de produtos, alimentares e agrícolas, não deixam de ter alguns vícios de criação de elites, de interesses locais, de clubes e outros alinhados. A invocada defesa dos produtos e dos consumidores, uma coisa tão bonita, muitas vezes não passa de panegíricos e argumentos legais para justificar o injustificável ou legitimar alguma injustiça.
Apesar das virtudes de princípio de uma certificação e concretamente quanto ao produto fogaça, e não as ignoro ou relevo, estas por si só não garantem a qualidade intrínseca quanto ao gosto particular por parte de cada um dos consumidores e apreciadores. Não há laboratório que o garanta, porque gostos não se discutem, nem quanto ao que vestimos, nem quanto ao que comemos. Por outro lado, a não certificação não significa que um fabricante experiente e com história na arte não produza uma fogaça de qualidade mesmo que não certificada, quiçá de melhor qualidade e sabor do que a que venha a ser certificada. Aceito, óbvia e naturalmente, que não se venda com equívocos quanto a certificada ou não certificada, de modo a que o consumidor compre informado da diferença, mas que se impeça de vender com o nome de "Fogaça", mesmo que não de "Fogaça da Feira", acho uma injustiça, porque pode defender, seguramente, o interesse de uma dúzia de fabricantes alinhados num agrupamento ou mesmo de alguns confrades iluminados, mas também seguramente em detrimento de centenas ou milhares de consumidores. É que estas coisas ditas certificadas não ficam mais baratas a quem as compra, e tudo, vire-se e revire-se, resume-se ao dinheirinho. Aquele selinho vai ter um "preço".
Se na prática vai ser assim, ou não, veremos. Por mim, continuarei a comprar a "Fogaça", mesmo que sem o pingarelho da "Feira", no sítio do costume, certificada ou não, chame-se-lhe fogaça, fogacilha, fogaçona ou outra qualquer designação como um ilegível F&%#$)/%#, porque tanto quanto se saiba, a certificação não é ingrediente nem segredo de confecção e por isso diferenciadora. Supor que só a certificada assegura o cumprimento das boas práticas de confecção e garantia de qualidade é um pressuposto subjectivo e de passagem de menoridade a quem a fabrica com igual qualidade desde há décadas. De resto parte-se do princípio legal que todos os fabricantes da indústria de pastelaria e panificação já cumprem as regras de higiene e qualidade. Ou estas vão passar a ser exclusivo dos fogaceiros certificados?
Pelo que dizem, para quem não alinhar no clube ou no agrupamento, a ASAE vai ser chamada como polícia a fazer cumprir os bons costumes e a assegurar a moralidade.
Esperemos que as notícias que se vão lendo estejam exageradas e que na verdade vai-se respeitar a liberdade tanto na venda como na compra e que os consumidores comprem informados e cientes da diferença, mas que acima de tudo, comprem, como sempre, a fogaça, com ou sem selo, até porque o selo não será comestível, suponho.
Um gato não deixa de ser gato só porque não é persa ou siamês. Mas lá virá o dia em que, não estando certificado, terá que ser vendido por lebre.